Cassilândia Notícias

Cassilândia Notícias
Cassilândia, Sexta, 26 de Abril de 2024
Envie sua matéria (67) 99266-0985

Geral

Profissionais discutem como prevenir o uso de maconha

Agência Notisa - 21 de novembro de 2004 - 09:36

As discussões dos Simpósios começaram pelo que os especialistas apontam como o fundamental no combate ao uso de drogas: a prevenção. Família, escola, empresa e comunidade foram aspectos analisados.


O primeiro dia do IV Simpósio Internacional sobre Álcool e Outras Drogas, que começou dia 18 e termina hoje, no Rio de Janeiro, começou suas discussões propondo uma pergunta que há muito vem sendo feita: como prevenir o uso de drogas? Especialistas discutiram, dentro do curso "Maconha: mitos e verdades", as formas de prevenir o uso dessa substância, tendo como base quatro eixos: a família, a escola, a empresa e a comunidade.


Entre os palestrantes, estavam representantes da Santa Casa de Misericórdia do Rio de Janeiro, de empresas como a Petrobras, além de especialistas que atuam também na iniciativa privada. A platéia, composta por médicos, psicólogos, assistentes sociais entre outros profissionais, pôde interagir com a mesa, através de um debate ocorrido após o final das apresentações.


Um ponto comum entre as falas foi a necessidade de se criar parcerias entre os setores público, privado, organizações da sociedade civil e escolas. A importância da família e a contribuição que ela pode dar na recuperação de dependentes químicos também foi enfatizada pela mesa.


Família


Gisele Aleluia, especialista em dependência química, abriu sua apresentação pedindo que a platéia respondesse brevemente a uma pergunta: "o que a minha família de origem pensa e como se posiciona com o uso da maconha?". A partir daí, a palestrante mostrou, com a ajuda de casos clínicos, como a família pode participar da prevenção ao uso de substâncias entorpecentes. Um exemplo foi o caso dos pais C. e N., que procuraram a terapia porque o filho do meio apresentava um comportamento "preocupante", indo a muitas festas e buscando o isolamento da família. O pai achava que o filho precisava "querer mudar" e que eles não poderiam fazer nada caso isso não acontecesse.


A situação se agravou quando o jovem decidiu promover um "bacanal" na casa de praia da família, que descobriu a "travessura" e decidiu repreender o rapaz. Revoltado com a repreenda, o jovem tentou o suicídio, tomando comprimidos da mãe. No momento da consulta com a especialista, os pais estavam se julgando "muito rígidos" com o rapaz, que havia sobrevivido aos remédios, após lavagem estomacal. "Eles chegaram no consultório já se punindo muito, pois achavam que haviam sido muito duros com o filho e, por isso, ele tentara se matar. Só que os outros irmãos achavam o contrário. Para eles, os pais foram sempre muito permissivos", disse a especialista.


Gisele Aleluia, com base na observação de diversos casos clínicos, identifica três tipos de família. No primeiro, a família se sente em condição de controlar o filho, sendo, no segundo, o contrário. "Já o terceiro tipo de família é aquele que tenta controlar o filho através da droga. Ele dá droga para o filho, deixa que ele fume em casa, sobe morro para comprar droga para o filho, para que ele não se exponha. São os típicos pais que dizem: ‘eu não sou seu pai, sou seu amigo’", destacou a palestrante.


Como fatores de risco para o uso de drogas, Gisele Aleluia aponta a influência social — as amizades — , o uso de drogas pelo pai, mãe e amigos, uso precoce do álcool, além de baixa auto-estima. Já dentro da família, esses fatores ganhariam proporções ainda maiores, se acompanhados de: posições hierárquicas indefinidas, fronteiras difusas e relações simbióticas. "O jovem precisa identificar quem manda dentro da família. Não no sentido limitante, mas objetivando criar referenciais para ele próprio. Sobre as fronteiras difusas, essa moda agora de os filhos transarem na casa dos pais é o maior absurdo do mundo. Há uma perda de privacidade total para o jovem, tendo por traz uma família super-protetora que prefere que o filho fique em casa, do que se arriscar a ir a um motel ou coisa parecida", explicou.


Outro caso, descrito por Gisele, que mobilizou a platéia foi o da mãe que procurou a terapia para perguntar o que deveria responder ao filho que pedia para que ela mesma comprasse a droga que ele consumia. Segundo a mãe, o menino sabia que a droga lhe fazia mal, mas exigia consumir um único baseado a cada noite, contentando-se com a restrição. "Ela entrou no meu consultório me perguntando o que eu achava disso. Eu disse ‘olha, mãe, isso não vai ser nada bom’", contou. Passado um curto espaço de tempo, a mãe e o jovem retornaram à terapia, com aparente demonstração de que tudo estava resolvido. O jovem, que sofria com o sobrepeso, conseguira emagrecer, estava tirando boas notas na escola e tudo parecia bem, exceto por um fato: a mãe cedera as pressões e passara a fornecer o baseado (agora) noturno e diário do filho.


"Quer dizer: a droga jamais pode ser instrumento de controle do filho. Há famílias que só falam em droga, há outras onde até o assunto é proibido. O que é preciso entender é que a droga está ocupando o lugar dos relacionamentos familiares. Se o menino está se isolando da família, isso tem que servir de alerta, pois ele poderá substituir essa interação pela droga. O mais importante, assim, é valorizar os relacionamentos familiares", conclui Gisele Aleluia.


Escola


Encarregado de falar sobre o papel da escola na prevenção ao uso de drogas, o médico Fábio Barbirato, da Santa Casa de Misericórdia do Rio de Janeiro, trouxe um dado preocupante ao encontro. Segundo ele, 100% dos jovens estudantes da rede pública brasileira já experimentaram algum tipo de droga. A trajetória de inclusão no vício teria início com o consumo da dupla álcool-tabaco, passando à maconha, chegando à cocaína.


"Se para um adulto, que sai entre amigos, já é chato ficar sem beber aquela cervejinha, imagina para um adolescente, que passa por um período de aceitação perante um grupo, onde pertencer ou não à panelinha pode representar o consumo dessa ou daquela droga", explicou o médico. Ele cita que são fatores predisponentes ao uso de drogas: flutuação de afeto, baixa auto-estima, queda no desempenho escolar, uso precoce do álcool e facilidade do acesso às drogas, dramas comumente vivenciado pelos adolescentes.


"Eu estava conversando com um amigo meu que disse que a escola do filho dele chamou os pais para uma reunião. A proposta do colégio era fazer com que os pais monitorassem o comportamento dos filhos durante a saída da escola, hora em que há grande concentração de jovens do lado de fora, momento ideal para a ação dos traficantes", contou Fábio Barbirato. O médico lembrou que o drama da venda de drogas nas proximidades dos colégios cariocas é bastante comum, visto que muitas escolas de bairros da Zona Sul, por exemplo, situam-se perto de morros e bocas de fumo. "O estudante de colégio particular é o cliente ideal para o traficante. É jovem, logo vai fumar para tirar onda, e ainda por cima, tem grana para bancar o vício", diz.


Contudo, um ponto bastante destacado pelo médico é a presença de fatores paralelos, que possam levar ao consumo de drogas. O Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade (TDAH), segundo o profissional, é uma das causas mais comuns que podem levar ao uso de drogas. "Uma criança que tenha um TDAH não diagnosticado pode gerar um adolescente que busque nas drogas muitas respostas que não encontrou na sociedade. O maior problema nisso é que os próprios profissionais sentem muita dificuldade para diagnosticar o TDAH. A escola, assim, poderia ser um aliado nessa luta, identificando crianças agitadas demais ou muito quietas, por exemplo", apontou Fábio Barbirato.


Na opinião do especialista, o papel do profissional, no diagnóstico mais preciso do TDAH, aliado à intensa observação do professor em sala de aula e, principalmente, ao apoio da família são fundamentais para a detecção de alterações que possam levar ao uso de drogas. "Sobre o consumo de drogas, a culpa não é nossa, mas o problema é nosso sim", conclui.


Empresa


Joaquim Melo, coordenador do Programa de Prevenção e Recuperação da Dependência Química da Petrobrás/Reduc, foi o nome escolhido para falar sobre o papel da empresa na inibição do uso de drogas. Na opinião dele, o papel dos meios de comunicação na divulgação dos malefícios das drogas é fundamental.


O palestrante explicou que a prevenção das drogas na empresa é feita tendo como base três vertentes: intervir antes do uso (primária), intervir durante o uso (secundária) e atuar na recuperação do paciente (terciária). "Desses três tipos, o mais importante é a abordagem primária, já que ela acontece antes do funcionário usar a droga. Ela deve ser constante, sempre se fazendo presente", destacou.


A abordagem primária do combate ao uso de drogas pode se basear no uso de material promocional/ educativo (folders, cartazes, brindes), do exame médico periódico dos funcionários, treinamento de agentes de saúde e gerentes (que atuariam como agentes multiplicadores), além da promoção de eventos em datas alusivas ao combate às drogas. "Por exemplo, no Dia Mundial do combate ao Fumo, a gente faz uma confraternização com os funcionários. Mandamos mensagens no contra-cheque, pela intranet; O jornalzinho interno da empresa é outro canal muito importante, pois o funcionário leva o jornal para casa e o filho lê, a mulher, a mãe, todo mundo lê e você está levando a campanha para dentro da família dele", explicou Joaquim Melo.


Já as prevenções secundária e terciária atuam em um terreno no qual o funcionário já teve algum contato com a droga. O coordenador do programa da Petrobras fez questão de ressaltar que esses programas nas empresas devem servir para recuperar profissionais, não para identificar possíveis usuários para serem demitidos. "O programa tem que servir para recuperar. Demitir um usuário de drogas, sem justa-causa, é um crime. Ninguém pode ser demitido de uma empresa só porque usa drogas. O usuário pode até ser demitido da empresa sim, mas porque abandonou o emprego, chega atrasado ou não cumpre suas tarefas corretamente, o que é algo relativamente comum nesses casos", disse.


De acordo com o palestrante, as empresas devem estar isentas de qualquer tipo de preconceito, quando o assunto é o uso de drogas. Lembrando que todas as empresas buscam o lucro suas iniciativas, incluindo os programas para dependentes, o representante da Petrobras destacou a importância de esses programas darem retorno para a empresa. "Empresa não é instituição de caridade. Ela faz isso e espera obter retorno financeiro, social e humanístico. O maior desastre ambiental da história aconteceu com um petroleiro da Esso, cujo comandante executou uma manobra errada porque estava bêbado. Isso não pode acontecer. Evitar possíveis danos que um funcionário dependente possa causar é, sem dúvida alguma, um grande benefício desses programas", finalizou.


Comunidade


Quem acompanhou a conferência do psiquiatra Jorge Jaber , proprietário de um clínica privada para dependentes químicos, sobre o papel da comunidade na prevenção ao uso de drogas ganhou de brinde um concerto de rap. É que o especialista, em um momento de descontração, interpretou trechos de um rap que prega a legalização da maconha, com brados de "legalize já".

"Maconha faz mal sim. Esse argumento de que é só uma erva, algo natural, portanto não traz malefícios é um dos maiores absurdos que podemos ouvir", enfatizou.


O palestrante destacou que a luta contra o uso de drogas tem que priorizar a abstinência total, mas a diminuição do uso já deve ser comemorada. Examinar a comunidade, ver quem são seus membros, quais suas atividades, que recursos dispõe e quais os poderes disponibilizados seriam fatores indispensáveis para buscar o apoio da sociedade civil na luta contra as drogas.


Jorge Jaber citou o exemplo da Câmara de Comércio da Barra da Tijuca, uma instituição da sociedade civil que, entre outros trabalhos, desenvolve campanhas de prevenção ao uso das drogas. "Temos cursos de primeiros socorros, senhoras que são voluntárias no Hospital Lourenço Jorge, chamadas de 'verdinhas' (em referência à cor do uniforme que usam), curso de como lavar cisternas, mas a luta contra as drogas tem sido uma de nossa metas nos últimos anos", destacou.


Contando com 139 mil moradores, de 180 condomínios da Barra da Tijuca, o projeto conta com financiamento de comerciantes locais, além do apoio da prefeitura, que fornece infra-estrutura aos eventos promovidos. "A gente junta um grupo, vai na prefeitura, e diz que quer falar com o Cesar Maia. Se ele não receber a gente, a gente diz que vai na Rede Globo dizer que o prefeito não recebe a comunidade. A gente luta com as armas que tem. A mídia tem sido um forte aliado", contou o palestrante.


Foi a exaustiva exposição na mídia, segundo Jorge Jaber, que alavancou a campanha anti-drogas da instituição. Contando com nomes conhecidos do grande público, como atrizes globais, atletas olímipicas e músicos, o projeto alcançou o horário nobre da TV, levando a causa para dentro dos lares brasileiros. "A gente se reúne em um hotel, que dá até lanche para a gente, e ali mesmo inicia a capacitação de jovens, que se transformam em agentes da mensagem anti-drogas. Treinamos a família, o jovem, a comunidade toda. Nessa luta, é fundamental você formar líderes dentro da própria comunidade. Às vezes, a gente vai dar uma palestra e tem só cinco pessoas. Outras vezes tem cem. O que importa é acreditar na força que a comunidade tem. A resposta pode estar nas nossas mãos", opinou.

(Agência Notisa – jornalismo científico - science journalism)



(2) Jovens mudam de comportamento principalmente quando se apaixonam, não só quando começam a usar maconha

Mudanças nos hábitos, queda no rendimento escolares e novos amigos são os principais sintomas do contato com a droga. Pesquisador gaúcho, entretanto, recomenda bom senso no julgamento.



Se seu filho, aluno ou colega, subitamente, apresenta uma mudança de hábitos, queda no rendimento escolar e passa a andar com novos amigos, ele pode ter começado a usar maconha. Segundo o psiquiatra e psicanalista, Sérgio de Paula Ramos, médico do Hospital Mãe de Deus (RS), estes são os principais sintomas do contato com a droga na adolescência, mas adverte: não é possível identificar um usuário com base somente nesses indícios. “Aos 16 anos, a etiologia (causa) mais freqüente de mudanças não são as drogas: é a paixão. Então é fundamental ouvir o adolescente e fugir da paranóia do drogado”, defende ele.



Segundo o pesquisador, que trabalha no atendimento a usuários e dependentes químicos há mais de 30 anos, é fundamental que todos os que lidam com adolescentes fiquem atentos ao comportamento dos jovens, mas sempre com cautela. “Me preocupa, por exemplo, tanto a professora paranóica que vê em seus 40 alunos somente maconheiros, como aquela (professora) ingênua, que não vê nenhum”, afirma. Ramos, que explica que o primeiro passo no atendimento ao um possível usuário de drogas é o diagnóstico, que se fundamenta em uma anamnese (relato) pessoal (do usuário) e familiar.



Segundo dados da OMS, existem mais de 140 milhões de usuários em todo o mundo, cerca de 2,5% da população mundial. Na opinião de Ramos, a freqüência do consumo é muito significativa, sobretudo na área de saúde e da educação.



O psiquiatra afirma que para que a definição do tratamento seja adequada, é necessário um equilíbrio na abordagem do médico, que deve se preocupar tanto em identificar que contato seu paciente teve com as drogas, quanto conhecer sua biografia. “Em geral, os profissionais se concentram ou só no consumo das drogas, ou só na biografia do adolescente”, diz. Segundo Ramos, um erro na avaliação do médico pode levar a decisões absurdas. “Para mim é um crime hospitalizar o experimentador, o usuário leve. Esse procedimento só é indicado para casos graves, em que o paciente não tem apoio familiar”, afirma.



O pesquisador diz que a maioria dos jovens que experimentam drogas, seja o álcool, o cigarro ou a maconha, não desenvolve um uso continuado. Em caso de dúvida sobre que tratamento adotar, ele recomenda cautela e bom senso. “Às vezes eu levo até três meses para decidir que opção terapêutica escolher”, afirma. “Eu tive um paciente, por exemplo, que se atirou do 3º andar após fumar maconha. Na consulta, ele jurou que não passou por sua cabeça o suicídio. O que aconteceu é que ele estava perto da janela e, momentaneamente, acreditou que era Deus e que o amigo que estava junto com ele, era o diabo. Com o objetivo de fugir do diabo, ele quis simplesmente sair ‘voando’ pela janela do quarto. Em casos como esse, é claro que se deve adotar algum tratamento imediato, pois o paciente pode voltar a cometer uma loucura”, diz o médico.



Na opinião de Ramos, com o diagnóstico traçado, o médico deve literalmente negociar a terapêutica a ser adotada com seu paciente. “Não adianta estabelecer objetivos megalômanos. Não adianta dizer para o adolescente: a partir de hoje você nunca mais vai poder fumar maconha”, defende. Para ele, definir metas mais simples no começo estimula o usuário a continuar o tratamento. “Pode-se combinar com o paciente, por exemplo, que ele vai tentar não usar a droga até a próxima consulta”, diz. Isso permite que ambos (médico e paciente) avaliem o que levou não cumprimento do acordo.



Um dos principais obstáculos à motivação do paciente a continuar no tratamento são o seu estilo de vida, seus amigos e sua família. “É fundamental trabalhar a rede social de apoio do usuário”, afirma o médico. Segundo ele, além da fissura pela droga, o fato de muitas vezes o dependente não possuir amigos que não utilizem drogas, diminui as chances de recuperação. “Eu me divirto quando participo de debates com clínicas particulares de recuperação. Existem clínicas que afirmam que chegam a recuperar 110% de seus pacientes”, disse em tom de brincadeira, lembrando que os centros mais sérios de todo o mundo comemoram quando chegam a uma taxa de 40% de recuperação.



(Agência Notisa – jornalismo científico - science journalism)




(3) "Um matinho fedido" que tem dado trabalho


Psiquiatra de Porto Alegre fala sobre espetacularização da maconha e diz que jornalistas usuários podem ser responsáveis pelo problema. Segundo o especialista, profissionais de saúde também estariam utilizando a planta.


"Será que o guri era meio atrapalhadinho das idéias, daí virou maconheiro, ou será que, por ser maconheiro, ficou meio atrapalhadinho das idéias?" Foi criando polêmica que Sérgio de Paula Ramos, convidado especial do curso "Maconha- mitos e verdades", do IV Simpósio Internancional sobre Álcool e Outras Drogas, iniciou sua fala, no primeiro dia do encontro. O palestrante trouxe o tema "Maconha e transtornos mentais: qual a relação?".


Doutor em Medicina pela Unifesp e Coordenador do Serviço de Psiquiatra do Hospital Mãe de Deus, em Porto Alegre, Ramos apontou um dado preocupante: mais de 50% dos usuários de drogas terão mais de um distúrbio psiquiátrico ao longo da vida: "28% sofrerão de ansiedade, 18% de transtornos anti-sociais, 7% de esquizofrenia". De acordo com o palestrante, casos de uso de maconha podem denunciar psicopatologia prévia, que pode se agravar com a constância do uso da droga.


"Adolescentes que fumam têm até duas vezes mais chance de se tornarem alcoólatras, cinco vezes mais de usarem maconha e até doze vezes mais probabilidade de usarem outras drogas", destacou o psiquiatra. Para ele, prevenir o consumo de tabaco pode ser uma eficiente maneira de prevenir o consumo de outras drogas; quanto mais retardado fosse o contato do jovem com a droga, maiores seriam os benefícios — "se tem que experimentar cigarro, que seja o mais tarde possível", declarou.


Sobre o que vem se convencionando chamar de "uso recreacional da droga", Ramos levou a platéia a momentos de descontração. "Eu imagino um adulto, pensando: ‘hoje, como eu sou mais crescidinho, não posso ir no escorrega, daí eu puxo o meu fuminho, que é a minha recreação. Isso é um absurdo. Não tem cabimento dizer uma coisa dessas", contestou.


Ramos mostrou os resultados de uma pesquisa que mediu a perda da cognição nos usuários de maconha. Um fone de ouvido emitia sons curtos e longos, alternados entre os ouvidos direito e esquerdo, os quais deveriam ser percebidos pelos dois grupos de pacientes: usuários e não usuários de maconha. Após três dias de abstinência, somente 47% dos usuários de drogas conseguiram acertar a freqüência de sons emitida, enquanto 89% dos não usuários identificou a sonoridade. "Vejam que o maconheiro perde metade de sua capacidade cognitiva. Imagina esse aluno em uma sala de aula? Como vai se concentrar? Como vai aprender? O resultado é a repetência e a evasão", destacou.


Outra pesquisa citada por Ramos investigou 1265 indivíduos na Nova Zelândia, ao longo de 25 anos. Entre o grupo, dos que nunca usaram drogas, somente 14% abandonaram a escola, contrastando com um índice de 81,8%, entre os usuários de droga. Quando o tema é entrar na universidade, entre os que nunca fumaram, 40% conseguem chegar ao ensino superior, feito alcançado por 11% dos usuários dependentes de drogas. "Você imagina esse resultado no Brasil? Esse estudo foi feito na Nova Zelândia, um país que não tem vestibular para entrar na universidade. Já pensou no Brasil, com um processo seletivo como o vestibular, como seriam esses dados?", alfinetou.


De acordo com o palestrante, os dados dos dois estudos apresentados bem revelam a extensão do dano que o uso de drogas como a maconha pode fazer. "Quem usa maconha tem diminuída a cognição numa etapa fundamental da vida, que é na juventude, quando você está construindo o seu futuro, a sua carreira, os seus relacionamentos, a sua base social. É um dano que pode ser irreparável, tendo o jovem que pagar o preço durante toda a vida", lamentou.


Sobre as relações entre o uso de maconha e a esquizofrenia, Ramos destacou que dependentes da erva têm até duas vezes mais risco de desenvolverem esquizofrenia. O alerta cabe especialmente para gestantes fumantes de maconha, que podem aumentar as chances de gerar um bebê com tendências esquizofrênicas. "O uso da maconha durante a gravidez é o segundo fator que mais pode gerar bebês com esquizofrenia. Só perde para gripes no primeiro trimestre de gravidez, que também podem ocasionar esse quadro psiquiátrico", disse o palestrante.


Com relação ao que chamou de "espetacularização da maconha", o psiquiatra citou que, algumas vezes, o próprio jornalista pode ser um usuário de maconha, acabando por buscar espaço na mídia para matérias que defendam o uso da planta. "Se ele fuma maconha, lógico que ele vai procurar um espaço para pôr uma matéria ou outra falando sobre os benefícios da droga. Mas isso não acontece só entre os jornalistas não. Muitos profissionais de saúde estão puxando fumo", polemizou o médico.


Ramos citou que costuma ser procurado pelos meios de comunicação para falar sobre os malefícios da maconha. Lembrando de uma vez em que deu uma entrevista para as "páginas amarelas" da revista semanal Veja, o psiquiatra concluiu a palestra dizendo realmente o que pensa sobre maconha: "A entrevista ia bem, até que a repórter resolveu puxar o meu tapete. Me perguntou se eu já tinha usado maconha. Eu respondi que sim. Daí ela vei com outra pergunta: ‘e o que o senhor achou?’. ‘Achei maconha um matinho muito fedido’, respondi a ela. Hoje se alguem me perguntasse o que eu penso sobre a maconha, sem medo, eu responderia: continuo achando um matinho fedido", finalizou.


(Agência Notisa – jornalismo científico - science journalism)


(4)Scott Leischow prega maior divulgação e aplicação dos resultados das pesquisas científicas

Especialista norte-americano explica como a pesquisa gera benefícios para a luta contra o tabagismo. Segundo ele, um dos maiores motivadores para a pesquisa científica na área são as necessidades mercadológicas. Ciência, além de trazer novidades para a clínica, também serviria para motivar o paciente a exigir melhorias. Scott Leischow ainda contou uma experiência que vem dando certo no combate ao fumo nos EUA: as quitlines.


O segundo dia das discussões do VIII Simpósio Internacional sobre Tratamento de Tabagismo começou com a palestra de Scott Leischow, do National Cancer Institute, centro norte-americano de referência na pesquisa contra o câncer. Na opinião do especialista, a interação entre a pesquisa científica e a prática clínica precisa ser maior: "Algo que é descoberto hoje pela ciência pode demorar até 17 anos para chegar ao tratamento dos pacientes, o que pode significará a vida ou a morte para muitos doentes", definiu.


O norte-americano explicou que as produções científicas desenvolvidas em todo o mundo nem sempre alcançam o desfecho esperado, seja por não conseguirem comprovar algo ou simplesmente por seus resultados não serem os esperados pelos pesquisadores. "Mas, muitas dessas pesquisas que não conseguem provar nada ou trazer um dado novo acabam até sendo publicadas, pois o caminho que levou o pesquisador a chegar à tal conclusão pode ser útil em outros estudos. Outros estudos, porém, acabam mesmo indo para o lixo, por não contribuírem com nada realmente", lamentou.


Desde a problematização de um dado até a descoberta de um novo conceito e sua efetiva aplicação clínica, toda a pesquisa científica percorre uma espécie de "estrada comum", segundo Scott Leischow. Esse caminho é representado por três etapas: descoberta, desenvolvimento e aplicação dos novos conceitos descobertos.


"No caso específico das pesquisas contra o fumo, esses três caminhos são percorridos tendo como base um forte aliado: a epidemiologia. É a epidemiologia que investiga fatores fundamentais à definição de quem é o nosso paciente, como qual o perfil do fumante, o que o leva a fumar, quais as características do ambiente em que vive. Saber isso é fundamental para direcionar os estudos realizados", garantiu Scott Leischow.


Outro ponto destacado pelo palestrante foi a importância de uma correta avaliação dos dados que já existem, para evitar reincidência nos focos das pesquisas, maximizando os resultados e diminuindo os gastos excessivos. Na opinião dele, uma importante fonte de pesquisa são "os arquivos secretos da indústria tabagista", que podem ajudar a desvendar os caminhos que levam à dependência. "A indústria do cigarro tem revelado muita coisa que, até então, escondia a sete chaves e essas informações não podem ser negligenciadas pela pesquisa científica, que jamais deve se esquecer do seu sentido de investigação", relatou.


Contudo, o palestrante fez questão de destacar a importância do que chamou de "compatilhamento de dados". A partir dessa proposição, toda a comunidade científica internacional deveria criar uma rede, na qual fossem disponibilizados dados básicos de determinados estudos, permitindo com que as pesquisas evoluíssem de forma sincronizada em todo o mundo. "Muitos estudos deveriam ter seus dados compartilhados, pelo fato de beneficiarem a coletividade. Cada vez mais isso vem sendo exigido. Encontros internacionais como este, por exemplo, deveriam ser mais comuns, por permitirem a troca de informações entre países como Estados Unidos e Brasil, que tradicionalmente vêm lutando contra o fumo", afirmou.


Segundo o palestrante, a aplicação da pesquisa só acontece após a difusão da informação, que, normalmente, acontece para pequenos grupos, composto por públicos altamente motivados, "como neste simpósio, onde novidades são apresentadas para um seleto grupo". Para ele, resultados de estudos científicos precisariam ser mais divulgados também para o grande público, não apenas para uma minoria de especialistas. "Os dois processos, tanto a divulgação para pequenos grupos motivados, quanto para maiorias, são fundamentais. Com os dois tipos de divulgação podemos atingir nossos objetivos: levar para a comunidade os benefícios da pesquisa científica", opinou.


O especialista traçou um mapa do que chamou de "modelo para controle do tabaco", esquema que, na verdade,exemplifica o que leva a Ciência a pesquisar determinado assunto. Primeiro, Scott Leischow identificou a necessidade revelada por algum problema, que resulta em um "empurrão científico". Posteriormente, esse resultado da pesquisa científica, que fora motivada pelo problema, alcança uma aplicação prática, chegando então à população. "Finalmente, o que identificamos como a última etapa é a necessidade da demanda de mercado, o que puxa o desenvolvimento desse caminho. Na verdade, são as necessidades de mercado que acabam direcionado muitas pesquisas científicas. Na pesquisa contra o fumo isso é bastante evidente", polemizou.


Outro papel da pesquisa científica, segundo Scott Leischow, além de trazer a renovação do conhecimento, é o de gerar conscientização na própria comunidade. O exemplo citado foram as pesquisas que visam a combater o alcoolismo. Esses estudos, além de contribuírem com dados novos para diminuir o vício, deveriam estimular a conscientização dos alcoólatras, para que lutem por melhores condições de atendimento à categoria. "Esses estudos devem possibilitar um alcoólatra mais consciente dos seus direitos a exigir do poder público mais serviços voltados para o seu atendimento. A luta dos pacientes terá sempre um peso decisório que jamais a pesquisa científica conseguirá suplantar", garantiu.


A experiência das "quitlines"


Scott Leischow aproveitou o encontro para narrar uma experiência norte-americana de combate ao fumo que tem gerado frutos: as "quitlines" ou linhas de abandono. Através das "quitlines" o usuário do tabaco dispõe de uma linha telefônica direta de atendimento, podendo falar, a qualquer momento, com especialistas, esclarecendo suas dúvidas sobre o fumo. "Não existem clínicos suficientes para atender às demandas do fumante. Daí a necessidade de se disponibilizar canais alternativos para que o fumante consiga de informar sobre os malefícios do fumo e os danos que este pode causar a sua saúde", explicou.


As quitlines são baseadas em dois tipos de linhas: reativas, onde o paciente liga e é atendido por um operador capacitado para esclarecer dúvidas, e linhas pró-ativas, nas quais o paciente liga e agenda conversas telefônicas periódicas. "As reativas são menos eficazes do que as pró-ativas, pois não geram comprometimento do paciente com um ciclo de tratamento. Já as pró-ativas, por exigirem determinada periodicidade, levam o paciente a se sentir permanentemente acompanhado", afirmou o pesquisador.


A Califórnia foi, segundo Leischow, o primeiro estado norte-americano a adotar a experiência das quitlines, em 1992. Hoje a idéia já alcança mais da metade do território, incluindo estados como Texas, Nova Iorque, Flórida e Ohio. Uma das maiores vantagens do sistema, de acordo com o médico, é o fato de as centrais serem interligadas em uma rede de quitlines, que compartilham seus dados, favorecendo, inclusive, estudos voltados para as necessidades de determinado estado. O serviço é disponibilizado através de uma discagem gratuita, por um número 0800, que pode ser acessado por qualquer aparelho telefônico. "Eles ligam para o 0800 e a gente pergunta qual o estado deles. Se for um local que já possua quitline, redirecionamos a ligação para o estado do fumante. Do contrário, nossa central mesmo efetua o atendimento", esclareceu.


Para a evolução do mecanismo, encontros regulares são realizados entre os gestores dos estados-membros, objetivando realizar alterações que possam maximizar os resultados do processo. Em um último encontro, os membros decidiram que algumas medidas precisavam ser tomadas, entre as quais: enfatizar uma campanha nacional para a adesão de outros estados às quitlines; adesão da mídia à campanha, levando a idéia para outros cantos do país; capacitação de maior número de operadores; envio para o congresso de um projeto objetivando aumentar a taxação sobre a indústria do fumo, verba que iria permitir a criação de um fundo nacional de saúde para os fumantes.


Atualmente o serviço conta com 70 funcionários, que oferecem atendimento em inglês e espanhol. O projeto acabou de chegar à Internet, onde também presta atendimento aos fumantes, no site www.smokferee.gov. A idéia é levar a proposta para outras partes do mundo, principalmente para os países que tradicionalmente travam luta contra o tabaco. "Países da Europa, Brasil e Austrália, por exemplo, têm evoluído bastante na luta contra o fumo. O Brasil, principalmente, avança a passos largos. O que precisamos, sem dúvida, é de uma parceria global contra esse flagelo chamado fumo", concluiu.


(Agência Notisa – jornalismo científico - science journalism

SIGA-NOS NO Google News