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O recado do Cheida - O vaga-lume e o sapo

Luis Eduardo Cheida* - 03 de março de 2007 - 08:46

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Lustroso um astro volante

rompeu das humildes relvas:

com seu vôo rutilante

alegrava à noite as selvas.



Mas de vizinho terreno

saiu de uma cova um sapo,

e despediu-lhe um sopapo

que o ensopou de veneno.



Ao morrer, exclama o triste:

“Que tens tu que me acuses?

Que crime em meu seio existe?”

Respondeu-lhe: “Porque luzes!”



A inspirada portuguesinha, Marquesa de Alorna, nos idos de 1810, desfechou estes versos como uma bofetada.

Porque achamos belo, acabamos por destruir o objeto que nos atrai.



O mundo está cheio de exemplos assim.



O marfim é admirado por sua beleza e resistência. Ano passado, 23 mil elefantes africanos (a segunda maior criatura viva sobre a Terra) foram mortos para abastecer o mercado ilegal de marfim. Um massacre.



Assim agem os juntadores de conchas, os apanhadores de corais, os caçadores de pássaros, os colecionadores de borboletas...

Por motivos similares, desaparecem o urso panda chinês, o coala australiano, a marmota de Vancouver, as orquídeas da Mata Atlântica, o rinoceronte de Sumatra, a foca do Mediterrâneo, o corvo do Havaí, o antílope do Tibet, a águia e o crocodilo das Filipinas, o peixe-cachimbo do Texas, o lobo da Tasmânia, o gorila das montanhas...

São espécies em extinção. São mortos-vivos.


Há mercado para a beleza. E ele precisa ser abastecido.


Como a humanidade age para reparar essa destruição? Como aplaca a consciência que mata porque inveja? Que mata porque ama?


Simples: os canteiros de flores viraram asfalto? Façamos flores de polietileno. Edificamos a cidade onde antes havia floresta? Contruamos árvores de plástico. Extingüimos o noa da Nova Zelândia ou o rukh de Madagascar? Montemos estes bichos em borracha.

Fazemos isso tão perfeitamente que, sem-querer-querendo, fazemos quase igual à mãe natureza. Duvida?


Ano passado, em Monte Alto, interior de São Paulo, Domingos Alves, de 60 anos, e Alceu Colevate, de 70, decidiram fazer uma boa ação: plantaram uma árvore no canteiro da cidade. Durante três meses, cercaram a planta de mimos, regando-a todos os dias. Os vizinhos, entusiasmados, participavam. Após três meses, a árvore não cresceu, não floriu, não deu frutos e não murchou. Final do ano, perceberam: haviam plantado uma árvore de plástico!


Segundo o poema, o sapo destrói o vaga-lume porque ele brilha. A inveja mata.

Somos o sapo.

Se, no final dos tempos, nos perguntar a natureza: que tens tu que me acuses? Que jamais respondamos: porque luzes! Seria triste demais.


A espécie humana tem seu próprio brilho. É só procurar. É só admitir.

Enquanto isso, um forte abraço e até sexta que vem.


PS: Ontem fui eleito presidente da Comissão de Ecologia e Meio Ambiente da Assembléia Legislativa do Paraná. Junto a outros seis deputados, pretendo desenvolver um trabalho coerente com os pontos de vista que defendo aqui.


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Luiz Eduardo Cheida é médico, deputado estadual e presidente da Comissão de Ecologia da Assembléia Legislativa do Paraná. Foi prefeito de Londrina, Secretário de Estado do Meio Ambiente, membro titular do CONAMA (Conselho Nacional do Meio Ambiente) e da Secretaria Nacional de Recursos Hídricos.

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