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O recado do Cheida - A solitária não ficará só

Luis Eduaqrdo Cheida* - 23 de fevereiro de 2007 - 19:14

Sempre pensei na autópsia daquela múmia egípcia, em que foram encontrados ovos de solitária, como uma descoberta educativa. Afinal, o que já fazia dentro de um faraó, há 4 mil anos, nossa velha e asquerosa Taenia solium?

Declamando Shakespeare, que um dia escreveu um homem pode pescar com o verme que se alimentou dum rei e comer o peixe que se alimentou desse verme, é que não era.

Por isso, deduz-se que ela estava fazendo nele o que suas primas fazem conosco nos dias de hoje: comendo e reproduzindo-se. Aliás, em matéria de número de filhos, não há animal na Terra que bata uma solitária. Pode por pulgão, cupim, coelho, mosquito, cabrito, o que quiser. Solitária é solitária, desde tempos imemoriais.

Mas, sem desviar do assunto, chegou o laudo cadavérico.

E o médico foi logo isentando a solitária:

- O homem morreu de velho.

Entretanto, a necrópsia da solitária veio junto.

- A solitária é tão velha quanto o homem – datou o cientista.

- Então, eram dois velhos conhecidos – reconheceram ambos.

- Provavelmente.

- Sendo assim, ela não mataria o rei.

- Só se fosse estúpida.

- Por quê?

- Elementar: parasita que mata o hospedeiro, morre junto com ele.

- Eu nunca havia pensado nisso...

- Então, já passou da hora de pensar.

Assim, tenho matutado desde então.

Que a espécie humana tem sido uma verdadeira praga, basta olhar para o que sobrou de Serra Pelada, basta ver qualquer solo erodido pela chuva, olhar um campo de batalha ou qualquer mata queimada. Bote olho nisso e, depois, com a ajuda de uma lupa, veja qualquer micose: não há a mínima diferença.

O homem, para a pele do planeta, não difere de um fungo agressivo.

As bactérias matam pelas toxinas que produzem. A diferença entre estas mortais substâncias e os poluentes que produzimos é que os nossos matam em escala.

O homem, para a vida do planeta, não difere de uma bactéria patogênica.

E poderia gastar o dia e a noite nestes macabros comparativos.

Mas, da mesma forma que a solitária hospeda-se no rei, nós nos hospedamos aqui. Somos hóspedes na Terra. Matá-la, é morrer junto.

Então, qual o caminho?

Se a solitária fosse um parasita agressivo, exterminando seu hospedeiro, talvez não a conhecêssemos hoje, a não ser quando abríssemos as tripas de uma múmia milenar. Em outras palavras, enquanto espécie, já estaria extinta.

Todavia, ela continua entre nós. Embora seja um verme parasita, permanece viva, dando lições de etiqueta de como hospedar-se bem. De como morar na casa de alguém, causando o mínimo dano possível.

Aprendendo com os vermes. Quem diria...

Mas, isso não é demérito. O importante é aprender.

(Será que um dia aprenderemos?)

Sou otimista. Acho que a solitária não ficará só.

Enquanto aprendemos, um forte e ainda solitário abraço e até sexta que vem.

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Luiz Eduardo Cheida é médico e deputado estadual. Foi prefeito de Londrina, secretário de meio ambiente do Paraná e membro titular do CONAMA

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