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O perigo da lei do “menor preço global”

Orlando Oda* - 25 de setembro de 2013 - 13:02

A lei das licitações “menor preço global” transforma tudo em sal de cozinha. Sal é sal, todos são iguais, portanto, vamos comprar pelo menor preço. O que há de errado neste procedimento? É a falta de visão holística. Por isso estamos brincando de ser pobres. Eu pago pouco para você, que paga pouco para o seu fornecedor, que paga pouco para os seus funcionários e assim vivemos para sempre, felizes e pobres.

Por que não brincarmos de sermos ricos? Eu pago o melhor possível para você, que paga o melhor possível para “A”, que paga o melhor possível para “B”, que paga o melhor possível para “C” e assim vivemos para sempre, felizes e ricos.

Até entendo o porquê da “Lei das Licitações” aprovada em 1993. A ideia central é uma proposta simplista para acabar com a corrupção tirando do administrador público o poder de decisão sem levar em conta a qualidade, durabilidade, experiência e estrutura da empresa contratada. Porém, por conta de poucos, punem toda a população brasileira.

Não sou economista, nem sociólogo, nem estou fazendo a defesa da “teoria da dependência”, mas o fato é que tudo no universo tem centro e quem comanda é o centro. Por exemplo, o nosso planeta Terra gira em torno do Sol. O Sol também está movimentando e acompanhando a Galáxia e a Terra simplesmente acompanha o Sol nessa viagem. Resumindo: quem comanda é o centro.

O poder central de um país está representado pelo Governo Federal. Da mesma forma que os planetas que compõem o sistema solar, as pessoas, as empresas que formam o Brasil, seguem o seu centro. Se o centro ordena que deve pagar o “menor preço global”, todos os seus súditos vão seguir esta ordem e por conta disso vivemos o país do “menor preço global”.

Uma simples mudança no centro poderia mudar completamente a situação. O governo central, que tem o dever de incentivar a criatividade, a evolução tecnológica, deve premiar os bons empresários na área de serviços considerando em primeiro lugar o parâmetro técnico e em segundo o preço. Se pode fazer a distribuição de dinheiro através de programas sociais, por que não fazer por meio de licitações? Creio que seria mais justo, incentiva o trabalho e a produção.

A maioria das pequenas empresas, excetuando poucas empresas que atuam em determinados nichos de mercado ou que prestam serviços ao consumidor, dependem das grandes corporações públicas ou privadas, portanto são obrigadas a seguir regras comerciais impostas por elas.

Estas empresas públicas e privadas fazem as contratações de serviços por meio do departamento de compras, que normalmente transformam serviços em “commodities”, ou seja, o critério de decisão é: “o menor preço global”. Se você não der desconto, não leva o pedido.

Entendo que a função do departamento de compras seja fazer a melhor aquisição possível, incluindo o preço, mas quando tudo passa a ser em função do preço surgem situações revoltantes.

Outro dia estive numa empresa multinacional, negociando uma proposta e um dos itens era despesa na execução do trabalho. Fiquei pasmo quando o comprador me disse que eu precisava diminuir as despesas. Não há como diminuir despesas de alimentação, hospedagem nem de transporte a não ser reduzindo os dias de trabalho, questão esta já discutida anteriormente.

Minha reação foi de total indignação e revolta. Recusei-me a negociar as despesas, argumentei ao comprador: você viajaria pela sua empresa, tendo que se hospedar num hotel qualquer e comer uma refeição barata ou sanduiche de mortadela? Como vou reduzir despesa de alimentação: vou proibir de alimentar e epousar dignamente, de tomar um banho decente?

Pouco adiantaram as minhas argumentações e as indignações. Fiquei sem o contrato. Aquelas palavras bonitas no quadro de “Missão, Valores” são apenas palavras vazias, ocas, sem valor quando não são praticadas. Empresas que só querem tirar vantagem em cima dos seus fornecedores aproveitando a posição de ser comprador mentem quando dizem: os nossos fornecedores são nossos parceiros. Não sei o que significa parceria para estas empresas, deve ser parceiro para ficar com as contas a pagar.

A minha alegria e tristeza foi ver o balanço mundial publicado por esta empresa. Os seus resultados não foram bons. Alegria porque devem estar sentindo na carne o que quase todos nós prestadores de serviços para grandes empresas e governo vivenciam no dia a dia: ter que trabalhar cada vez mais com preços menores. Tristeza porque não vejo uma solução a curto prazo: continuamos brincando de sermos pobres. Assim viveremos para sempre, felizes e pobres...

Orlando Oda* é administrador de empresas, mestrado em administração financeira pela FGV e presidente do Grupo AfixCode.

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