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Nelson Valente: Curso História da Educação - Módulo III

Nelson Valente - 25 de maio de 2009 - 07:29

Módulo III

O CRISTIANISMO PEDAGÓGICO

Ao longo da Idade Média, acompanhando a evolução da educação cristã, podemos verificar que ela se desdobra em quatro grandes períodos, diferenciados por seus caracteres extrínsecos, mas intimamente unificados por suas finalidades espirituais: o período apostólico, o período patrístico, o período monástico e o período escolástico.
No primeiro período, iniciou-se a difusão da doutrina cristã pela própria voz dos apóstolos. No segundo período, operou-se a subordinação da cultura clássica aos ideais educativos do Cristianismo. No terceiro período, verificou-se a conservação da tradição pedagógica patrística no meio das convulsões sociais e políticas que precederam a formação das nacionalidades modernas. No quarto período, terminadas as guerras e as invasões, estabelecida a ordem social e política e formada uma atmosfera espiritual propícia à difusão da cultura e da educação, puderam os estudos sair do recinto fechado dos mosteiros, das catedrais e dos castelos para florescerem ao ar livre das cidades. Às instituições escolares monásticas vieram juntar-se então às escolas criadas pelas corporações e pelas municipalidades sob a égide espiritual da Igreja. Desse movimento de intensificação e expansão educativa e cultural resultaram as universidades, oriundas da fusão de instituições escolares de vários tipos e graus e constituindo a mais poderosa e fecunda criação pedagógica da Idade Média. Ao mesmo tempo que se processava esse desenvolvimento exterior do ensino e da cultura, também se realizava um desenvolvimento interior de que resultou o método de estudo denominado escolástico (de schola, escola e scholasticus, mestre-escola). O termo escolástico significa, entretanto, conforme o caso, um determinado sistema filosófico, um método especial de exposição e ensino ou numa acepção mais ampla, o movimento intelectual que se estendeu desde o século XII até o Renascimento.
Este movimento que atingiu a sua plenitude no século XIII constituiu uma das fases mais brilhantes e gloriosas da história do pensamento humano. Além de condições sociais e políticas favoráveis e do aparecimento de espíritos geniais e criadores, vários fatores vieram estimular a extraordinária florescência intelectual da escolástica. Entre eles se destacaram:
o desenvolvimento das escolas monásticas que difundiram a instrução por toda a parte, criando um clima espiritual propício aos grandes empreendimentos intelectuais;
a introdução no Ocidente das obras completas de Aristóteles, escoimadas dos erros das traduções espúria que haviam desfigurado o pensamento do Estagirita ao ponto de a sua leitura ser proibida pelas autoridades eclesiásticas, obtidas traduções diretas do grego das obras do grande filósofo, voltou a enciclopédia aristotélica a ser adotada nas escolas e a servir de base para as especulações dos pensadores medievais;
a criação das universidades, congregando alunos e mestres das escolas monásticas e constituindo centros poderosos e fecundos de atividade intelectual e de irradiação cultural;
a fundação das ordens mendicantes dos franciscanos e dominicanos que, seguindo a tradição pedagógica do monarquismo, cultivaram a filosofia, as ciências e as letras, fornecendo mestres brilhantes e profundos para as universidades medievais.

O movimento escolástico, sob o ponto de vista filosófico, pode ser caracterizado pelos seguintes princípios doutrinários: em criteriologia, existência da certeza e objetividade do conhecimento; em metafísica, individualismo acentuado, construído sobre as noções aristotélicas de ato e potência, substância e acidente; em cosmologia, composição substancial dos corpos de matéria e forma, atividade e finalidade interna dos seres; em psicologia, espiritualismo moderado, unidade, substancialidade e espiritualidade da alma, distinção entre o conhecimento sensitivo e o intelectual, origem sensitiva das idéias, livre arbítrio; em teodicéia, transcendência e personalidade de Deus, criação e providência. Além desses caracteres doutrinais intrínsecos, distingue-se ainda, a escolástica pela tendência a construir uma síntese geral do saber humano, pela orientação aristotélica das suas especulações e pela harmonia das suas teses com as verdades reveladas da teologia cristã. Com esses elementos procurou a escolástica defender o dogma das heresias, refutar os erros filosóficos, estabelecer as bases doutrinárias da religião católica e dar aos conhecimentos uma classificação verdadeiramente científica.
Sob o ponto de vista pedagógico, podemos considerar o movimento escolástico como uma síntese da pedagogia tradicionalista e da pedagogia humanista, pois a técnica de ensino preferida nessa época foi, como observa RUIZ AMADO, a análise de um texto clássico para sobre o mesmo se construir uma teoria científica ou um sistema filosófico. Preocupando-se, principalmente, com a formação dialética do espírito, o método escolástico, enquanto se manteve dentro dos seus justos limites, foi um instrumento poderoso de disciplina intelectual.
Um dos motivos da gênese do método escolástico foi, sem dúvida, a falta de livros. Nos monastérios se haviam organizado bibliotecas consideráveis, mas desde o momento em que o ensino saiu do interior dos claustros, os professores e alunos ficaram com deficiências de livros para aprofundar os seus estudos e, assim, foram forçados a restringir-se a um texto que o mestre ditava e sobre o qual versava toda explicação e disputa.
Neste período, as instituições escolares que maior influência exerceram foram as universidades. Elas não surgiram como instituições inteiramente novas. Resultaram do desenvolvimento das escolas dos mosteiros e das catedrais. O nome “universidade” não significava conjunto de cursos ou de ciências, mas sim “universitas scholarium et magistrorum”, isto é, corporações de estudantes e professores reconhecidas na Idade Média de “Studium Generale”, isto é, instituto de cultura geral por toda a cristandade. A partir do século XIV, essa instituição passou a denominar-se “universitas” com a significação de agência educativa.
Várias causas contribuíram para a fundação das universidades. Entre elas:
desenvolvimento das escolas monásticas;
condições sociais e políticas favoráveis;
o auxílio e a proteção da Igreja.

Toda a organização e todo o ensino das universidades eram impregnados de vida cristã.
A criação das universidades se fazia mediante “cartas de fundação” concedidas pelo rei ou pelo papa. As cartas reais não eram outorgadas sem aprovação do papa.
Uma universidade completa compreendia quatro faculdades: teologia, medicina, direito e artes.
A direção geral da universidade cabia a um reitor, eleito por conselheiros e por deãos, por sua vez eleitos pelas nações e pelas faculdades. Os reitores eram alvo de grandes honrarias.
As universidades medievais e seus alunos desfrutavam privilégios especiais: isenção do serviço militar; dispensa de taxas, impostos e contribuições; jurisdição sobre o próprio território; direito de conceder licença para ensinar.
Os grandes organismos universitários exerceram uma influência ampla e profunda sobre a vida cultural, social, econômica e política do mundo medieval. Foram núcleos de atividade intelectual intensa e fecunda. Os alunos que deles saíam disseminavam por toda parte as luzes do saber. a influência civilizadora das universidades se estendeu por todos os recantos do Ocidente. A maior contribuição oferecida pelas universidades foi o reconhecimento da primazia dos valores espirituais e dos direitos inalienáveis da personalidade humana que sempre defenderam e ensinaram, e que constituíram as características mais belas e ais dignas da civilização cristão medieval.



O MEDIEVALISMO PEDAGÓGICO


A educação feudal

A educação feudal constituiu o sistema educativo do feudalismo influenciado pela religião cristã. Foi a educação leiga que se desenvolveu paralelamente à educação escolástica.
Uma das instituições mais importantes e influentes do feudalismo foi a cavalaria que, aperfeiçoada e espiritualizada pela Igreja, se transformou num instrumento poderoso de educação intelectual e moral, contribuindo para suavizar a rudeza e a violência dos costumes feudais. A origem da cavalaria antecede a época feudal.
A educação dos cavaleiros era realizada nos castelos feudais e abrangia vários períodos de formação:
até os 7 anos, a criança era educada na família, sob a direção dos pais, que procuravam inspirar-lhe sentimentos e atitudes de piedade religiosa, de obediência aos superiores, de cortesia para com as damas, de amor à justiça e à verdade, de respeito aos fracos e velhos e de compaixão pelos infelizes e pelos oprimidos. Aprendia noções de escrita, de leitura e de cálculo, e exercícios físicos adequados à sua idade desenvolviam-lhe a força muscular e a resistência física;
aos 7 anos, o futuro cavaleiro entrava para o serviço de uma dama, na corte ou no castelo, conforme seu grau de nobreza. O jovem deveria adquirir hábitos de cortesia social, acompanhando a castelã à casa, aos torneios e às festas. Aprendia a desprezar a mentira, a covardia, a deslealdade e a cumprir seus deveres com Deus e para com o rei;
aos 14 anos, o pajem tornava-se escudeiro; recebia uma espada, era iniciado na equitação e na esgrima e acompanhava o cavaleiro a cujo serviço se tinha colocado, cuidando da sua roupa, das suas armas e do seu cavalo; nas horas vagas aprendia noções de religião e de letras;
aos 17 anos, o escudeiro partia para expedições longínquas, a fim de realizar proezas brilhantes que o tornassem digno de receber a ordem da cavalaria;
aos 21 anos, era armado cavaleiro se tivesse dado provas de brio, de coragem, de bravura e demonstrasse possuir virtudes cavaleirescas como a galantaria, a justiça e a cortesia. A investidura do cavaleiro era uma cerimônia simples. O candidato a cavaleiro preparava-se por um jejum de 24 horas e na véspera da investidura, passava a noite numa igreja (vigília darmas), em oração, diante do altar, junto ao qual se achavam as peças de sua armadura. Pela manhã ouvia missa, comungava, vestia uma túnica branca (símbolo da pureza) e a seguir uma vermelha que lembrava o dever de derramar o próprio sangue em defesa dos valores cristãos. O sacerdote falava-lhe e obrigava a cumprir o solene juramento: vida de pureza e probidade, consagrada a serviço do rei, à proteção das mulheres dos velhos e dos órfãos. As peças de sua armadura eram benzidas e jurava diante de seu padrinho (que era um cavaleiro) dar cumprimento integral aos seus deveres.

O objetivo da educação feudal foi a formação do cavaleiro, virtuoso e veraz, cortês e galante, fiel à Deus, à Igreja e ao rei, protetor dos velhos, fracos e humildes. A cavalaria constituiu uma escola de disciplina, de respeito, de dignidade e de heroísmo.
Estudando as instituições pedagógicas e culturais do feudalismo é necessário não esquecer a influência profunda que sobre as mesmas exerceu o movimento das Cruzadas. Foi ampla e intensa a repercussão que o fluxo e o refluxo dessas expedições tiveram sobre a vida social, política, econômica e educativa do mundo medieval.


A educação muçulmana
Os árabes exerceram uma influência considerável sobre a cultura medieval.
Apesar do seu esplendor, a civilização muçulmana ficou muito aquém da civilização cristã, principalmente sob o ponto de vista moral. Como religião, o maometismo nada possui de original, pois representa uma combinação de elementos do judaísmo com outros do cristianismo, formando uma mistura de dogmas simplificados e deformados. O princípio básico da doutrina maometana é a submissão integral à vontade divina. O Alcorão, livro sagrado, resume as regras essenciais da doutrina, ou “revelações” do Profeta.
Os princípios islâmicos se opõem à ciência. O que caracteriza a cultura muçulmana é a convicção de que a pesquisa é inútil, frívola e ímpia. “Deus sabe melhor” é a última palavra de toda discussão muçulmana. Apesar desses preconceitos contrários à ciência, foi brilhante embora sem originalidade, a civilização árabe. A língua árabe, difundindo-se pelo mundo mediterrâneo, constituiu um instrumento poderoso e eficaz para a expansão das idéias científicas e filosóficas dos gregos assimilados pelos maometanos. E foi através de traduções árabes que as idéias aristotélicas se tornaram conhecidas no Ocidente.
Iniciados pelos gregos, pelos hindus e pelos persas, os árabes cultivaram com entusiasmo, a ciência pura e aplicada. Foram notáveis astrônomos, matemáticos, físicos, químicos e médicos. Dedicaram-se ao cultivo da alquimia. A literatura muçulmana foi rica, bela e variada. Os árabes revelaram aptidão pela letras. Foram criadores de obras admiráveis onde encontramos contos, fábulas, poemas, novelas, romances etc. As artes foram também cultivadas pelos árabes. A escultura e a pintura não puderam florescer livremente porque o Alcorão proibia a representação plástica dos homens e animais. A arquitetura foi a arte proferida como elemento decorativo. Esse desenvolvimento das ciências e das letras refletiu-se no âmbito da educação, promovendo a criação de numerosas escolas, academias, bibliotecas e centros de estudos.

(*) é professor universitário, jornalista e escritor

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