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Leia - Língua portuguesa, inculta e bela!

Alcides Silva - 23 de março de 2007 - 09:54

Língua portuguesa, inculta e bela

Alcides Silva
Macaquice gramatical
Estivesse vivo, talvez Manuel Bandeira alterasse o final de uma das estrofes de seu belíssimo poema “Evocação do Recife”, para dizer que os brasileiros “o que fazemos / é macaquear / a sintaxe ianque”.
Volto ao assunto.
Está se tornando muito freqüente e ferindo nossos ouvidos - influência do inglês que se fala nos Estados Unidos – o emprego irregular do gerúndio para expressar aspecto de ação futura: “A escola vai estar realizando a primeira reunião de pais deste ano” – “Na quinta-feira a polícia vai estar fazendo uma blitz na rodovia” - “A cidade vai estar comemorando mais um aniversário” – “Vou estar revendo meus conceitos”.
Se na linguagem oral esses “vai estar” ou “vou estar” podem ser tolerados – até porque na fala, a liberdade sintática é conseqüência da naturalidade -, na linguagem escrita essas construções não devem ser admitidas.
O verbo estar, seguido de gerúndio, expressa uma ação que se prolonga por algum tempo: “Está fazendo forte calor”; o verbo ir, se acompanhado de gerúndio, exprime uma ação de retirada ou de saída, também de caráter durativo: “É tarde e eu já vou indo”. Em ambas as situações, o tempo da ação é o do presente. Isso porque o gerúndio sempre apresenta um processo verbal em curso, em andamento, simultâneo, que está acontecendo ou aconteceu imediatamente antes da ação indicada na oração principal: “Abrindo as janelas, respirei o ar puro da manhã”.
É sabido que o gerúndio é a forma nominal do verbo usada para exprimir uma circunstância ou formar, quando conjugado com os auxiliares andar e estar, verbos freqüentativos (expressa ação repetida ou freqüente), ou para expressar a ação incoativa (=ação que começa) de um verbo, quando estiver junto dos auxiliares ir e vir.
Nos exemplos apresentados na abertura deste comentário, o emprego do gerúndio é irregular porque a ação verbal está a ser realizada, no futuro e o uso do gerúndio é impróprio quando houver distância entre o tempo da ação por ele expressada e o da ação do verbo principal.
É aí que está a influência da língua inglesa. O tal do tempo “present continuous” do falar americano, quando reflete ações já planejadas: “They are moving next week” = Eles estão se mudando na próxima semana. Que, aliás, nada mais é que o nosso futuro simples: Eles estarão se mudando... (ação simultânea).
O prof. Agostinho Dias Carneiro, da Universidade Federal do Rio de Janeiro, publicou pela Editora Moderna, do Rio, um livro-guia muito bom: “Redação em construção”. E lá ele sintetiza: “O gerúndio está bem empregado quando:
- há predominância do caráter verbal ou adverbial;
- o caráter durativo da ação está claro; e
- a ação expressa é coexistente ou imediatamente anterior à ação do verbo principal.”
Pelo que se vê, os exemplos que apresentei no início deste comentário, por expressarem ações futuras, que estão por acontecer, fogem dessa regra geral, constituindo-se todos, destarte, em uso irregular do gerúndio, um gerundismo de nossa atual macaquice gramatical.


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