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Justiça coleciona verdadeiras histórias de amor

TJ/MS - 17 de setembro de 2004 - 08:01

Foi amor à primeira vista. Conheceram-se na rodoviária da Capital, quando ela ia de férias para Cuiabá e ele levava um sobrinho para embarcar. Um olhar, algumas palavras e a troca de endereços. Um mês depois, começava o namoro. Uma semana mais tarde, foram morar juntos. Era o dia 28 de março de 1990. Hoje, 14 anos depois, o casal Augusto Mangieri e Zita de Arruda Souza resolveu oficializar a união.

Essa é uma das muitas histórias reais que passam pela Justiça Itinerante em Campo Grande. Diariamente casais de todas as idades procuram a Itinerante para validar juridicamente o que já está consolidado há anos. Em alguns casos, a união é recente, mas nem por isso as histórias deixam de ser importantes.

Com isso, a Justiça Itinerante, criada em 2001 para atender conflitos de competência dos juizados especiais, está apontando um novo fator social em Campo Grande: o número de pessoas que procuram o Judiciário para a conversão de união estável em casamento está aumentando a cada dia.

Em dezembro de 2003 – quando foi implantada essa modalidade – apenas dez casais solicitaram a conversão. Esse ano, foram 29 pedidos em fevereiro, 127 em março, 250 em abril, 260 em maio e 375 em junho, totalizando 1.041 casais que viviam sob o mesmo teto sem oficializar sua situação familiar.

Zita agora assina Mangieri e não esconde a alegria em fazê-lo. Ela conta que a decisão de casar foi motivada por ser membro de uma igreja evangélica, onde alguns procedimentos (como participar da ceia, por exemplo) apenas são permitidos a quem está com a situação “regularizada”. “Ele não é da igreja, mas não se opôs quando conversamos sobre casamento”, disse.

Quando passaram a habitar sob o mesmo teto, Augusto tinha 66 anos, era viúvo e tinha um casal de filhos. Ela tinha 39 e era solteira. Por motivos de saúde, não tiveram filhos. No dia do casamento, alguns membros da família reuniram-se na casa dos dois para um almoço, entretanto, como era dia de semana, nem todos puderam comparecer.

“Os dois filhos dele moram em São Paulo e o rapaz casou-se com uma viúva, também com dois filhos. As crianças chamam meu marido de avô e formamos uma grande família. A filha, que conheci nove meses depois de estarmos morando juntos, era magrinha e agora engordou. Acho que é porque ela fica tranqüila por saber que o pai está bem cuidado. Eu e ela temos quase a mesma idade e nos damos muito bem”, confessou Zita.

Para o advogado José Paulo Gutierrez, que atende na Justiça Itinerante, o novo fator social é conseqüência da descoberta, principalmente pelas igrejas, da gratuidade das partes processuais e cartorários. “Numa determinada ocasião, recebemos uma van e um ônibus lotados de casais que desejavam converter a união estável em casamento, todos acompanhados por um pastor. Assim, é fácil presumir que as igrejas estão aproveitando para regularizar a situação de casais que viviam maritalmente há muitos anos”, contou.

Uma confidência: Augusto é muito romântico e nunca ficou inibido em dizer EU TE AMO. Zita é mais comedida e lembra que, desde o começo do relacionamento, nunca houve nenhum questionamento quanto à rapidez da união informal por qualquer membro da família. Contando passagens que marcaram a união, ela relata que nunca sonhou em se casar vestida de noiva e que ao lado do agora marido sempre foi muito feliz.

Incentivo – José Paulo conta que muitos casais chegam até a Itinerante incentivados por pessoas da própria família ou conhecidos que construíram seus lares sem o casamento no civil. “Pessoas que vivem juntas há cinco, seis, dez anos estão se casando. Contudo, a maioria das alegações para a procura da Justiça Itinerante está ligada ao fator econômico. Grande parte dos atendimentos é de pessoas carentes”, completa.

O juiz da 3ª Vara de Família de Campo Grande, Dr. Luiz Cláudio Bonassini da Silva, acredita que a procura está aumentando porque as pessoas começam a entender a facilidade da conversão. Ele lembra que a instituição da união estável foi criada em 2002, com o Novo Código Civil, e a sociedade está tomando conhecimento de sua praticidade de forma gradativa.

“Creio que os números tendem a aumentar à medida que se tornar mais clara a rapidez do processo”, disse o juiz, lembrando que embora a união estável seja equiparada ao matrimônio, a sociedade não está acostumada a esta instituição e que a conversão passa a idéia de regularização, embora, perante a lei, não existam modificações de direito das pessoas.

Definitivo – Gutierrez apontou outro aspecto diretamente ligado ao novo fator social. Muitos casais que convertem a união estável em casamento já estão no segundo, terceiro relacionamento e acreditam que a união civil simboliza um compromisso mais sério, como uma forma de mostrar que a última escolha é definitiva. “Não que as uniões anteriores não fossem sérias, mas a conotação da conversão é diferente para os parceiros. É quase uma prova de intenções sérias”, conclui o advogado.

Para evitar dúvidas, o Novo Código Civil define união estável como convivência duradoura entre homem e mulher com objetivo de constituir família e concubinato, como era conhecida anteriormente a relação de convivência sem casamento, como relação não eventual entre homem e mulher, em que um dos dois ainda vive com o cônjuge.

A principal característica da união estável é a informalidade e isso significa que nada impede que os companheiros terminem a vida em comum apenas rompendo a convivência, sem formalidade nenhuma – o que se torna necessário apenas se houver bens adquiridos durante a união, como nas separações judiciais dos casados, para que tudo fique formalizado.

O Dr. Bonassini relata que esse ano julgou apenas dois processos em que havia o pedido de conversão e atribui a redução de processos na vara em que atua a eventos realizados, por exemplo, pelas igrejas, como é o caso dos casamentos comunitários, retirando as formalidades das varas comuns.

Procedimentos: Acompanhados de duas testemunhas, os interessados em realizar a conversão na Justiça Itinerante, se solteiros, devem comparecer com a certidão de nascimento e o RG. Se um dos dois tiver sido casado, deve apresentar a certidão de casamento com a averbação do divórcio.

Apesar da praticidade no processo, alguns detalhes devem ser observados. Se um dos dois for separado judicialmente, a conversão não pode ser feita. Em casos assim permite-se apenas o reconhecimento da união estável e não a conversão. O juiz Bonassini explica que o casamento se extingue apenas com a morte de um dos cônjuges ou com o divórcio.

“A separação judicial não termina o casamento. Mas o reconhecimento da união estável favorece as partes e agiliza o processo, no caso de separação em que estejam envolvidos filhos ou divisão de patrimônio”, finaliza o magistrado.

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