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Escassez de crédito muda financiamento de empresas

12 de outubro de 2008 - 14:14

Até duas semanas atrás, a fabricante de alimentos brasileira General Brands tomava empréstimos para capital de giro pagando juros de 3% ao ano.

Depois do início da crise do crédito, o "spread" (preço do dinheiro cobrado pelos bancos) passou para 12% anuais. Com 5% de sua receita anual de R$ 120 milhões provenientes de exportações, a empresa também usava de ACCs, mecanismo financeiro que permite antecipar o faturamento obtido com exportações em até seis meses. Só que esses, simplesmente, deixaram de existir.

"Não faz sentido pensar que as mesmas empresas que duas semanas atrás estavam ótimas agora estejam quebrando", diz Antonio Carlos Ferreira, vice-presidente da General Brands. "Existe a crise, mas os bancos estão aproveitando para tirar vantagem e ganhar em dois meses o que ganhariam no ano."

A solução encontrada por Ferreira foi de curto --na verdade, curtíssimo-- prazo. Renovou as operações de crédito por apenas um mês, esperando "a volta do bom senso". Enquanto isso, negocia com a cadeia de fornecedores e clientes.

"Nós, na verdade, gostaríamos de estar mais ao lado da empresa do que conseguimos com nossa disponibilidade de recursos", afirma Carlos Catraio, presidente do banco BPN Brasil, especializado em pequenas e médias empresas. "Mas, além de o tíquete médio [dos empréstimos] ter diminuído por conta do risco, o cliente está pedindo mais dinheiro emprestado porque muitos bancos com os quais trabalhava estão negando crédito."

Além disso, diz Catraio, há mais empresas buscando dinheiro. Entre elas, as multinacionais que, até há pouco, tinham linhas mais baratas ou traziam recursos de suas matrizes. "Muitas multinacionais jamais olharam para linhas de crédito à exportação como as do BNDES", afirma Catraio. "Esse, porém, é um dos poucos recursos que não está escasso e apenas não aumentou sua participação consideravelmente em nossa carteira porque sua liberação é demorada."

Se no curto prazo o cenário para as empresas parece crítico, num horizonte mais distante as perspectivas também não são muito animadoras, dizem especialistas. Para Catraio, há uma grande preocupação no mercado quanto à capacidade de honrar pagamentos das empresas estrangeiras que importam do Brasil.

Especializada em segurar os créditos que serão recebidos pelas empresas, a Coface cobria, em média, 81% dos recebíveis de seus segurados. Nos últimos dois meses, o percentual garantido baixou para 60%.

"É uma medida preventiva da seguradora, que percebeu a deterioração nas condições de risco das empresas", afirma Fernando Blanco, presidente da Coface do Brasil e que trabalhou com crédito e gerenciamento de risco em grandes bancos por mais de 20 anos.

Isso porque, diz Blanco, ao não conceder empréstimos às empresas, o sistema financeiro acaba por criar um efeito dominó, repassado a toda cadeia produtiva.

A Lupo tem vivido exatamente essa situação. Os grandes magazines que financiam o consumidor com vendas a prazo começaram a procurar a fabricante de roupas tentando estender os pagamentos por não estarem encontrando linhas de capital de giro junto aos bancos.

"Alguns suspenderam pedidos, mas não temos como estender recebimentos porque trabalhamos com prazos curtíssimos de compra de matéria-prima, com pagamentos em 30 dias", diz Valquírio Cabral Júnior, diretor comercial da Lupo. "Nossa sorte é que os grandes magazines representam apenas 20% do faturamento."

No meio dessa restrição do acesso ao capital, a empresa tem ainda de enfrentar a pressão vinda do outro lado: a do aumento na matéria-prima cotada em dólares. Segundo Cabral Júnior, alguns fornecedores já acenam com reajustes médios na faixa de 12%. "É claro que não temos como absorver um aumento desses, já que os clientes não aceitarão um repasse com as vendas de fim de ano já fechadas", diz ele. "Estamos em negociação."

Para o economista Roberto Troster, sócio da consultoria Integral-Trust, cabe ao Banco Central "dar um passo abaixo e olhar também para as empresas", em vez de ajudar apenas os bancos, usando com agilidade políticas monetárias que garantam liquidez. "Se a economia parar em razão do crédito, o prejuízo será gigantesco", diz Troster. "Demora muito tempo para as empresas retomarem sua produção."

Para Blanco, da Coface, uma das hipóteses a ser adotada pelas empresas, tão logo o momento mais agudo da crise passe, será a busca do crédito nas próprias cadeias produtivas. Nesse caso, as empresas âncoras --como grandes montadoras-- acabam financiando ou facilitando o acesso ao crédito de seus fornecedores menores.

Essa realidade foi vivida no Brasil até cinco anos atrás, segundo Blanco, quando o excesso de liquidez e a oferta de crédito passaram a irrigar o setor produtivo. O quadro, porém, começa a se inverter e as empresas agora acham alternativas para o papel de financiador ocupado pelos bancos.

Maior distribuidora de produtos de informática do Brasil, com faturamento anual de R$ 1 bilhão, a Officer não sentiu restrições ao crédito, mas o custo do dinheiro tomado aumentou. A empresa, porém, tem recebido mais pedidos de revendedoras para que ela fature diretamente para o consumidor final.

"Temos muitos casos de revendedores de pequeno porte que atendem clientes de médio porte", diz Fábio Gaia, presidente da Officer. "Ao atuar como intermediário, esse revendedor não tem encontrado crédito bancário, que está simplesmente paralisado. Temos, então, usado nosso aval de empresa grande para faturar direto para o cliente, pagando a comissão do revendedor."





Folha Online

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