Geral
Lingua Portuguesa: Inculta e Bela por Alcides Silva
A dúvida não é nova e tomou praça em 1956, quando o grande Guimarães Rosa, publicando as sete estórias de seu Corpo de Baile, recriou literariamente e com maestria-, a partir das virtualidades do manso falar rural, numa linguagem inovadora, vigorosa e, sobretudo, sonora, o lado mágico e transcendente da vida e dos causos dos vaqueiros do norte das Minas Gerais. Depois vieram, em 1962, Primeiras Estórias, em 1967, Tutaméia, com o subtítulo "Terceiras Estórias", e o póstumo Estas Estórias, publicado em 1969.
O lingüista João Ribeiro, em 1919 sugeriu que fosse restabelecido o termo estória para designar a narrativa popular, o folclore. A palavra já existira no português medieval. Luís da Câmara Cascudo, em Dicionário do Folclore Brasileiro (edição do Instituto Nacional do Livro, Rio de Janeiro, 1954, página 251), fala da importância de ser empregada a palavra estória para as narrativas, os contos tradicionais, ficando história para o sentido oficial do vocábulo. Ele entendia haver necessidade em distinguir História do Brasil da História da Carochinha. É natural que essa distinção se possa dar por simples fixação ideográfica. Aliás, Câmara Cascudo informa que Sílvio Romero também empregou a grafia. A primeira edição de seus Cantos populares do Brasil é de 1883.
Registrado em alguns dicionários tidos como antigos, como o Caldas Aulete e o Cândido Figueiredo, e em outros, tão ou mais - modernos quanto o Aurélio, o termo ganhou nacionalidade lingüística ao ser anotado já na edição princeps do Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa (1981). No Aurélio Século XXI, obra póstuma, há simplesmente o registro do verbete e a seguinte observação: Recomenda-se apenas a grafia história, tanto no sentido de ciência histórica, quanto no de narrativa de ficção, conto popular, e demais acepções.
No Michaelis (1998), estória é a narrativa de lendas, contos tradicionais de ficção, causo. O Houaiss (2001), com apoio no Índice do Vocabulário do Português Medieval, declara-a empregada já no século XIII para denominar as descrições de cunho popular e tradicional. O Michaelis a tem como originária do grego historía; Houaiss, do inglês story (= narração, conto, ficção, fábula, anedota).
O certo é que no português moderno que se emprega no Brasil e nisto não vai macaquice alguma à imensa obra rosiana -, tanto podemos empregar estória como história quando nos referirmos a narrativas de ficção; todavia, se tratarmos de casos reais, a palavra exata e única será história.