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Luciane Buriasco

Luciana Buriasco: Foco nos Vivos

Magistrada Luciane Buriasco Isquerdo - 19 de junho de 2017 - 08:40

Luciana Buriasco: Foco nos Vivos

Coração e Alma foi a tradução para o português do título de um dos filmes apresentados no Festival Varilux de Cinema Francês. Numa tradução literal, o nome do filme seria Conserte os Vivos. É que esta estória, baseada num livro de 2013 (o filme é de 2016), mostra como nos casos de doação de órgãos ficamos focados no doador quando deveríamos focar nossas atenções na pessoa que recebe o órgão.

No filme, um rapaz de 17 anos sofre um acidente e tem morte cerebral. Ao mesmo tempo, uma mãe de dois filhos ainda na faculdade, de meia idade, que tem uma namorada, ou seja, muito a viver, aguarda um transplante, pois o marca-passo que usa já não é suficiente em seu caso. Está sem forças sequer para subir escadas e assistir à apresentação de piano da namorada. Acompanhando as duas estórias, vemos o quanto os pais do rapaz demoram a liberar os órgãos e parecem localizar a alma ora no coração ora nos olhos, com medo de arrancar algo essencial de um corpo que só serve para doação, pois já não há vida possível. Pedem uma música especial, uma fala do médico, que atenciosamente lhes faz as vontades. Mas o importante mostrado é a vida da outra, que vai receber o órgão, a viva.

A lição é profunda. Por que focar nos mortos? Transplantando para outras áreas da vida: por que focar no passado quando se tem o presente e o futuro todo por vir?

Imaginem não somente o ser humano, mas um momento histórico. Imaginem nosso cenário político. Segundo a revista The Economist da semana passada, pelo escândalo generalizado de corrupção por aqui, dificilmente Lula esteja livre para concorrer às próximas eleições e Alckmin livre de escândalos, de forma que Dória, Prefeito de São Paulo, ou qualquer outro novo, são os que têm mais chances de se tornar o próximo Presidente, num cenário onde o imprevisível é provável. Até eles lá fora já falam de nosso futuro e nós aqui de nosso passado, de quem mais foi pego, preso, enfim.

Na França, e podendo salvar a própria Europa, o novo tem sido a tônica. O atual Presidente, Emmanuel Macron, que saiu vitorioso também nas eleições do legislativo, pelo apoio que terá com o número de cadeiras ocupadas por seus aliados (361 de 577 é o resultado do segundo turno, que foi ontem), já se falando por lá nos perigos de tanto poder nas mãos de uma só pessoa, nunca antes tinha sido eleito para um cargo eletivo. Há 14 meses criou seu próprio partido, e, aos 39 anos, chegou no mais alto cargo da política, com amplo apoio no legislativo.

Macron promete uma nova política, que acabe com a divisão entre esquerda e direita. Da direita, ele tem a postura liberal de incentivo ao mercado, e defende a flexibilização nas relações trabalhistas. Diz que quer proteger os indivíduos e não os empregos. É a favor de corte nos gastos públicos e reformas na previdência, como restrições ao seguro desemprego. Da esquerda ele tem a postura intervencionista do Estado. Acredita num forte papel do governo, seja em investimentos, educação, modelando, dirigindo e protegendo. O fato é que conseguiu espalhar uma onda otimista na França e mesmo na Europa, que ainda não cicatrizou bem a saída do Reino Unido da União Européia. Aliás, nem o Reino Unido sabe como sairá. Na capa da revista, ele está caminhando sobre águas, como se fala dele no país, pela dificuldade que terá de implementar suas medidas, embora por ora vitorioso. O sapato de mulher afundado ao seu lado parece ser o de Theresa May, depois de sua derrota nas eleições legislativas, com menos apoio do que quando foi eleita Primeira-Ministra do Reino Unido.

Um dado interessante sobre o papel do novo por lá é que nessas eleições legislativas francesas, considerando o primeiro turno, a média de idade dos novos acentos seria de 43 anos, contra os hoje 60-70 anos. Dos aliados de Macron, metade são novos na política e metade mulheres. 90% das cadeiras socialistas foram perdidas. A matéria afirma que se ele conseguir o que quer, será uma verdadeira Revolução Francesa.

Se esse cenário chegar por aqui, e não o de Donald Trump - já se falava em televisivos como Roberto Justus candidato -, os ventos são favoráveis a novos como Dória, se seguir sendo algo novo, porque sem seus superiores, já que não pode se apoiar em nenhum outro político ou corre risco de danos à sua imagem, anda mais quieto, não se sabe se com algum medo, e mesmo novos-novos, como quem nunca teve um cargo eletivo. É tempo dos jovens criarem novos partidos e surgirem com nomes. Ainda dá tempo para surgir um Macron por aqui, inclusive. Ah, e que não seja Collorido, pois já tivemos um jovem, embora antes governador (está mais para Dória) e com velhas práticas, como se sabe.

Foquemos, portanto, nos vivos. Porque os já alcançados pela Lava Jato e congêneres são os mortos, casos para a Justiça, mas não para as urnas. Afinal, se teremos mesmo que fazer reformas impopulares como a da Previdência, que Temer quer fazer para seu sucessor, aproveitando o fato de já ser impopular, e não sabe se conseguirá, necessário um líder que inspire otimismo, que se caminhe por sobre as águas também aqui.

Luciane Buriasco Isquerdo é Juíza de Direito da 2.a. Vara Cível e Criminal de Cassilândia-MS, apresentadora dos programas de rádio Culturativa (http://www.radiopatriarca.com.br/culturaativa.asp) e Em Família, na Rádio Patriarca. Siga-a no Tweeter: @LucianeBuriasco

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