Geral
Língua portuguesa, inculta e bela, por Alcides Silva
O uso irregular do gerúndio
Está se tornando muito freqüente - talvez influência da sintaxe inglesa o emprego do gerúndio para expressar aspecto de ação futura: A escola vai estar realizando uma reunião de pais Na quinta-feira a polícia vai estar fazendo uma blitz na rodovia - A cidade vai estar comemorando mais um aniversário Vou estar revendo meus conceitos.
Se na linguagem oral esses vai estar ou vou estar ainda poderiam ser tolerados até porque na fala, a liberdade sintática é conseqüência da naturalidade -, na linguagem escrita essas construções não devem ser admitidas.
O verbo estar, seguido de gerúndio, expressa uma ação que se prolonga por algum tempo: Está fazendo forte calor; o verbo ir, se acompanhado de gerúndio, exprime uma ação de retirada ou de saída, também de caráter durativo: Já é tarde e eu vou chegando. Em ambas as situações, o tempo da ação é o do presente. Isso porque o gerúndio sempre apresenta um processo verbal em curso, em andamento, simultâneo, que está acontecendo ou aconteceu imediatamente antes da ação indicada na oração principal: Abrindo as janelas, respirei o ar puro da manhã.
É sabido que o gerúndio é a forma nominal do verbo usada para exprimir uma circunstância ou formar, quando conjugada com os auxiliares andar e estar, verbos freqüentativos, ou para expressar a ação incoativa de um verbo (começo, princípio), quando estiver junto dos auxiliares ir e vir.
Nos exemplos apresentados na abertura deste comentário, o emprego do gerúndio é irregular porque a ação verbal está a ser realizada, no futuro e o uso do gerúndio é impróprio quando houver distância entre o tempo da ação por ele expressada e o da ação do verbo principal.
É aí que está a influência da língua inglesa. O tal do tempo present continuous do falar americano, quando reflete ações já planejadas: They are moving next week = Eles estão se mudando na próxima semana. Que, aliás, nada mais é que o nosso futuro simples: Eles estarão se mudando... (ação simultânea).
O bom uso do gerúndio
O prof. Agostinho Dias Carneiro, da Universidade Federal do Rio de Janeiro, publicou pela Editora Moderna, do Rio, um livro-guia muito bom: Redação em construção. E lá ele mostra que o bom emprego do gerúndio traz significados distintos:
1- Gerúndio modal: Chegou cantando.
2- Gerúndio temporal: Indica contemporaneidade entre a ação expressa pelo verbo principal e o gerúndio: Vi o João passeando.
3- Gerúndio durativo: Ficou escrevendo sua redação.
4- Gerúndio cuja ação é imediatamente anterior à do verbo principal: Levantando o peso, deixou-o cair sobre o pé.
5- Gerúndio condicional: Tendo sido publicada a lei, obedeça-se.
6- Gerúndio causal: Conhecendo sua maneira de agir, não acreditei no que me disseram.
7- Gerúndio concessivo: Mesmo nevando muito, iria à festa.
8- Gerúndio explicativo: Vendo que o leme não funcionava, o comandante chamou o mecânico.
Como regra geral, o prof. Agostinho Dias Carneiro sintetiza: O gerúndio está bem empregado quando:
- há predominância do caráter verbal ou adverbial;
- o caráter durativo da ação está claro; e.
- a ação expressa é coexistente ou imediatamente anterior à ação do verbo principal..
Pelo que se vê, os exemplos com que iniciei este comentário, por expressarem ações futuras, fogem dessa regra geral, constituindo-se todos, destarte, em uso irregular do gerúndio, ou gerundismo, assunto já tratado nesta coluna.