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Juíza explica a condenação pelo "mensalinho"
Em entrevista ao Cassilândia Notícias, Luciane Buriasco Isquerdo, juíza da 2.ª Vara da Comarca de Cassilândia, falou sobre a condenação pelo mensalinho. Abaixo, seguem suas palavras:
"Filho de outros processos, ainda corria um processo criminal aqui em Cassilândia da operação chamada Judas e Pilatos. Já tinha sido julgado o então Prefeito, José Donizete, pela prática de pagar propina aos vereadores, inclusive mensalmente para seis deles, em troca de apoio político. A prática infelizmente é conhecida de muitos municípios e ficou em evidência no âmbito federal quando vários políticos foram condenados por essa propina mensal, no que se chamou, pelos valores elevados, e por ser na esfera federal, de mensalão. Aqui, como o valor mensal era singelo - R$ 1.000,00 por mês - e a esfera era municipal, ficou apelidado de mensalinho.
Esse processo concluído esta semana era o mensalinho do lado daqueles que se beneficiaram dele, ou seja, os então vereadores. E há outras coisas juntas, como lavagem de dinheiro - usar esse dinheiro para comprar terrenos, construir casas e vender, como foi feito aqui, sem que esses imóveis passassem pelos nomes dos vereadores, justamente porque não teriam origem lícita, oriunda de suas rendas, para a compra dos mesmos.
A maioria recebeu como pena 5 anos em regime semi-aberto (dois anos pelo mensalinho, dois anos pelas extraordinárias e um ano pela formação de quadrilha). Isso quer dizer que, se a sentença for mantida - ainda cabe recurso, os então vereadores terão de trabalhar durante o dia e se recolher à noite, fins de semana e feriados, no estabelecimento próprio para isso, ao lado do Presídio. E não poderão ter cargo público por dez anos.
Os que receberam somente as propinas pelas sessões extraordinárias tiveram pena de 3 anos (dois pelas extraordinárias e um pela quadrilha), de forma que a pena pôde ser substituída por uma quantia em dinheiro e prestação de serviço à comunidade, além da proibição de ocupar cargo público por cinco anos.
Os condenados também por lavagem de dinheiro tiveram pena de 9 anos e 9 anos e 8 meses, o que implica em serem presos. Só não serão agora porque responderam ao processo em liberdade e têm o direito de recorrerem também em liberdade.
Houve também duas condenações por peculato. São valores pequenos que se apurou desviados, por meio dos tais "Vales" da época - tiravam os valores dos cofres da Prefeitura e colocavam "vales" para lembrarem de depois arrumarem uma nota fria, falsa, que justificasse nas contabilidade a saída daquele valor. Houve pagamento feito a funcionário que não conseguiu explicar sem furos o que fez com o dinheiro. Um desses valores foi recebimento de IPTU com cheque pré-datado que, mesmo pago, seguia tendo "vale", ou seja, o valor não entrou no cofre da Prefeitura, embora tivesse sido dada a quitação. Um dos condenados é comerciante que forneceu nota fria. Um deles, pois os demais já tinham sido condenados em outros processos. Teve pena de dois anos, substituída por valor em dinheiro e prestação de serviços à comunidade.
Em síntese, é o que foi julgado. Foi uma sentença extensa e trabalhosa. Só o Inquérito Policial tinha mais de mil páginas. E tinha ainda uma parte não digitalizada, grande. Eram também vários fatos e vários réus.
Terminada a sentença, fico com essa sensação de lamento de que até hoje a República não tenha se implantado totalmente, com a consciência de que o dinheiro público seja de todos, e não daqueles que estão no poder. Todos saem perdendo ao final, com serviços públicos que poderiam ser melhores, vias públicas, economia mais punjante, gerando empregos e riqueza para todos.
Um dia faremos a conta da corrupção e sentiremos os benefícios da honestidade, que não só é possível, como gera prosperidade para todos, como se vê nos países menos corruptos, sempre mais ricos que os mais corruptos.
Até lá, serão mensalões e mensalinhos, políticos sendo réus, seja no âmbito federal, estadual ou municipal, afastados de seus cargos pela Justiça, o que não era por certo a ideia original de separação de poderes. É estranho que o Estado se volte contra si mesmo. Mas enquanto houver a doença da corrupção, não há outra forma do sistema se auto-recuperar", disse a juíza de Direito.