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Uma sogra, sua orelha e o fim de um casamento

Rubens Paulo Gonçalves* - 09 de maio de 2013 - 16:50

Silvinha era muito engraçadinha. Toda arrumadinha, cheirosa como uma flor, um andar que era a alegria de qualquer homem que com ela cruzasse. Um belo dia chegou ao meu consultório e, sabendo que havia casado no mês anterior, perguntei-lhe:
Que tal o casamento? — ao que ela me respondeu:
— Separei-me!
— Mas já? Só faz um mês que você casou não é?
— É verdade, mas aconteceram umas coisas e eu me separei. Agora vou casar de novo.
Foi então, que ela me contou sua história:
Guardada pela mãe, tinha vinte e um anos e conservava a virgindade inquestionável. Isso não acontecia só por vontade da mãe, mas também e principalmente por um firme propósito de seu noivo Anselmo, que afirmava:
— Gostaria que tivéssemos nossa primeira relação só na noite de núpcias. Senão, qual a novidade quando casarmos?
Muito justo, muito nobre, diziam as tias pois como sempre, essas coisas acabam sendo de conhecimento familiar. Passaram namoro e noivado realmente sem que houvesse nada de “mais íntimo”. Às vezes ele fazia umas caras de tesudo, mas era só. Como costumava dizer: “tenho muito auto controle”.
Silvinha coitada, que não era tão bem dotada de “auto controle” andava sempre insatisfeita, mas, afinal, as tias diziam que Anselmo era um cavalheiro, um gentleman, que seria um grande marido... ela agüentava.
A bem da verdade, é bom que se diga, ela tinha um admirador. Manuel, filho do português dono do bar da esquina, que de fino não tinha nada, e que quando ela por ele passava sozinha, sempre arranjava um jeito de chegar perto e dizer-lhe alguma coisa tipo:
— “Venha cá minha gostosa! Aquele “panaca” do seu namorado deixa você andar sozinha por aí? Vem comigo que eu lhe mostro como um gajo deve tratar uma mulher”!!
Nessas oportunidades, Silvinha sentia uma mexida nas suas entranhas, uma agradável sensação abaixo de seu umbigo, mas não fazia mais que simplesmente sorrir.
O tempo passou e finalmente Anselmo marcou a data do casamento. Nos preparativos, ficou resolvido que iriam passar a Lua de Mel em Bariloche. Era Julho, deveria haver bastante neve e segundo o que ele falava baixinho para ela, seria “melhor para o amor”.
O casamento foi lindo. Anselmo vestiu-se todo de branco como a noiva e os dois formavam o par de maior brancura que já se viu no altar. As comadres, durante o casamento, se perguntavam entre risadinhas, se era verdade que os dois eram virgens.
A festa foi excelente. O pai de Silvinha ofereceu a recepção que como Anselmo insistiu, terminou para os noivos às nove horas. O avião partia as onze. Argumentos de que chegariam cansados a Buenos Aires, não demoveram Anselmo de seu propósito de viajar no mesmo dia . Assim foi feito.
Silvinha estava excitadíssima. Linda em um tailler verde água, ela viajou feliz da vida. Chegaram ao Hotel Sheraton em Buenos Aires e após passarem pela recepção, subiram.
Em frente do quarto, depois do camareiro abrir a porta, e convenientemente se despedir, recebendo a gorjeta, Silvinha esperava que Anselmo romanticamente a carregasse para o leito. Em sonhos mais eróticos ela imaginava-o rasgando seu vestido e possuindo-a com ardor, como havia assistido na novela das oito.
Nada aconteceu. Ele entrou, sem sequer olhar para ela. “Vai ver que ele quer guardar suas forças para a hora H”, pensou numa última esperança de ser possuída pelo amante. Sem saber bem o que fazer, foi ao banheiro para se trocar e se preparar. Ele ficou no quarto apesar dela ter deixado aberta a porta do banheiro.
Silvinha se olhava no espelho e imaginava o que iria acontecer, como iria acontecer, aonde iria acontecer, com que intensidade?
Ao sair, percebeu que alguma coisa não andava bem. Anselmo estava no terraço. Foi atrás dele e abraçando-o por trás, com sua camisola branca transparente perguntou:
— Meu bem? O que há?
— Hum.., — assobiava ele para respirar.—...hummm ....não sei, estou com ...hummm...falta de ar... hummmm... deve ser alergia... hummm ... talvez mofo...hummm.
Foi para o banheiro, voltou e continuou com falta de ar até que extenuado caiu na cama. Na verdade nem reparou que a camisola de Silvinha era branca. Só parou de sentir falta de ar quando dormiu, bem mais tarde.
Ela, após assistir dois filmes de sacanagem portenha na televisão, dormiu sem saber o que pensar.
No dia seguinte, acordaram atrasados para ir ao Aeroporto. Saíram rapidamente e tomaram o avião para Bariloche. Não deu tempo nem para um carinhosinho na cama. Mais uma vez benevolente ela pensou: Quem sabe mudando de hotel ele melhora.
Chegaram, a Bariloche depois de uma viagem muda de avião onde nem de mãos dadas ficaram. Várias vezes Silvinha tentou falar com ele. Toda vez que começava a falar ele virava para ela e assobiava de falta de ar dizendo:
— Humm... eu sei...hummmm... que vou melhorar...Humm.. espere um pouco... Hum.
Foram para o hotel, e ao fecharem a porta do quarto, Anselmo piorou.
Agora além da falta de ar ele tinha diarréia. Passou o dia praticamente no banheiro e por lá ficava. O ar que faltava em cima, sobrava em baixo.
Foram vinte e quatro horas terríveis. Sim, porque no dia seguinte, interromperam seu programa e voltaram para São Paulo.
Chegaram e a família foi esperá-los no Aeroporto. A falta de ar sumira.
— Ah! Foi alergia, isso acontece!
— A diarréia, bem, deve ter sido algo que ele comeu,... ou não comeu. Foram os comentários da família.
Do aeroporto a família os acompanhou ao apartamento. Conversaram bastante sobre mil coisas, mas nada sobre a Lua de Mel de um dia e meio .
A noite caiu e os parentes foram indo embora. Primeiro os pais de Silvinha, sua irmã, depois o tio de Anselmo. Todos foram... menos a mãe dele. Viúva e solitária foi ficando e ficando. Silvinha enquanto recolhia os copos pensou que iriam levá-la . Arrumou tudo e quando entrou no quarto, Anselmo perguntou:
— Querida, mamãe pode ficar aqui hoje?
Silvinha achando que ela iria dormir na sala, respondeu:
— Ah! Tudo bem.
Quando se vestiu no banheiro e voltou ao quarto, a velha estava deitada em sua cama e Anselmo segurando a orelha da mãe que dormia tranqüilamente. Foi aí que ela ouviu da sogra:
— Da para você dormir na sala? Ele está acostumado a dormir segurando minha orelha. Por isso tem ficado tão nervoso e com falta de ar.
Silvinha não chegou a desmanchar as malas. Pegou uma blusa e saiu. Na esquina encontrou Manuel, que de avental branco fechava o bar.
Ele olhou para ela e mais uma vez disse:
— Gostosura!! Aquele panaca a deixou sozinha?
Pela primeira vez ela não só sorriu mas respondeu:
— Deixou!!
Não acreditando no que ouvia, o português então falou docemente:
— Então venha comigo que eu lhe mostrarei tudo que ele deveria fazer com você.
Ela foi. Enquanto Anselmo segurava a orelha de sua mãezinha, Manuel realizava com Silvinha os mais incríveis sonhos mútuos.

Rubens Paulo Gonçalves, Médico pela PUC do Paraná,Ginecologista e Obstetra pela Febrasgo, com residência no Departamento de Ginecologia e Obstetrícia da Faculdade de Medicina da USP, Dr. Rubens Paulo Gonçalves, mora em São Paulo e trabalha desde 1971 no Hospital Albert Einstein, na Pro Matre e no Hospital São Luiz, além de dirigir o Centro Ginecológico e Obstétrico Paulista. Também, é autor de três livros com temática médica: Gravidez para Grávidas, Desafio da Menopausa e Envelhecer Bem e escreve atualmente para seu site: www.rubenspaulogoncalves.com.br

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