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Terezinha Tagliaferro: Da. Carmem e suas manias

Terezinha Tagliaferro, de Malta - 27 de setembro de 2010 - 10:16

Quando deixei de ser religiosa fiquei hospedada na casa de uma amiga pois dava aula naquela cidade e minha familia morava em outra.Minha amiga era professora como eu e morava so com a mae.Seu pai ja havia falecido fazia muito tempo.A mae dela pra mim se tornou uma segunda mae.Eu gostava demais dela ( gostava porque ela infelizmente ja faleceu ).Mesmo depois que ja havia comprado a minha casa,passava todas as noites pra visita-la apos terminar a minha aula, as 20h. Nesse horario eu era funcionaria do SESI ( Serviço Social da Industria) e dava aulas para analfabetos idosos.Terminada a aula passava na casa dela e era uma delicia porque ela cozinhava muito bem e tudo aquilo que ela prepara para o almoço ela guardava um pouco pra mim.A comida era uma delicia, mas o que enchia meu coraçao era a lembrança, o carinho, a dedicaçao......
Pois é, hoje quero lhe contar exatamente a historia dessa senhora amiga.Digamos que seu nome era Carmem.
D. Carmem ficou viuva ainda com todos os filhos para acabar de criar.Até entao, eles tinham uma vida descente.O marido era funcionario da Prefeitura.Os filhos foram crescendo e procurando trabalhar pra ajudar no orçamento.Com muito sacrificio a unica que conseguiu ser professora, isto é estudar um pouco mais foi essa minha amiga, a filha caçula.D. Carmem sempre me contava a vida dificil que tinha feito desde criança.Ela foi criada pela casa dos parentes, trabahando pra umm e pra outro, pois havia perdido os pais muito cedo.Como voces sabem, esse tipo de problema vai formando uma certa ferida na alma que nem o tempo cicatriza.A pessoa carrega uma bagagem enorme de sofrimento que depois vai ainda se acumulando, somando-se aos outros acontecimentos da vida e se torna uma bola de neve.
Com ela aconteceu o seguinte.Como o marido havia morrido de cancer e naquela época nao se tinha todo o conhecimento que se tem hoje, voces podem imaginar quanto sofrimento, quanta dor, enfrentar uma doença desconhecida.Depois da morte do marido ela começou a mudar seu comportamento.Passou a ter medo de tudo.Da palavra cancer ela nem queria ouvir.Antes ela era uma pessoa alegre, visitava os doentes, etc... agora ela nao queria nem sequer ouvir sobre doenças.Chegou ao ponto que se alguém vinha almoçar na casa dela e comentava sobre doenças da familia, apos a pessoa sair sabe o que ela fazia? Deixava a mesa como estava, com pratos, talheres, copos, etc...puxava a toalha dos lados, embrulhava tudo e jogava no terreno baldio do lado que também pertencia a familia.Imagina voces como essa brincadeira ficava cara....Que chegou ao ponto que minha amiga antes de convidar alguém pra vir em casa era preciso explicar a historia da mae e pedir por favor pra nao se tocar em assunto de doença.
Fora isso tinha muitas outras manias.Veja bem: A minha amiga, que se chamava Silvana dava aulas de catecismo na casa de um senhor.Como ele tinha uma casa espaçosa, ela preparava ali as crianças e depois iam fazer a primeira comunhao na igreja da paroquia.Para essa aulas Silvana usava um sininho e quando voltava pra casa colocava esse sininho encima de um malao onde continha seu enxoval.Um dia a mae ficou sabendo que na casa desse tal senhor tinha uma pessoa doente de cancer.Pronto.Foi o fim do mundo.Segundo a cabeça dela tudo estava contaminado, a partir da filha, o sino....... o malao do enxoval.Até a cortina que tinha entre a sala de jantar e a sala de visita estava contaminada porque a filha tinha encostado o sino nela.Entao ela passou a agir assim:
a) Ela so sentava na cadeira da sala que era dela, ninguém podia usar aquela cadeira. Quando chegava visitas em casa que nao sabiam do assunto era a coisa mais engraçada porque quando ela mandava entrar a primeira coisa que ela fazia era correr pra cadeira dela de medo que a pessoa pudesse usa-la.
b) Quando ela caminhava pela casa ela segurava o vestido com as duas maos pra ele nao tocar na tal cortina contaminada e passava o corredor caminhando atravessado, isto e, de acordo com o limite imposto pela cabeça dela.
c) nao entrava no quarto da filha pra fazer limpeza porque la tinha o sininho... e tinha contaminado tudo.
d) nao costurava pra filha dela, pra mim sim.
Pouco a pouco ela foi limitando mais e mais o seu espaço, chegando num ponto que tinha-se de pensar em tomar uma providencia.
Silvana se informou e ficou sabendo que a unica coisa que poderia fazer era interna-la numa casa de cura.Falou com as outras 3 irmas e a levaram la por algum tempo.As filhas nao quiseram fazer muitos comentarios com ninguém e nem mesmo comigo, que praticamente fazia parte da familia.Por este motivo eu nao sei explicar aqui que tipo de cura foi feita, nao sei se foi eletro-choques ou sonoterapia, ou todos os 2 tipos.
So sei que enquanto a D.Carmen ficou internada , Silvana me chamou pra ajudar a tirar da casa todas as coisas que segundo a mae estavam contaminadas.Jogou tudo fora, cortinas, malao de enxoval, enfim, o quarto que era dela desocupou todinho.Chamou uma faxineira, limpou tudo, abriu as janelas pra circular o ar, etc....
Nessas alturas os parentes se intrometeram, deram palpites, acharam que as filhas agiram mal e foi aquele reboliço.
D.Carmem voltou.Parecia estar melhor.Viu todas as mudanças. a limpeza que foi feita, mas ela ainda tinha la as suas duvidas.Pouco a pouco ela foi adquirindo outras manias. Silvana começou a pensar que o problema era ela, que no fundo, no fundo, como ela dava aulas naquela casa, a mae achava que ela que estava contaminada em primeiro lugar e isto nao tinha conserto.Decidiu dar uma reviravolta na vida.Minha amiga foi morar numa pensao onde tinha um apartamento so pra ela.A mae foi morar com a filha mais velha, que havia ficado viuva ha pouco tempo e além disso ela possuia uma casa nova na qual ja havia construido um apartamento so para a mae.
Se instalaram todos em seus respectivos novos lugares e a vida continuou.Porém foi por pouco tempo.A mae nao suportou viver longe da filha caçula, com a qual tinha vivido toda vida dividindo suas alegrias e seus dissabores.Embora elas brigassem todos os dias,ela era a alegria da mae.
D.Carmem faleceu quando eu estava gravida da minha filha.E ela que tanto queria estar presente no meu parto nao conseguiu porque ela dizia que ela gostaria de ver como seria porque eu reclamava de qualquer tipo de dorzinha......
Pois é meus amigos, D.Carmem marcou muito a minha vida porque apesar da suas manias aprendi muita coisa boa com ela.Era uma pessoa maravilhosa, muito catolica, ia a missa todos os dias e até ao final da sua vida procurou nao dar trabalho pra ninguém.A sua maior preocupaçao era de ficar invalida e nao ser auto-suficiente.Deus atendeu ao pedido dela.
Diante deste quadro eu nao sei dizer a voces como prevenir ou como deveria ser curada porque eu nao sou psicologa.O unico conselho que posso dar a voces è tomar cuidado com as pessoas de idade.Elas nao gostam de mudanças forçadas.O que o idoso gosta é de ficar no lugar onde esta acostumado, e poder conversar com os amigos de sempre. Enfim, o idoso é conservador, é preciso respeitar para nao se culpar depois.De uma coisa sou certa: Sentir remorço é pior do que suportar as manias dos nossos entes queridos.Reflita sobre isso.Confio em voce.


Terezinha de Jesus Tagliaferro

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