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Terezinha Tagliaferro: A história de Martinha

Terezinha Tagliaferro, de Malta - 04 de setembro de 2010 - 08:07

Pois é, a vida de professor nunca foi fácil. Veja bem, se o aluno vai mal o professor não presta, mas se ele vai bem é porque é muito inteligente.

No meu tempo diziam: - Como professor ganha bem e trabalha apenas 4h. por dia e quantos meses de ferias... O que ninguém sabe é o tempo que a gente usa em casa pra preparar as aulas, preparar material didático que de um modo geral as escolas são pobres e não fornecem.E depois, como a gente se preocupa com aquelas criaturas que nos confiaram... Sofremos por cada um deles, como se fossem nossos próprios filhos. Quanta alegria sentimos com o progresso deles assim como dilacera o nosso coração quando eles pegam uma estrada tortuosa.

Esta é a vida, porém hoje quero lhes contar a história da minha amiga professora, a Martinha.

No Estado de S.Paulo existem vários tipos de escolas do governo, entre elas tem as chamadas Escolas Comuns, que podem ser no sitio ou na cidade, só que a professora efetiva que deveria lecionar nela tira licença por tempo indeterminado, cujo motivo geralmente é distancia. Então ela vai tirando licença até conseguir uma classe perto da casa dela. Depois tem também as Escolas de Emergência, isto é, escola que se abre no sitio pra favorecer a comunidade. Nesse caso è necessário ter uma certa quantia de alunos.

Para lecionar nesses 2 tipos de escolas a professora interessada faz inscrição na época estipulada. Ela pode se inscrever na cidade dela ou nas cidades vizinhas, contando para isso com um limite de Kilometragem. Uma vez minhas colegas e eu nos inscrevemos no município de Iacanga, morando na cidade de Bauru. Então aconteceu esta historia com a Martinha.

No dia da escolha de classe como não sobrou nada, ela entrou para a lista de espera que vai rodando o ano todo.

Após 15 dias do inicio das aulas, a lista estava correndo porque tinha uma determinada escola que ninguém queria assumir, nem queriam ir lá pra ver. Sobre a tal escola corria uma conversa desagradável. Diziam que o dono dela era um homem cruel, não cooperava em nada com a professora e nem com os alunos. Além disso, tinha um pé de eucalipto do lado da escola que nos dias de vento forte envergava todinho encima da escola e todos tinha medo que caísse e acontecesse uma tragédia.

Chegou na vez da Martinha e esta nem ficou sabendo. Pra inicio de conversa, as professoras da cidade haviam feito um juramento de não avisar nada para as professoras da cidade vizinha porque segundo elas cada uma deveria ficar na sua cidade.

Como acontece sempre na vida, como se diz: \\\"o que é meu ninguém tira\\\", aconteceu também com a Martinha. E veja como foi: Tinha uma professora que dava aula na fazenda vizinha e como era interesse dela dividir a gasolina entrou em contato com a Martinha dizendo que na segunda-feira ela deveria ir pra Iacanga urgente porque era o ultimo dia que ela podia assumir a tal escola.

Martinha pegou o primeiro ônibus e foi pra lá. Ficou sabendo das histórias sobre a escola, mas ela estava numa situação financeira tão difícil, precisava tanto ajudar a família dela que pouco estava se importando com dono de fazenda ou com eucalipto torto, o que interessava pra ela era trabalhar e basta. Ela assumiu a classe e foi pra lá.

Quando ela chegou na tal fazenda, foi até a casa do administrador e se apresentou como a nova professora, pois o dono morava em S.Paulo.

A família do administrador, gente simples, a convidou pra tomar um café, sentados ali mesmo na cozinha, perto de um fogão de lenha. Martinha ficou feliz em ser bem recebida e foi logo batendo um bom papo com todos eles porque como vocês sabem, nessas alturas já foram se reunindo as crianças, todos curiosos com os novos acontecimentos. Foram todos entrando na cozinha porque fora chovia muito.Depois de conhecer os alunos e conversar com a mães deles foram todos pra casa se preparar porque as aulas iniciaram no dia seguinte. Então foi ai que aconteceu o que ninguém esperava.

O administrador levou Martinha até seu escritório e lhe disse: Tenho um recado para a nova professora. O Dr. Caetano, que è o dono da fazenda, esteve aqui a semana passada e deixou a seguinte ordem: A professora que assumir esta escola durante este ano terá o direito para:
-2l. de leite diariamente
-1k. de carne seca por semana
- 2 queijos por semana
-uma cesta de fruta e verdura conforme for a produção e a época das mesmas.
- ele também vai pagar a gasolina da cidade até a porteira e da porteira até aqui a condução será por nossa conta, quer dizer, cavalo, trator ou charrete.

Martinha não queria nem sequer acreditar e pensou: Como Deus é bom. Ele conhece a minha necessidade e eu na verdade estava mesmo precisando de toda esta ajuda.

Por conta dela só restava pagar a passagem de ônibus que a professora tinha direito a desconto e já era uma boa economia.

E assim Martinha começou a fazer parte da nossa turma de viagem diária. Ela sempre voltava da fazenda com muitas sacolas nos braços, trazendo as coisas da fazenda. Como ela não consumia 2l. de leite por dia, ela fazia presente deles e cada dia era para uma de nos. Muitas vezes ela dividia conosco as verduras, legumes e frutas.O mais interessante é que nessas viagens de rotina, quase sempre viajam no mesmo horário as mesmas pessoas e acabam por fazer amizade.Nunca me esqueço quanta alegria e como nos divertíamos quando era tempo de mexericas,pois Martinha distribua mexerica para todos os passageiros.Aquilo criava um clima de fraternidade, de paz e até o motorista participava.

Ela se tornou tão amiga que quando ela se atrasava por qualquer motivo, como por ex. o cavalo empacava, o motorista, que de longe podia ver, se ela não estava no ponto, ele diminua a marcha e subia bem devagarzinho.Quando víamos que a perua dela havia chegado todos nos respirávamos aliviados.O problema é que todos sabíamos que ela dava aula em outra escola e aquele era o único ônibus.

Amigos, em qualquer profissão a vida é bela. O importante é viver com simplicidade o nosso dia a dia porque cada dia é especial para nos.

Tudo depende das cores que usamos pra pintar a nossa historia. Escolha as cores certas. Confio em você.

Terezinha de Jesus Tagliaferro

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