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Rogério Tenório de Moura: Nem tudo o que reluz é ouro!

*Rogério Tenório de Moura - 10 de agosto de 2008 - 15:19

Historicamente, tanto a tecnologia quanto à educação estão fundamentadas na separação entre o saber e o fazer na divisão social do trabalho. Nas relações capitalistas os proprietários dos meios de produção, ao reservarem para si e para seus assessores a função da concepção da organização e do mando no processo produtivo, passam a controlar o saber. Por outro lado ao atribuírem as tarefas de execução (manuais) aos trabalhadores, definem concretamente separação entre a teoria e a prática, a concepção e a operação entre o saber e o fazer.
Desta forma a escola pública é influenciada pela ideologia Taylonista (F. Taylor 1856 -1915), sistema de administração científica baseado na produção em série, o saber e o fazer, antes integrados no trabalho artesanal, são separados; o saber é apropriado pela “gerência” (Gerência científica) e seguindo o modelo dessa teoria a escola é como uma fábrica e o aluno é o insumo básico a ser modelado pela ação do professor.
O produto dessa escola é um indivíduo capaz de seguir ordens com atenção, não-questionador, capaz de fazer algo sem se preocupar/interrogar por que é feito desse modo e não de outro, sempre confiante em que há alguém que já pensou por ele em como fazer e capaz de se esforçar para fazer o melhor em seu posto ou linha de montagem.
Entretanto em face da rapidez nas mudanças no mercado de trabalho frente as inovações tecnológicas, a qualificação encontra limites estruturais no sistema educacional brasileiro, desde a impossibilidade material e humana de nos equiparmos para acompanhar esse ritmo até constrangimentos ao nível internacional limitando as perspectivas de produção científica e tecnológica nos grandes centros educativos. Assim não oferecemos aos nossos educandos nem uma formação humanista para o exercício contínuo da cidadania nem uma formação técnica sólida que o habilite de fato para o mercado de trabalho.
Diante desse quadro o MEC objetivou redefinir a Educação Básica, já que a maior parte da população ainda não tem acesso ao Ensino Superior, sobre uma grade de estudos gerais e comuns que se abrissem num leque de possibilidades tão amplo quanto excludente, por mais contraditório que isso possa parecer; pois ao inserir no currículo do Ensino Médio disciplinas como filosofia, sociologia e psicologia, mas não aumentar o tempo de permanência do aluno na escola, outras disciplinas presentes nos vestibulares estarão sendo preteridas, ao passo que nas escolas particulares, certamente o que ocorrerá será um incremento da carga horária, o que fatalmente tornará o abismo acadêmico entre tais estudantes ainda mais elástico.
O discurso da “educação para todos” facciosamente esqueceu-se de oferecer “educação de qualidade para todos”. Hoje o grande desafio não é ter acesso à Educação, mas a uma educação que esteja realmente a serviço do educando, e não dos donos do capital; visto que mediante o uso de novas tecnologias vislumbra-se a possibilidade de se contar com crescentes reservas de trabalho adequadas ao trabalho operativo das grandes empresas oligopólicas. Prova disso são os cursos superiores profissionalizantes e os “virtuais” que se proliferam Brasil afora.
Sob o prisma de formar o aluno mão-de-obra, consumidor, a pessoa humana é ignorada, pois tal enfoque busca transformar o cidadão em um operador de tecnologias avançadas eficiente, ou seja, muito rápido no seu trabalho repetitivo e que esteja em constante aperfeiçoamento buscando dominar todos os avanços tecnológicos de que a empresa possa vir a se utilizar, porém ironicamente seu salário é cada vez mais achatado, ou quando passa a ser melhor remunerado por operar tecnologias de ponta em contrapartida são excluídos das frentes de trabalho dezenas de pessoas que passam a ser desnecessárias na produção desses bens de consumo. A partir de então tais máquinas passam a produzir, trazendo enorme economia às empresas, aumentando o lucro de quem já lucrava a maior parte das riquezas produzidas e expurgando do mercado de trabalho pessoas sem qualificação profissional, aprofundando ainda mais as diferenças sociais, criando uma classe de marginalizados “incompetentes” porque não se adequaram aos novos tempos, trazendo ao estudante a sensação de que quanto mais ele se preparar, mais seguro ele estará em seu emprego, ganhando um salário digno tendo o Status quo de quem é competente, um profissional indispensável para a empresa que necessita de novas tecnologias para se manter competitiva no mercado.
Ledo engano, cada vez mais o mercado cobra das instituições de ensino que formem alunos no menor espaço de tempo possível para que suas necessidades sejam atendidas, estas por sua vez oferecem essas novas “modalidades” de Ensino Superior, que excluem da formação acadêmica disciplinas que não sejam específicas e banem o debate, atividade intrínseca à formação acadêmica.
Nessa perspectiva, políticas tendem a inserir o país em prol do desenvolvimento do capitalismo monopolista, procurando em contrapartida, situá-lo como potência seguindo os padrões modernos dos países centrais. Numa sociedade em que o processo produtivo coloca uma demanda de especialistas com critérios e competência definidos nas grandes potências, o aparelho formador de um país fica diante de um desafio: equipar-se adequadamente para formar especialistas com a competência conforme padrões internacionais. Não a competência para a produção científica e tecnológica, pois esta já está sendo realizada no exterior. Importa a formação profissional que possibilite compreender, adaptar e operar as tecnologias avançadas que crescentemente se inserem na produção.
Medidas paliativas de escolarização tem sido adotadas, como os cursos de Educação de Jovens e Adultos (EJA), com o intuito de reintegrar a população carente ao processo de produção e acelerar o ritmo de formação de um exército de reserva, mas contraditoriamente elas têm atendido mais a reprodução da mediocridade e da inércia que reinserido estes cidadãos de volta ao mundo do trabalho e, principalmente, ao exercício pleno da cidadania.
Diante do exposto observamos que a Educação se mantém mais ou menos como bem universal. Praticamente todos têm acesso a ela de uma forma ou de outra. O problema está na eficácia desses estudos. O sistema cria limites estruturais que impedem que os indivíduos das classes subalternas galguem posições de mando dentro da sociedade e assim alcancem poder para mudar as relações sociais, mesmo tendo acesso à tão propalada universidade.
Não seja ingênuo, amigo leitor, a alfabetização só passou a ser tratada como um bem universal quando nossa sociedade passou por um intenso processo de industrialização, sobretudo a partir dos anos 50 do século passado. Hoje as classes mais baixas conseguiram galgar à Educação Superior simplesmente porque ela não é mais vista pelos detentores do poder como garantia de ascensão social. O filho do operário pode até ser colega de faculdade do filho do executivo, mas jamais terá as mesmas chances que este. O primeiro estará ansioso por um estágio remunerado o quanto antes, enquanto o segundo estará se preparando para entrar em um MBA antes mesmo de terminar a faculdade.

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