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Os segredos para escolher as coroas ideais da sua bike

Bike Magazine - 08 de março de 2019 - 11:00

Quando falamos de relações de marcha, em quantidade e tamanho, entramos em um confuso território de números que esconde várias surpresas. Os ciclistas, por um lado, precisam ter aquilo que é mais adequado para suas características pessoais, para a sua modalidade e para o terreno predominante. Os engenheiros, por outro lado, precisam atender a um grande espectro de consumidores.

Anos atrás, o padrão era o tradicional 53-39 na pedivela e 11-23 no cassete. Isso, claro, já na época das oito, nove velocidades. Com a popularização do ciclismo e o desenvolvimento da tecnologia veio tanto a possibilidade de incluir mais marchas quanto a necessidade de democratizar a relação de marchas – um cassete de 10 velocidades com 25 dentes seria uma boa para quem precisa de um incentivo a mais nas subidas, mas sem precisar retirar o pinhão de 11 ou 12 dentes, certo?

Em meados dos anos 2000, as bikes de estrada com coroas triplas, ainda razoavelmente comuns entre ciclistas não-competitivos, começaram a ser substituídas nas lojas pela grande novidade da época: as pedivelas compactas 50-34 e 50-36. Pareados com cassetes de 25 e 27 dentes, permitiu que um sem-número de ciclistas encarasse as subidas que antes só os mais fortes e leves poderiam subir com 39-23. E aí vieram os cassetes de 28, 30 e, finalmente, 32 dentes. E a última novidade, as chamadas pedivelas semi-compactas de 52-36 dentes.

Mas o aumento de dentes em uma borda do cassete tem uma má consequência, muito negligenciada: o meio do cassete. Já passou por uma situação em que a marcha estava pesada demais, subiu apenas um pinhão e ficou leve demais? Faltou um intermediário? Esse salto é crítico em alguma situações e precisa ser evitado, daí a vantagem do maior número de marchas: ter uma oferta ampla de pinhões que aumentam de forma progressiva, sem “buracos”. O problema é que muitas pessoas estão se preocupando apenas com o número de marchas e o tamanho do pinhão maior, mas não dão a importância devida aos outros aspectos.

Se você olhar o catálogo (ou o site) da Shimano, Sram ou Campagnolo, encontrará uma variedade muito interessante. Cassetes que começam com 11, 12, 13 e até 14 dentes e terminam com 23 a 32 dentes. Em termos de coroas, também temos opções, com praticamente todos os números entre 50 e 56 dentes para a maior (e ainda há as de 48 e 46 dentes para ciclocross, aventura e turismo) e 34, 36, 38, 39, 42 e até 44 para a menor.

As relações de marchas que costumam vir de fábrica nas bikes em geral são versáteis e atendem a maior parte das pessoas na maior parte do tempo. Mas quando nosso estilo de ciclismo e nosso terreno não se enquadra ao da maioria, como saber o ideal para cada um? Vários fatores precisam ser levados em consideração:

Cadência: Há ciclistas que pedalam em cadências mais baixas, mais pesado, travados. São os que chamamos de smashers. Geralmente são indivíduos fortes, com bastante massa e inércia, menos ágeis (como motores a diesel) que preferem fazer mais força do que movimento.

Por outro lado, há aqueles que pedalam em cadências mais altas, mais leve e soltos. São os spinners, geralmente pessoas mais leves, de metabolismo rápido, ágeis como motores elétricos, e que preferem mais movimento do que força. Essas nuances muitas vezes são a diferença entre optar por um pedivela tradicional ou compacto, por exemplo, ainda que a velocidade real, quando comparados, seja a mesma.

Terreno: Ciclistas um pouco mais experientes que não encontram subidas com mais de 4% ou 5% nos arredores dificilmente vão dar uso a um pinhão de 32 dentes. E mesmo os ciclistas mais fortes podem não ver utilidade em uma pedivela tradicional se vivem em uma região muito acidentada. Na maioria dos casos, vale mais a pena pensar no uso predominante, mas tendo certeza que terá sempre o necessário para encarar qualquer obstáculo geográfico da sua região.

Experiência, lesões, condicionamento: Falta força, está acima do peso, o joelho dói? Então o melhor é não se preocupar com a velocidade na subida, e sim com o conforto, o domínio do terreno e a segurança de pedalar sem machucar.

Compatibilidade: Não adianta inventar. Câmbios dianteiros e traseiros têm um limite. Cassetes de mountain bikes extrapolam esse limite, combinações exageradas de coroas também.

Calculando a relação: É possível comparar o “peso” de combinações diferentes de marchas usando uma conta simples. O que é mais pesado: 50×11 ou 53×12? Basta dividir 50 por 11 e temos 4,55, enquanto 53 dividido por 12 é 4,41. Portanto, 50×11 é uma marcha mais longa, mais pesada, que 53×12. A internet tem várias calculadoras que dão a velocidade de acordo com a cadência, cadência de acordo com a velocidade, comprimento das marchas etc. Basta colocar a quantidade de dentes e o tamanho da roda, e a cadência ou velocidade-alvo.

Pensando em todos esses fatores (e alguns outros), deixo a seguir quatro exemplos com os quais deparei em tempos recentes e que ilustram como a escolha da relação de marchas ideal não é óbvia. Em caso de dúvidas ou comentários, escreva para mim em www.gabrielvargas.com.br/contato

Exemplo A – Bike de estrada
Perfil: Homem, 70 kg, atleta de mountain bike com foco em provas de maratona. Utiliza a bike de estrada para realizar treinos específicos durante a semana.

Terreno predominante: circuito urbano, estrada com ondulações e falsos planos. Serras ocasionais.

Relação de marchas inicial: 10 velocidades, 53×39 – 11×27

Este é um atleta com bastante resistência, porém não muito reativo, e pedala quase sempre sentado. É capaz de sustentar 4W/kg com cadência média de 85 rpm em um contrarrelógio de 30 minutos no plano, e mantém a mesma cadência nas subidas mais longas e pedala ainda mais travado em pé. Ou seja, é razoavelmente um smasher. Além disso, é um ciclista que lida bem com os saltos entre os pinhões maiores do cassete (21, 24 e 27 dentes) nas subidas longas. Em vista das características das provas de mountain bike maratona que ele participa, as cadências mantidas e as relações de marchas mais utilizadas em situações críticas não demandaram mudanças nem nas coroas nem no cassete.

Exemplo B – Bike de estrada
Perfil: Homem, 82 kg, ciclista recreativo que participa de eventos esportivos de estrada ocasionalmente.

Terreno predominante: Estrada com ondulações, falsos planos, serras ocasionais.

Relação de marchas inicial: 11 velocidades, 52×39 – 12×28

Mais pesado e um pouco menos potente que o ciclista A, nosso exemplo B tem características bem diferentes. No princípio do treinamento, mantinha 80 rpm nos planos, mas após um período com bastante trabalho de cadência, passou a sentir-se confortável entre 86 e 89 rpm no plano. A surpresa veio após um teste de performance em que ele sustentou 95 rpm em uma subida longa de 4% de inclinação. Ou seja, ele pedala muito mais solto nas subidas no que no plano, e é surpreendentemente um bom escalador, dado a sua relação peso/potência.

Com a possibilidade de trocar apenas o cassete, mas com as amplas possibilidades de um bloco de 11 velocidades, optamos por um 11×32, que dá um belo “extra” nas combinações mais curtas (mais leves). O ideal nesse caso, porém, seria substituir também o pedivela para um modelo semi-compacto 52×36. Essa relação manteria a oferta de opções longas para a sua faixa de cadência nos planos, mas também oferece várias combinações leves o suficientes para girar mais nas subidas entre 4% e 6%.

Exemplo C – Bike de estrada e triathlon
Perfil: Mulher, 51 kg, triatleta que participa de todas as modalidades do triathlon e eventos esportivos de estrada recorrentemente.

Terreno predominante: Estradas planas, falsos planos, subidas curtas e duras e serras.

Relação de marchas inicial: 11v, 50×34 – 11×28

Tínhamos duas bicicletas neste caso: uma bike de estrada convencional e uma bike de triathlon, ambas com a relação de marchas descrita acima. A ciclista é leve, ágil, mas com pouca força. Contudo, sua cadência alta resultava em uma potência (estimada) relativamente “razoável para boa”, logo abaixo dos 3W/kg no limiar. Suficiente para encarar com firmeza as serras mais duras dos eventos de estrada mais famosos do Brasil, mas sem margem para erros na relação de marchas.

A bike de estrada era a principal bike de treinos, e também a bike para eventos de estrada e para as provas de short-triathlon, por ser mais ágil nas arrancadas e mais rápida nas curvas dos circuitos mais curtos e travados dessa modalidade. A bike de triathlon ficava reservada para treinos específicos e provas de triathlon olímpico e Ironman.

Na bike de estrada, substituímos o cassete por um 11×32, para garantir uma cadência entre 80 e 85 rpm mesmo em subidas de 7%. Na bike de triathlon, as alterações foram maiores: aproveitamos o desgaste do pedivela para experimentar uma coroa menor de 36 dentes e colocamos um cassete 12×25. O bloco 11×28 (11-12-13-14-15-17-19-21-23-25-28) não possuía os pinhões de 16 e 18 dentes, e os pinhões de 11 e 28 dentes eram pouco utilizados.

A opção 12×25 (12-13-14-15-16-17-18-19-21-23-25), por outro lado, não tem saltos entre os 12 e 19 dentes. Ciclistas menos potentes e que giram mais, especialmente em situações de terreno plano, são mais sensíveis aos saltos na relação de marcha, e precisamos evitar a situação em que “uma marcha é leve demais, e a seguinte já é pesada demais”.

Exemplo C – Bike de TT/triathlon
Perfil: Homem, 78 kg, triatleta que participa de todas as modalidades do triathlon e provas de ciclismo contrarrelógio recorrentemente.

Terreno predominante: Estradas planas, falsos planos

Relação de marchas inicial: 10v, 52×39 – 11×28

Aqui temos um ex-ciclista muito forte, da velha-escola, totalmente smasher. Se o nosso amigo do exemplo B mantinha 80 rpm em pedais leves no plano, nosso caso C mantém essa mesma cadência em provas de contrarrelógio, o que soa bastante doloroso. E, curiosamente, ele utilizava uma pedivela de 52 dentes na coroa maior. Resultado: eu o vi cumprir um contrarrelógio a 44 km/h com uma cadência média de 82 rpm, o tempo todo em 52×12. Após um período insistindo em trabalhos de desenvolvimento de cadência, nosso experiente exemplo elevou sua média em testes controlados para 88 rpm, um ganho expressivo dado suas características e histórico pessoal.

Teoricamente, ele passaria a realizar o mesmo contrarrelógio em 52×13. Com tanta potência e em situações tão críticas, pensamos que ele poderia obter alguma pequena vantagem extra se encontrássemos uma forma de reduzir o atrito causado pelo uso constante de um pinhão tão pequeno e pelo desvio no alinhamento entre a coroa maior e os pinhões menores. Vimos isso há um tempo atrás na bike do ciclista alemão Tony Martin, com sua coroa customizada de 58 dentes.

Com algum custo, encontramos uma coroa de 56 dentes (pareada com uma coroa menor de 42 dentes), para que, em nossas simulações, nosso amigo C pudesse repetir a mesma performance daquele contrarrelógio, mas utilizando o pinhão de 14 dentes. Isso significa que seu chainline (alinhamento entre coroa e pinhões) foi otimizado na relação mais usada nos planos. E o melhor, ele ainda teria um extra para as descidas sem precisar extrapolar sua faixa de cadência preferida, e poderia encarar melhor os falsos planos e ventos contra sem cruzar muito a corrente.

Exemplo D – Bike de estrada

Perfil: Homem, 66 kg, ciclista que participa de eventos esportivos e provas de estrada e circuito recorrentemente

Terreno predominante: Estradas onduladas, subidas curtas e íngremes, serras variadas

Relação de marchas inicial: 10v, 52×36 – 12×25

O exemplo D é este que vos escreve. Totalmente ao contrário do ciclista do exemplo B, prefiro manter uma cadência alta nos planos (90 a 100 rpm em esforços moderados e 105 a 115 quando a coisa fica séria), mas vou um pouco mais travado nas subidas longas (80 a 90 rpm, também dependendo do esforço). Os problemas da relação de marchas apresentada acima são amplos: corrente sempre muito cruzada nos planos (constantemente usando os pinhões de 17, 19 e 21 dentes) e a relação mais curta não é leve o suficiente para encarar sentado as subidas de 10% ou mais. A troca por um cassete 11×28 resolveu a segunda questão, mas piorou a primeira, pois os saltos entre os pinhões ficam mais acentuados, o que é indesejável para um ciclista de pouca potência como eu. A opção ideal seria partir para uma pedivela compacta 50×34 e utilizar um bloco de 10v 11×27 ou um upgrade para 11v com 50×36 e 11×28. Assim, o chainline seria otimizado (mas em um raciocínio oposto ao exemplo C) ao utilizar a coroa maior, e ainda teria a versatilidade necessária na coroa menor.

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