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O Povo Brasileiro: índio ou não.

Luana Ruiz Silva (*) - 01 de julho de 2014 - 16:04

Luana Ruiz Silva é advogada (Foto: Arquivo pessoal)
Luana Ruiz Silva é advogada (Foto: Arquivo pessoal)

Nada é mais necessário em um conflito que a sua própria solução. Eu reprovo veementemente a política indigenista brasileira que pretende um congelamento cultural, ou pior, o resgate de uma realidade cultural passada, perdida no tempo, que do âmbito do fato sedimentou-se no âmbito da história, dilacerando a essência dinâmica das relações sociais, étnicas, culturais, enfim, a intrínseca dinamicidade das relações humanas.

Essa política indigenista segregacionista, que artificialmente abandona a teoria da integração, para impor, na contra mão da natureza, a teoria da preservação, afasta os indígenas da realidade cívica de compor o povo brasileiro.
Mais intercultural que multicultural, vez que, enquanto o multiculturalismo compreende diversas culturas coexistindo, o interculturalismo compreende culturas se relacionando numa verdadeira fricção interétnica materializando o “caldeamento” humano descrito por Darcy Ribeiro na obra O Povo Brasileiro.

Aquela teoria integracionista de outrora amparou toda a vida, as obras e os trabalhos do descendente pré-colambiano Rondon, que desde os idos de 1907, quando traçava as linhas telegráficas tecendo os elos nesta colcha de retalhos que é o Brasil de dimensões continentais, já se preocupava com a necessidade de reconhecerem-se, as pessoas que aqui habitavam, enquanto iguais, enquanto um único povo, para garantir a integridade da soberania nacional e continuidade da Nação Brasileira, vez que sem povo não há Nação, sendo imprescindível para este solo verde e amarelo “integrar para não entregar”.

Teoria aquela que pautou o ordenamento jurídico pátrio, tanto que o Código Civil de 1916 tratava como relativamente capaz o silvícola, e não o índio. Pois sílvícola, aquele que vive na selva, deixa de sê-lo quando integrado, enquanto o índio, de nike e hilux, com diploma, trabalho e salário digno, não é silvícola, é absolutamente capaz, mas nunca, jamais, deixará de ser índio. Trata-se de um cidadão brasileiro indígena nos anseios integracionistas de Clóvis Bevilaqua.

Mas, abandonar esta teoria integracionista e passar forçosamente a aplicar a teoria preservacionista, para preservar o quê? Preservar ideias e realidades do passado, e só do passado, num resgate oral em regra distorcido, influenciado, ou pior, conduzido pela escória do quarto poder, por profissionais engajados, radicais, e bons naquilo que fazem no objetivo ideológico de alcançar seus propósitos.

E este contexto reflete como prisma uma gama de consequências no seio da sociedade em geral, índios ou não. Aliás, os feixes se concentram mais nestes que naqueles.

Essa política indigenista é coerente, justa e humanista na teoria. Mas, o que são as teorias sem aplicabilidade fiel na prática?

Quando se demarca uma propriedade privada como se terra indígena fosse, aos índios resultado prático positivo nenhum, pois se tem o chão e a cultura no iludido consciente coletivo, mas falta estrutura, água, escola, roupa, transporte, educação, independência, dinheiro, sucesso, esperança e dignidade. Falta comida. Falta carne.

Como denunciou o Terena Danilo Luiz, os índios no Mato Grosso do Sul estão sofrendo de obesidade, pressão alta e diabetes. Doenças que não são de índio, mas são de pessoas cuja base alimentar é o amido, a mandioca com farinha. É este o destino que os índios esperam para suas famílias, seus filhos e seu grupo?

Os índios que compõem 0,4% da população nacional já detêm mais de 13% do território brasileiro, enquanto ao restante dos 96% dos brasileiros sobra menos de 87% do Brasil. Já dizia o General Augusto Heleno que a “política indigenista brasileira é caótica”.

Garantir cestas básicas, avançar nas demarcações criando verdadeiros vazios geográficos e institucionalizar a invasão de propriedade privada numa verdadeira legitimação de ação manu militare é uma covardia dos Governos que vem se alternando na troca meramente física daqueles que sentam no “trono”.

Enquanto os representantes falarem pelos diretamente envolvidos neste conflito, nenhum avanço traçaremos ao encontro da paz.

Como ouvi na palestra do anarquista Pietro Nardella Dellova, precisamos falar por nós mesmos, índios e produtores, e falar para nós mesmos pensando não no outro, aquele de quem se fala, mas pensando no tu, aquele com quem se fala, e assim passaremos do discurso, para o diálogo.

(*) Luana Ruiz Silva – Advogada Sócia do escritório FGBR Advogados – E-mail: [email protected]

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