Fui conversar com um especialista em treinamento com cargas, especificamente treinamento russo. O professor Riccardo Rambo nos contou sobre como se desenvolve o treinamento físico na Rússia. Para quem quiser seguir ele nas redes sociais, clique aqui.

Existem 3 fatores que causam uma confusão e “desinterpretação” do que é o Treinamento Russo.

1. Literatura: Um pouco mais difícil de encontrar. Bem difícil de ler, tanto pela complexidade quanto profundidade que os russos veem o treinamento.

2. O “treino em si”: Lógico e simples. Muitos não acreditam como pode ser tão simples. “Tem que existir algo a mais”. “Foram os esteroides”!

3. E a implacável resistência as mudanças: a grande dificuldade de assumir limitações, reconhecer a superioridade do outro e, a inabilidade de aplicação dos conceitos em um pais onde não existe a cultura física.

O objetivo do texto é esclarecer e resumir apenas o Treinamento Russo aplicado aos esportes. É impossível escrever de forma resumida sobre toda a Cultura Física da Rússia.

O primeiro ponto importante para o entendimento do Treinamento Russo, é que para ser bom em um determinado esporte, você deve praticar o esporte. Existe uma programação de treinamento a longo prazo que prepara a criança adequadamente a melhorar a técnica de um determinado esporte de forma progressiva. Através dos anos e de seus resultados quantitativos e qualitativos, o atleta é classificado em classe III, classe II, classe I, até chegar em Mestre do Esporte. Nesta fase, o atleta já experimentou tudo em relação ao seu esporte e sua técnica é perfeita. Resumindo: Para correr mais rápido, correr!

Mas Verkhoshansky dá uma grande lição a este ponto importante mas relativamente bem simples: “Correr para correr, não! Pensar para correr!” No treinamento russo, apenas as formas mais eficazes e econômicas são utilizadas. E o processo para encontrar essas formas é contínuo.

O segundo ponto importante é que o resultado esportivo depende da velocidade da execução do gesto. Para se ganhar na corrida, deve-se correr mais rápido. Para fazer pontos em um esporte de combate, deve-se desferir um golpe maus rápido. A aplicação do treino então deve responder a seguinte pergunta: O que vai ajudar a correr ou desferir um golpe mais rápido? Quais meios e métodos de treinamento que aumentarão a velocidade do exercício competitivo, o gesto desportivo? Tudo o mais é complementar ou não é realmente importante.

O terceiro ponto importante é a ciência por trás dos exercícios e métodos. Cada aplicação destes são testadas e analisadas através de muitos dados. Por exemplo, no arremesso de martelo em distâncias superiores a 75 metros, os resultados de praticamente todos os atletas mostraram a seguinte correlação entre um determinado exercício e o próprio resultado do arremesso do martelo. O exercício de arremesso de um martelo de 10kg possui uma correlação de 0,824. O exercício agachamento possui a correlação de 0,120. E o exercício de salto triplo possui a correlação de 0,098. Ou seja, é muito mais importante para um determinado atleta em uma determinada fase de treino, treinar com um martelo de 10kg do que aumentar sua força no agachamento ou treinar saltos. Nenhuma metodologia é utilizada se não for comprovada e reproduzida para a melhoria do desempenho em vários atletas.

O terceiro ponto nos leva ao quarto ponto importante. De acordo com a característica biodinâmica, o efeito de treinamento e o período temporal de sua utilização, os exercícios são classificados em: Exercícios preparatórios gerais, Exercícios especiais e Exercícios competitivos. Desta forma fica mais fácil escolher um exercício de acordo com a fase e a necessidade do atleta, aumentado sua eficiência e evitando desperdício energético ou sobrecargas desnecessárias. A metodologia Treinamento de Força Especial foi desenvolvida por Yuri Verkhoshansky, que engloba exercícios especiais onde basicamente se trabalha força e técnica juntas. O Treinamento de Força Especial é o uso sistemático de um complexo de exercícios de força (resistência) especializados e direcionados para o aumento da (produção) potência do exercício competitivo em uma determinada disciplina esportiva.

Quinto e último ponto importante: Periodização (Matveev) ou Programação de Treinamento (Verkhoshansky). A diferença entre os dois pode ser entendida da seguinte forma: Periodização é um walkman enquanto que Programação de Treinamento é um iPhone. Os dois aparelhos “tocam” música.

Nada no Treinamento Russo é aleatório ou por acaso. Cada etapa de treino tem o melhor exercício e a melhor metodologia para aquele período. O treinador sabe de onde o atleta sai, o que deve acontecer com ele durante todo o processo e, onde e quando se quer chegar com o treinamento. A Programação de Treinamento leva em consideração não apenas princípios pedagógicos de distribuição de carga, mas também a Teoria do Treino (estímulos e recuperação), conceitos e princípios da adaptação biológica, mudanças no treino e regularidade de treino.

E assim, ao longo de décadas e de milhares de medalhas de ouro, foi criada a metodologia de treinamento mais eficaz em todos os esportes…

Não nasce grama onde russo pisa!

Nasdrovia, tovarich!

O Prof. André Lopes é Phd em Ciências do Movimento Humano e Expert do Portal da Educação Física.