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Geral

O Diretor faz a diferença

Lia Scholze / Inep - 02 de dezembro de 2004 - 14:35

Gostaria de iniciar com as palavras do ministro Tarso Genro que, ao detalhar as políticas educacionais de sua gestão, relatou os esforços que o Ministério da Educação está empreendendo em relação à Educação Básica. Dentre as iniciativas estão: 1) o acréscimo de um ano no Ensino Fundamental, 2) o repasse de recursos para requalificação profissional dos educadores da Educação Básica, por meio de Educação a Distância e presencial; 3) a oferta de licenciatura a professores que necessitem concluir sua formação, pois 60% desses profissionais não terminaram o ensino superior; 4) o aperfeiçoamento de diretores e secretários de educação através da criação da Escola de Gestores.

Está-se falando em educação como sistema integrado de todos os níveis e é este último item que eu gostaria de ressaltar.

Anísio Teixeira, já em 1961, chamava a atenção para a necessidade da preparação dos professores candidatos a administradores escolares e falava da importância que deveria ser dada para a administração da classe, o planejamento dos trabalhos e a orientação do ensino na Educação Básica, que na época se chamava Educação Primária. Segundo ele, quanto menor fosse o preparo do professor, maior seria o papel do administrador diante do cada vez mais complexo papel que a escola desempenha na sociedade.

Atualmente, não se fala mais em administração da escola e sim em gestão. Nessa perspectiva, a direção da escola deve passar a ser um trabalho de equipe, com ampla participação de todos os segmentos da escola e também da comunidade.
Independentemente da terminologia usada, o que importa é a atuação do gestor.

As atuais discussões sobre gestão escolar têm como dimensão e enfoque de atuação: a mobilização, a organização e a articulação das condições materiais e humanas para garantir o avanço dos processos socioeducacionais, priorizando o conhecimento e as relações internas e externas da escola.

A descentralização do processo decisório é um item a ser considerado pois ele diminui a distância entre a tomada de decisão e sua execução. Ninguém melhor do que quem enfrenta o problema sabe a sua solução.

O objetivo final da gestão é a garantia dos meios para a aprendizagem efetiva e significativa dos alunos. O entendimento é de que o aluno não aprende apenas na sala de aula, mas na escola como um todo. Faz-se necessário que a escola seja, em seu conjunto, um espaço favorável à aprendizagem. Que seja criando um ambiente de efervescência de busca do conhecimento, de curiosidade em relação ao mundo, que os professores capturem o conhecimento que circula na sociedade e o tragam para dentro da escola, interagindo com a sociedade e recuperando o papel da escola na formação holística do aluno.

Um importante elemento a ser considerado são as novas demandas que a sociedade atual traz para o gestor. O conhecimento também se adquire fora da escola e, dentre as pedagogias vigentes, é preciso dar a importância devida às influências da mídia sobre os jovens e os professores. Segundo dados encontrados no livro “O perfil dos professores brasileiros”, lançado recentemente, 74,3% vêem TV diariamente e apenas 40% lêem jornal, e, ainda, 59,6% nunca usam o correio eletrônico. São demandadas mudanças urgentes na escola para responder às exigências contemporâneas e à influência dos meios de comunicação.

Gostaria de discutir com os senhores duas questões que fazem parte de nossas preocupações na implantação do projeto Escola de Gestores:

1) o conceito de gestão numa perspectiva não gerencial, e sim de gestão democrática;
2) a participação do diretor da escola como parceiro no projeto de nação que está sendo construído, no qual a escola tem um papel fundamental, e a necessidade de o diretor assumir cada vez mais a função de líder comunitário.

O gestor escolar deve estabelecer uma relação dialógica com o gestor municipal na figura do Secretário Municipal de Educação e sua equipe, com o corpo docente e discente de sua escola, com os funcionários e também com os pais dos alunos. A família deve ser vista como o maior interessado no sucesso das crianças.

Nessa perspectiva, o modelo de escola deixa de ser estático para assumir um paradigma dinâmico, descentralizado e democrático.
A experiência vivida nesse tipo de escola pode permitir ao aluno passar a ser um cidadão participativo da sociedade, uma vez que o conhecimento construído na troca e na participação constitui-se em grande valor estratégico para o desenvolvimento da sociedade e condição importante na qualidade de vida das pessoas. Para que isso se efetive faz-se necessário que a escola cumpra seu papel primeiro, que é o de desenvolver no aluno as competências básicas de letramento e domínio matemático, sem o qual ele será sempre e cada vez mais excluído da sociedade.

Deve-se também atentar para os ex-alunos, egressos da escola, que não têm na sua comunidade outros espaços para continuar a desenvolver suas capacidades. A escola pode recuperar seu papel de referência abrindo suas portas para estes jovens e para a comunidade.

Um diretor comprometido, parceiro da construção das políticas de sua Secretaria e do MEC, poderá ajudar a escola a cumprir sua vocação. Poderá ajudar a definir os rumos necessários para reverter os quadros dramáticos apresentados pelo Censo Escolar e pelo SAEB. Não basta o acesso e a permanência, é preciso que o aluno aprenda. Há que se criar, através da gestão democrática e compartilhada, as condições para a viabilização desta missão.

O diretor pode assumir a condição de líder desse movimento, considerando o caráter de pluralidade cultural da escola pública, administrando a controvérsia que se manifesta na escola, estabelecendo uma rede de relações entre os alunos, professores, funcionários, pais e comunidade do entorno da escola. Cada um deles passa a ser visto não como “tarefeiro” e sim como agente de gestação do projeto da escola que determine para si os indicadores de qualidade que deseja obter, construindo uma identidade própria para sua unidade escolar.

A participação da comunidade como co-gestora, através dos conselhos escolares e da comunidade escolar na construção do projeto político-pedagógico, no gerenciamento financeiro dos recursos da escola, na definição das relações que a escola tem com seus alunos e com a própria comunidade, como bem público e a serviço desse mesmo público, é fundamental, passando a centro dinamizador da comunidade. O termo público deve ser tomado no sentido republicano, no qual a sociedade tome conta da escola e diga o que espera dela.

A construção de uma matriz de competência não servirá para estabelecer um ranking entre as escolas, e sim ser norteadora de um ideal a ser perseguido e atingido. As competências necessárias para atingir este ideal serão construídas com a participação ativa do MEC, que definiu para si os pontos necessários para a qualificação do Ensino Básico no País. Entre eles está a Escola de Gestores a ser lançada através de um Programa de Formação Continuada de Diretores da Educação Básica, que terá sua primeira ação entre 26 e 28 de outubro como um projeto piloto, quando serão convidados representantes dos diferentes Estados da Federação para nos ajudar a compor o programa do curso a ser iniciado em janeiro de 2005, em parceria com as Secretaria de Educação dos Estados e Municípios. Não se está desconhecendo as iniciativas já existentes nesta área; ao contrário, queremos aproveitar as experiências exitosas para torná-las públicas e exemplares a todos os Estados e Municípios. Não estamos querendo inventar a roda, e sim potencializar o que já existe. Acredita-se que as boas experiências devem merecer visibilidade. A troca dessas experiências e o conhecimento das soluções que foram dadas por alguns podem ajudar outros gestores a encontrar suas próprias soluções.

O que se quer é potencializar o que está dando certo e permitir que outros aproveitem essas experiências para suas próprias realidades.
Dentre os exemplos que podem ser citados está o município de Sobral, no Ceará, que reverteu os índices de analfabetismo que chegavam a mais de 40%, passando hoje a um total de apenas 812 crianças num universo de 18 mil alunos, sem a competência da leitura. A taxa de escolarização atinge mais de 100%, pois o município atende também crianças oriundas de 8 municípios vizinhos, atraídas pelos seus resultados. Uma das primeiras medidas implantadas foi a substituição de 90% dos diretores de escola, através de um processo de seleção, e a contratação de um compromisso destes novos diretores através do estabelecimentos de metas a serem atingidas, avaliação permanente e apresentação de resultados. Outra medida adotada foi a premiação daqueles que obtinham bons índices de evolução.

A educação deve ser vista como um direito. O aluno precisa aprender, esse é o nosso compromisso. O diretor é uma peça fundamental desse projeto. E ele precisa definir com seus pares as metas que deseja atingir, estabelecer um contrato com os professores, e dos professores com seus alunos e com a comunidade. E, de acordo com os resultados obtidos, devem ser reconhecidos e recompensados para serem estimulados a buscar novas metas.

Acredito que assim será inaugurado um tempo mais profícuo para a educação brasileira.



Bibliografia
O perfil dos professores brasileiros: o que fazem, o que pensam, o que almejam. Pesquisa Nacional Unesco, São Paulo: Moderna, 2004.


[1] Coordenadora do Projeto Escola de Gestores. Assessora de Relações Institucionais INEP/MEC. Doutoranda em Educação/UFRGS.

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