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No céu todos os dias são azuis

Helena Chagas * - 04 de abril de 2009 - 08:45

Brasília - Marcito dizia que a única coisa boa que só existia no Brasil, e em nenhum outro lugar, era jabuticaba. Inventou os “sábados azuis”, dia em que se recusava a dar más notícias e buscava um fato ou experiência positiva para contar em sua coluna da página 4 de O Globo. Irritou dezenas (centenas?) de políticos com sua crítica ferina e humor cáustico, sem nunca perder a elegância do texto. Escrevia, por exemplo, que, do partido tal ou do político fulano de tal, não compraria um carro usado. E aí, da sua maneira, dizia tudo.

Tive a honra e o prazer de ser interina de Márcio Moreira Alves por quase cinco anos na coluna do Globo. Ainda inexperiente e insegura como colunista, intimidada diante da responsabilidade de substituir e escrever no mesmo espaço daquele personagem da história do Brasil, no começo pensei até em desistir. Até um dia em que ele chegou e disse: “Você agora pegou o jeito. Fez uma coluna gozando da cara de todo mundo...”. Todo mundo ali era o Congresso, os políticos, o establishment no poder. Foi a melhor lição de colunismo político que poderia ter tido.

Convivi com o Marcito galante, bem humorado, leve, cheio de tiradas inteligentes e histórias boas para contar. A bala perdida que o acertou em Alagoas numa cobertura jornalística, as crises políticas, os canalhas que conheceu... Até os episódios mais dramáticos, como a saída do país após o discurso que serviu de pretexto para a decretação do AI-5 e os duros anos de exílio, ele contava com leveza e bom humor. Cassado, perseguido, exilado, Marcito não tinha traço de amargura nem ao falar do passado. Aliás, preferia falar do presente e do futuro, contar as viagens maravilhosas que fez e ainda faria, brincar com alguém na redação. Não era um personagem da história fazendo pose e vivendo um papel. Era um repórter brilhante, um colega divertidíssimo, um homem encantador. Adorava a vida e sabia viver bem – até ser alcançado pela doença.

Vai, Marcito, carregando as suas jabuticabas. Para você, no céu, todos os dias serão azuis.


Helena Chagas *
Diretora de Jornalismo da EBC

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