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Língua portuguesa, inculta e bela - Por Alcides Silva

16 de novembro de 2007 - 15:00

Água de beber
Vinícius renascia no cedê e no meu copo de uísque, na langorosa tarde de quinta-feira, feriado nacional: “Eu quis amar mas tive medo /E quis salvar meu coração /Mas o amor sabe um segredo /O medo pode matar o seu coração./ Água de beber /Água de beber, camará”. Aí perguntaram-me se a água que se pode beber, a ‘água potável’, tem esse nome pelo fato de ser normalmente guardada em potes.
Não.
Potável é palavra de origem latina com raiz grega, vem de potabile = o que se pode beber, através do verbo poto, as, avi, atum, are = beber.
Potatio, onis, em sentido próprio, era a ação de beber o vinho; na linguagem familiar, era a bebedeira, a orgia.
Potator era o beberrão, hoje alcunhado pelos nossos brasileiríssimos cachaceiro, biriteiro, bêbado e os outros mais da trintena de nomes que se dá ao emborrachado.
Antes, porém, necessária uma incursão histórica para explicar a familiaridade entre o grego e o latim, verdadeiro contubérnio de línguas ao nascer da civilização.
Conjectura-se que no século VI a C., os gregos – povo militar - dominaram as costas meridionais da península itálica, impondo sua língua à população agrícola ali estabelecida desde seis séculos antes. Houve uma como que preponderância cultural que, em se considerando a sociedade primitiva, foi razoavelmente longa, de uns três séculos talvez, constrangendo a sociedade dominada à prevalência da língua e dos costumes do povo dominador. Isso vem a refletir na história das palavras modernas, porque muitos termos recebidos através do latim, tiveram, historicamente, sangue grego.
Inclusive o nosso potator, o bebum do nascer da civilização! A raiz dessa palavra é grega, potamós, rio. Potâmide (ninfa dos rios), potamita (ser que vive nos rios), potamofobia (medo do rio – medo de água é hidrofobia), potamologia (parte da geografia que estuda os rios), hipopótamo (hipo = cavalo, pótamo = rio) são palavras vernáculas, encontradiças em todos os dicionários de língua portuguesa.
Os povoados geralmente se localizavam às margens de um rio, de cujas águas os habitantes se serviam, inclusive para beber. Naqueles idos podia-se tomar a água que vinha dos rios, a água era potável.
O termo pote é de origem desconhecida, possivelmente do latim pottus = vaso de beber; Antônio Geraldo da Cunha (“Dicionário Etimológico Nova Fronteira da Língua Portuguesa’, 2ª ed., 16ª impressão, Rio, 2003), deriva do francês. pot = pote, vasilha de uso doméstico; Antenor Nascentes (“Dicionário Etimológico da Língua Portuguesa”, Rio, 1955), o deriva do provençal pot.
Em Roma e na Grécia, os recipientes para acondicionar líquidos (vinho, azeite ou água) tinham o nome de ‘ânfora’ (do grego amphoreús, através do latim amphora), grande jarro com duas asas para facilitar o transporte.
No latim vulgar (falado pelo povo), rio era um termo expressado pela palavra flumens, derivado do verbo latino fluère = correr, fluir. Fluminense é o natural do Estado do Rio de Janeiro; porto fluvial, lugar de um rio, onde ancoram embarcações. Córrego, regato (rego d’água), era rivus. Rivalis, os ribeirinhos, aqueles que de uma margem e da outra do mesmo riacho, se beneficiavam das águas. E o uso comum muitas vezes deu causa a desinteligência, discussões, demandas judiciais, inimizades. Vem daí a palavra rival, antes, inimigo, hoje, pessoa que disputa o amor de outra.

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