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Leia - Língua portuguesa, inculta e bela!

Alcides Silva - 18 de janeiro de 2007 - 08:56

Língua portuguesa, inculta e bela!
Alcides Silva
Uma mão ou u’a mão?
O leitor já deve ter visto o numeral e o artigo indefinido uma serem escritos com um apóstrofo substituindo o m. Os que assim agem, justificam-se dizendo evitar o cacófato: u’a madeira, u’a macarronada.
Em bom português isso não existe. É invencionice de falsos puristas, artificialismo de professores desinformados e infundado exagero de gramaticóides de terceira categoria.
Ensina Matoso Câmara Jr: “Não convém exagerar o esforço contra o cacófato a ponto de apelar para vocábulos obsoletos ou artificiais. Tal é, em vez de uma em contato com mão, manga etc., a forma de u’a, em que o apóstrofo pressupõe a supressão do ¬– m -, quando na realidade se trata de uma obsoleta desnasalação da forma arcaica ua (com til no u)” Dicionário de Filologia e Gramática, p.97-98).
O vernáculo registra o artigo indefinido ua, pouco usado e que às vezes funciona como numeral: "Aliás, tenho mesmo ua memória muito fraca" (Mário de Andrade, Os Filhos da Candinha, p. 60).
Cacófato é som desagradável, ridículo, obsceno, com sentido equivocado, resultante da junção dos sons de duas ou mais palavras vizinhas. Isso não há em uma mão, uma maçã etc.
Rui Barbosa ensinava que “quando inevitáveis, as piores cacofonias se toleram. Fez-se o ouvido a elas: habituou-se; já não as sente”. E mais à frente, lembrava: “Aí a lei da necessidade obriga as exigências da eufonia à condição fatal de transigir” (Réplica. tomo II, p. 112).
Não há como substituir expressões como chefe da nação, por tal e tantas outras, pelo simples receio do “mau som”.
“Alma minha gentil que te partiste” poetou Camões.
No sermão da Quarta Dominga da Quaresma disse Padre Vieira: “Que faz o lavrador na terra, cortando-a com o arado, cavando, regando, mondando, semeando? Busca pão. Que faz o soldado na campanha, carregado de ferro, vigiando, pelejando, derramando o sangue? Busca pão”.
Eça de Queiroz, em O Crime do Padre Amaro, usou destas expressões para caracterizar o sobrenatural: “o patético drama duma alma mística...”
Nem por isso deixaram Camões, Vieira e Eça de serem considerados príncipes dentre as maiores expressões da literatura de língua portuguesa.
Nunca ganhou, triunfo dela, como a concebo, por razões, havia dado são expressões que devem ser evitadas, porque o efeito sonoro resulta em palavras ridículas ou obscenas. Para tanto, recorre-se à sinonímia ou a mudança da construção sintática.
Lembre-se: só haverá cacófato quando a palavra decorrente da junção dos sons for torpe, pejorativa ou obscena. Como explica Napoleão Mendes de Almeida, “é infundado o exagerado escrúpulo de quem diz haver cacófato em por cada, ela tinha, só linha etc. Cito a propósito os dizeres de Rui Barbosa: “... se a idéia de porta, suscitada em por tal, irrita a cacofotomania desses críticos... outras locuções vernáculas têm de ser, com essa, refugadas”. (Gramática Metódica da Língua Portuguesa, §555).

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