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Leia - Língua Portuguesa, inculta e bela !

Alcides Silva - 21 de setembro de 2006 - 13:43

Língua Portuguesa, inculta e bela
Alcides Silva
É proibido emular
A vedação não tem nada a ver com muares, nem mesmo com as ‘mulas-sem-cabeça’ ou assimilados. Tem muito com as noites de sono que venho perdendo com os ‘pintacudas’ e os ‘rubinhos barrichellos’ das madrugadas indormidas, no cantar zunido dos pneus no asfalto cansado de minha rua. ‘Emular’ não é virar mula, não. Nem tampouco se embrutecer ou perder o sentido de humanidade.
Mulo, explicam os zootecnistas, é um animal mamífero resultante do cruzamento de jumento com égua ou de cavalo com jumenta. Mulo é o burro, a besta, macha, dizem os dicionários. Macha, mas híbrida. Não estranhe o adjetivo macha, que é o feminino de macho, assim com fêmeo é o termo masculino que se emprega para designar o animal que não é macho, isso sem qualquer alusão à piada do espanhol que se engraçara com um compatriota (“ponga, ponga,... soi macho!”): A cobra macha; o jacaré fêmeo. A esse assunto, todavia, voltarei qualquer dia, se a tanto não me faltarem “o engenho e a arte”.
Por hoje, minha preocupação retém-se nos ‘rachas’ e ‘cavalos-de-pau’ que me têm tirado o sossego das madrugadas, malgrado contribua, com os impostos que pago (e são muitos e fortunosos), para o custeio de uma denominada ‘segurança pública’, a cada dia mais insegura e ausente.
Diz o Código de Trânsito que participar, na direção de veículo, em via pública, de disputa automobilística não autorizada e que possa produzir dano, é crime com penas que variam de seis meses a dois anos de detenção, além da multa e da suspensão ou proibição da habilitação (art. 308). Antes, em linguagem diferente, aquele mesmo Código já considera infração administrativa gravíssima a disputa de corrida por espírito de emulação, que traz como conseqüência uma pena de multa, a suspensão do direito de dirigir e apreensão do veículo.
Embora quem participe dos ‘cavalos-de-pau’ que me apoquentam a vida, tirando-me o sono, possam ter QIs elevados, o que duvido, apesar do status com que se apresentam de ‘filhinhos-de-papai de classe média alta’, o certo é que, como motoristas e cidadãos, são todos jumentamente burros, broncos, estúpidos e imbecis não só pela desnecessária emulação, mas principalmente falta de civilidade.
Apesar disso, nem a palavra emulação tem parentesco com os termos ‘mulo’, ‘burro’ ou ‘burrice’ e nem o fato desses imbecis me acordarem altas horas tem justificativas gramaticais.
Vamos, porém ao que interessa (ou, pelo menos, é de meu dever): mulo e emulação são palavras de origem latina, mas de étimos diferentes.
Mulo é o aportuguesamento de “mullus”, que originariamente no latim era qualquer ser macho e, posteriormente, passou a designar o animal cavalar, como cantado em ‘Cabocla Teresa’, bela toada de João Pacífico: “Virei meu cavalo a galope, / risquei de espora e chicote / sangrei a anca do tal; / desci a montanha abaixo / galopeando meu macho / e o seu doutor fui chamar”.
Emulação nasceu de aemulus-a-um, na significação primitiva: que imita, que procura se igualar (no bom e no mau sentido). Daí, êmulo, rival, adversário, invejoso. Assim o ‘ato de emular’ é, por exemplo, portar-se invejosamente numa competição e querer superá-la a qualquer custo; não é dirigir ‘como uma mula’, como parecem ser ou estar os meus ‘despertadores humanos’. É competição bestamente desabusada, concorrência brutalmente destemida, rivalidade estupidamente inigualável, audácia de selvageria embrutecida. É voar e rodopiar de carro, adrenalina a mil, músculo à mostra, nervos à flor..., no pó, bicho!

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