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José Aparecido de Oliveira:avalia a renúncia de Jânio

(*) Nelson Valente - 22 de maio de 2009 - 07:24

Segundo José Aparecido de Oliveira, ex-secretário particular de Jânio Quadros: "O que define bem o problema do Congresso é que, antes de conhecer o libelo do Sr. Carlos Lacerda contra o governo, reúne-se à madrugada para transformar-se em Comissão Geral de Inquérito, num Galeão às pressas e, em 24 horas vota a emenda parlamentarista e se compõe à roda do bolo administrativo, não chegando sequer a divergir na distribuição das fatias. A maioria parlamentar que se negou ao Presidente que o povo quis, se fez em benefício deles, num governo que o povo não elegeu." Em 04/11/1961: O ex-ministro do Trabalho, Castro Neves, jamais disse para o Deputado Herbert Levy que Jânio procurava manobrar simultaneamente com a direita e com a esquerda através de seus auxiliares de confiança. O ex-secretário particular, José Aparecido de Oliveira, endossa o desmentido feito pelo próprio Castro Neves e acentua: "É claro que não pode ter dito, porque o próprio Herbert Levy revela, entre ingênuo e malicioso, um comportamento que seria divertido e inconseqüente. O governo não se poderia afirmar senão pela unidade na orientação do Presidente que, como todo o País reconhece, inclusive os adversários mais impiedosos, e só raros correligionários arrependidos nega, era o líder e o chefe da política do governo. Admito, é claro, que pudesse haver divergência de formação ideológica, intelectual entre os que participavam da obra comum. Ela, entretanto, não se condicionava às preferências ou opções pessoais de membros do governo, já que estavam definidas, em claros e inequívocos compromissos, nos documentos e na pregação da campanha, todos eles, aliás, reunidos na única mensagem encaminhada ao Congresso pelo ex-Presidente. Era um roteiro de trabalho, compromisso ideológico e a inflexível posição da política interna e externa frente ao desafio da nossa realidade." Uma ligeira pausa e José Aparecido arremata enfático: "Que tudo fez por cumpri-lo, até a renúncia, há de registrá-lo a História, que, de certo, não cuidará das pequenas intrigas políticas, das frustrações pessoais, dos interesses contrariados, dos que mal disfarçam os negócios que defendem." Quanto às apontadas contradições internas do governo Jânio Quadros, apoiado num estrutura composta de forças reacionárias e progressistas, José Aparecido concorda: "Realmente, houve contradição notória entre as forças políticas e militares que sustentaram o candidato e que resistiram ao programa de governo. Parece que esperavam de Jânio Quadros comportamento meramente de sedução eleitoral, quando pregava as reformas reclamadas pela Nação. Assim é que, apesar das reiteradas advertências de que não era um mero postulante de votos, no encalço do favor eleitoral, participaram da verdadeira conspiração comandada pelos interesses contrariados, tão logo o governo iniciou o processo das reformas na política externa e na estrutura de nossa vida econômica. Reformas como a lei que disciplina a remessa de lucros para o exterior, lei antitruste, reforma bancária, reforma agrária, reforma dos códigos e toda uma outra série de providências limitando privilégios e abusos que se incluem na realidade espoliativa externa e internamente do nosso esforço de emancipação e do desenvolvimento, encontraram o dispositivo de resistência articulado no Congresso e fora dele com a influente e decisiva participação da maioria das forças político-partidárias que formaram ao lado do Presidente na campanha eleitoral. É claro que há exceções, mas é claro também que o governo estava definitivamente inviável no quadro institucional. Não tinha instrumento válido de resistência contra a Câmara dos Deputados, como não tinha a solidariedade de setores facilmente identificáveis nas Forças Armadas. A conspiração já tinha alcançado os quartéis. Articulava-se - e essa informação foi confirmada ao Presidente pelo General Pedro Geraldo de Almeida, chefe da Casa Militar - simultaneamente à renúncia do Governador da Guanabara, a devolução de condecorações, sob o pretexto da distinção a "Che" Guevara. Eram altas patentes que, no gesto, afirmariam pela rebeldia e pela indisciplina a divergência que na crise já deteriorava a autoridade do Presidente." "Foi nesse quadro que se processou a renúncia", diz José Aparecido. Jânio havia formulado solenemente perante o Congresso Nacional o seguinte juramento: "Prometo manter, defender e cumprir a Constituição da República, observar as suas leis, promover o bem geral do Brasil, sustentar-lhe a união, a integridade e independência". Percebe-se pelo painel descrito que já não havia condições para o cumprimento do compromisso. Ou o Presidente se tornava perjuro, ou apelava para as medidas de força entregando a bandeira da legalidade e da liberdade aos grupos que se contrapõem aos interesses populares que lhe eram, estes sim, compromissos do processo histórico que explicam a sua presença na vida pública do país." Em entrevista a um repórter, Castro Neves, diz que a "renúncia purificou a presença de Jânio na vida política e marcou a sua esquerdização". Quando José Aparecido foi indagado sobre se essas são as perspectivas reais abertas para o ex-Presidente, ele diz: "É uma realidade. Jânio Quadros é um líder popular. Nem ele pode contra a sua militante atuação nesse momento que vive o pais. O que há é que Jânio Quadros representa e isso não é apenas uma frase: as ansiedades, as esperanças e as reivindicações de multidões anônimas. Há um processo de definição na inquietadora conjuntura nacional. Todos percebem que a renúncia de Jânio representou a opção de um governante com 4 anos e meio de mandato a cumprir e aos 44 anos de idade para ficar fiel a um programa de conquistas. São as definidas pela nossa política exterior que inscreveu o Brasil no quadro das grandes potências mundiais. Restituiu-nos a dignidade há muito perdida. Trocamos a velha e pálida posição de satélite, a vexatória condição de acólito pela de nação cônscia de sua força e ciosa de sua soberania. Conquistas que se traduzem na luta contra as deformações, as contrafações, os vícios e os privilégios de um pequeno grupo que explorou o trabalho do povo e as riquezas da Nação. Programa que, como já o definiu Jânio, tem irrecusável cunho brasílico, isto é, só se condiciona aos nossos interesses nacionais." O ex-secretário José Aparecido, ao ser indagado sobre o sentido da presença de Jânio Quadros no movimento para a renovação do Congresso, com sentido de esquerda, diz: "Este é um movimento de união das forças populares, porque mais do que nunca a consciência brasileira foi despertada para a grave situação em que nos encontramos quando alguém, levado à Presidência da República por seis milhões de brasileiros, em campanha memorável, com força inédita na vida da República, viu-se forçado a renunciar, porque escravo de deveres conflitantes. O Presidente não podia contrapor-se à inércia e à má vontade da substancial maioria do congresso, sem violentar a lei. O povo, depois disso, só tem um instrumento de atuação e de defesa: a sua organização, a sua mobilização em torno de um programa que líderes em todo país elaboram. Essas idéia são exatamente as que construíram o conteúdo da memorável campanha e da experiência dos sete meses de governo. Daí a participação das forças janistas nesse esforço. Esse movimento, cuja meta será perseguida dentro da legalidade, será uma luta contra a força brutal dos apetites insofreáveis, das paixões insatisfeitas e de todos que representam interesses que se contrapõem aos da coletividade. A importância da encruzilhada presente está que ou resistiremos, mudamos e reformamos para subsistir como nação e povo livres poderemos ser surpreendidos pela insatisfação popular." José Aparecido conclui: "Jânio Quadros poderia ter continuado, se quisesse transigir, coonestar, pactuar com interesses ou então ensangüentar. Ou continuar apenas por continuar, sem fazer, sem cumprir, sem governar. Renunciou para que a nação soubesse, sentisse e avaliasse a enormidade do caos em que o país se encontrava. O encontro de Jânio com o povo brasileiro será muito mais breve do que supõem. As causas da crise e suas soluções, pela compreensão que revelarem os líderes políticos, indicarão o caminho. O que é certo é que o povo não concorda com o que aí está e está nas suas mãos modificar radicalmente a estrutura injusta, obsoleta que não permite servi-lo corretamente."


(*) é professor universitário,jornalista e escritor

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