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Filhos: o problema é cuidar deles, da casa e trabalhar

Deigma Turazi e Gilberto Evangelista/ABr - 08 de março de 2004 - 16:50

Maria das Dores dos Santos Conceição, a Vó Maria, nasceu em 1911. Aos 92 anos de vida, está lançando seu primeiro CD, com pérolas do samba. Ela é viúva do compositor Ernesto dos Santos, o Donga, que compôs o famoso samba “Pelo Telefone”, o primeiro a ser gravado em disco. Donga, seu terceiro marido, não a estimulava a seguir na carreira de cantora e pedia que não cantasse nas rodas de samba que promoviam em sua casa, quando ali estavam lendas da música brasileira como Pixinguinha, Jacob do Bandolim, Clara Nunes e João Nogueira.

Apesar de ser dona de uma voz elogiada por muitos, Maria acabou indo trabalhar como dietista e tarefeira de uma fábrica de rendas. Vó Maria trabalhou para sustentar a filha do primeiro casamento, do qual saiu viúva depois de dois anos. Sua segunda união foi com o jornalista João Conceição, um dos pioneiros do Movimento Negro no Brasil. Depois de 15 anos, a união se desfez. João disse que um dos dois era demais em casa. A resposta que deu, ela conta com expressão de orgulho: “A porta da rua é a serventia da casa”.

A história de Vó Maria, com seus casamentos, separações e uma vida de trabalho duro, condensa algumas das experiências vividas pelos 61,5 milhões de brasileiras. O estudo da Fundação Perseu Abramo, realizado em 2001 com 2.502 mulheres de todo o país, as pesquisadas apontam como principal dificuldade da mulher atual o excesso de responsabilidades, atribuídas principalmente à dupla jornada de trabalho, o doméstico e o remunerado. Lembrados por 11% estão as discriminações no mercado de trabalho, tanto de funções como de salários (7% do total, 10% entre as que acham que a situação da mulher está pior), o preconceito social que reserva às mulheres discriminações e um lugar inferior em relação aos homens (5% e 7%, respectivamente) e maior exposição à violência (2% e 4%).

Entre as melhores coisas de ser mulher está a possibilidade de gerar filhos (55%). Em contrapartida, elas classificam como as piores conseqüências de ser mulher hoje a discriminação social (17%), os aspectos relacionados a maternidade, casamento e marido (15%), discriminação no mercado de trabalho (15%), questões de saúde (14%) e a violência contra a mulher (11%).

“O trabalho doméstico acarreta para a mulher, no mínimo, uma dupla jornada. As mulheres que trabalham fora chegam em casa e têm trabalho doméstico a desenvolver. Isso é aceito socialmente. Agora, é um trabalho explorado, é um trabalho não pago. Os homens não têm o tamanho da responsabilidade social da mulher”, diz a coordenadora da pesquisa, destacando que 96% das mulheres entrevistadas são responsáveis por todos os afazeres domésticos - limpar, passar, cozinhar, cuidar dos filhos entre outras atribuições.

“O trabalho doméstico dificulta, quando não inviabiliza um maior avanço da mulher. É praticamente impossível uma pessoa que tem uma dupla jornada desse tamanho conseguir ter acesso, além do mercado de trabalho, a outros ideais profissionais, como vida política. É necessário haver mudanças radicais na sociedade, para acabar de vez com a divisão sexual do trabalho”, defende a socióloga da Fundação Perseu Abramo.

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