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Geral

Entrevista especial– Fadéla Chaib da OMS

Agência Notisa - 20 de maio de 2005 - 07:23

Um dos objetivos da 58ª Assembléia Mundial de Saúde, que se encerra no dia 25, em Genebra, é estabelecer uma estratégia mundial de vacinação.
Como responder de forma eficaz a situações de crises como tsunamis, terremotos, guerras civis ou epidemias? Qual a forma de tratar e prevenir AIDS e câncer atualmente? O que fazer com os estoques de varíola? Como erradicar a poliomielite até o fim do ano? Qual deve ser a estratégia para países se prepararem para o caso de uma pandemia de influenza? Quais são os problemas de saúde pública causados pelo álcool? E ainda: quais os benefícios da medicina tradicional?

São estas perguntas que os participantes da Assembléia Mundial de Saúde — a 58ª da história da Organização Mundial de Saúde (OMS) — estão tentando responder em Genebra, no evento que se iniciou em 16 de maio e se encerra no dia a 25. Além disso, o principal encontro global sobre saúde que se conhece pretende discutir as estratégias para o estabelecimento de um calendário mundial de imunização. Sobre este assunto, Fadéla Chaib, jornalista porta-voz da OMS , respondeu por e-mail para a NOTISA questões específicas cujos dados foram, segundo a jornalista, coletados entre os pesquisadores da entidade.

NOTISA – A OMS pode comparar os programas de imunização nos diversos continentes?
Fadéla - A OMS tem comparado a cobertura para imunização em seis regiões. Algumas vão melhor que outras e, sem qualquer surpresa, são as regiões mais pobres que tendem a fazer pior. Por exemplo, em 2003, enquanto a cobertura pela vacina DPT3 (difteria, coqueluche e tétano combinados) foi de 95% nos países industrializados, na África subsaariana atingiu 60% (com conseqüentes 9,9 milhões de crianças aí sem cobertura) e no sul da Ásia 71% (com prejuízo para outras 9,6 milhões). Além disso, no Pacífico e na Ásia oriental mais de 4 milhões não tinham recebido DPT3. Entretanto, surpreendentemente, na América Latina e no Caribe a cobertura com DPT3 alcançou os expressivos 89%. De qualquer forma, no mundo todo, a imunização com a vacina tríplice aumentou de 20% em 1980 para 78%, em 2003.

NOTISA – É possível estabelecer um calendário eficaz de imunização em países com grandes problemas sociais e econômicos.
Fadéla - Vacinas contra sarampo, poliomielite, difteria, tétano, coqueluche e tuberculose são ministradas de rotina em todos os países em desenvolvimento Durante as campanhas de imunização, é de fato muito importante atingir todos os alvos. Claro que é mais difícil para os agentes se moverem e chegarem até pessoas que estão em situações de guerra ou insegurança. De tempos em tempos, órgãos da comunidade internacional, especialmente as Nações Unidas ajudam os países a negociar “Dias de paz ou tranqüilidade” (Days of peace or tranquility) para permitir que os profissionais possam ir e vacinar crianças em regiões de conflito. É muito importante garantir segurança não só para os trabalhadores de saúde, mas também para as famílias para que elas possam trazer seus filhos para serem vacinados.

NOTISA – Qual a história dos esforços dos países no sentido de estabelecer uma estratégia global de imunização?
Fadéla – Em 1974, a Assembléia Mundial de Saúde daquele ano constatou que embora a difteria , a coqueluche, o tétano e o sarampo tivessem deixado de ser problema de saúde nos países ricos, eram as maiores causas de mortalidade infantil nos países em desenvolvimento. A poliomielite, em particular, estava alcançando, rapidamente, proporções epidêmicas. Daí a reunião estabeleceu como objetivo o desenvolvimento de programas de imunização, o que formou a base do EPI (Programa de Expansão de Imunização), que foi aprovado na Assembléia de 1977. Já em 1980, o mundo pobre sentiu os efeitos da recessão global que atingiu os países industrializados, os quais alcançaram as maiores taxas de desemprego desde 1930, gerando uma grave crise de débito, quando então o México suspendeu o pagamento de sua dívida externa.

NOTISA – E o que ocorreu neste período?
Fadéla - Neste período, diante das carências de recursos, a Unicef propôs quatro técnicas utilizando recursos assistenciais simples agrupados sobre a sigla GOBI — G de crescimento (grow) monitorado pela checagem do bem estar da criança, O da hidratação oral em caso de diarréia pela mistura do sal e açúcar com água (soro caseiro), B do aleitamento (breastfeeding) materno e I de imunização contra as principais causas evitáveis causadoras de mortes das crianças: as mesmas tuberculose, difteria, coqueluche, tétano poliomielite e sarampo. Um dos maiores motivos da força desta prescrição era que ela era de baixo custo. Já em 2000, foi lançada a Aliança Global para Vacinas e Imunização (GAVI) no Fórum Mundial Econômico de Dave, no rastro do recém criado (1999) Fundo para Vacinação de Crianças que angaria fundos de setores privados e públicos para aumentar a vacinação de crianças. Na agenda destas estratégias estão 30 milhões de crianças que nascem todos os anos em países pobres e não recebem as seis imunizações básicas; está a disparidade do número de vacinas disponíveis entre crianças de países ricos e pobres e está a falta de investimento em pesquisa e desenvolvimento de vacinas para doenças que são prevalentes em paises pobres, particularmente HIV/Aids. , malária e tuberculose. Tais questões vão continuar a ser discutidas nesta reunião de 2005, entre os outros assuntos.

NOTISA - Qual a opinião da OMS sobre o programa brasileiro da poliomielite? Vocês consideram que poderia ser um modelo para países similares?
Fadéla – O Brasil começou sua primeira campanha organizada para vacinação de pólio em 1961, suplementando seu trabalho de imunização com uma sólida vigilância da doença através de uma rede laboratorial. O programa é considerado de muito sucesso — já que em 1989 o país descreveu seu último caso — e este sucesso tem sido importante, de várias formas, para se pensar na eficácia real de uma estratégia global de erradicação da poliomielite. Primeiro, o Brasil demonstrou que programas de vacinação em massa podem ser eficazes em países tropicais. O êxito do trabalho provou que os governos podem imaginar formas para chegar até as populações mais remotas ou marginalizadas, sejam elas pobres, migrantes, rurais ou indígenas. Provou também que a pólio pode ser eliminada em países em desenvolvimento ou abastados, de forma semelhante. Vale lembrar que o programa global de eliminação da doença também foi adotado como um objetivo da comunidade internacional em 1988 e reduziu os casos em 99%, de 350.000 por ano para 1000 em 2004.

Nota da redação: matéria publicada no número zero experimental da "Revista Notisa".


Agência Notisa (jornalismo científico - science journalism)

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