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Em busca do padrão de beleza, homens e mulheres erram na hora da dieta

Saúde Plena - 02 de julho de 2016 - 14:20

No manual feminino, a definição de aceitação social é atrelada a uma lista de condições. No topo do inventário, a adequação ao padrão estético, sobretudo em relação ao peso, é uma das cláusulas que mais castigam as leitoras, inclusive as que já estão “dentro dos moldes”. Segundo uma pesquisa de pós-graduação conduzida na Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS), aquelas com índice de massa corporal (IMC) normal se submetem a comportamentos para emagrecer com frequência semelhante à de homens obesos.

Após analisar dados de 27.501 pessoas (veja arte), a enfermeira Sabrina Chapuis de Andrade, principal autora da pesquisa, descobriu que comportamentos voltados à perda de peso - como jejum prolongado, exercício físico exaustivo e ingestão de diuréticos - aumentam significativamente com o IMC, mas principalmente com a percepção que a pessoa tem do próprio peso.

“Um resultado impressionante foi a elevada porcentagem (11,3%) de mulheres com IMC normal que praticam de forma frequente comportamentos para emagrecer”, considera Sabrina Andrade. Para se ter ideia, entre elas, a ingestão de laxantes — hábito comum da bulimia — é equivalente ao de homens com obesidade grau 3. “Induzir vômito é mais prevalente em mulheres com IMC normal do que em homens com obesidade mórbida”, explica a autora.

A nutricionista Mariana Melendez Araújo, pós-graduada em pesquisa clínica pela Faculdade de Medicina da Universidade de Harvard (EUA), explica que o comportamento ocorre, especialmente, entre indivíduos inseridos em ambientes obesogênicos, em que há pessoas que adotam esses comportamentos. “A acessibilidade a alimentos não saudáveis é mais fácil e a correria do dia a dia propicia esse tipo de conduta, independentemente do peso que se tem.”, explica Melendez. “Aliás, hoje, o peso não pode ser mais parâmetro para se medir a saúde. Existem muitos magros na aparência com riscos iguais e até maiores que os de um obeso”.

Responsabilização
O assunto é delicado e muitas pessoas se recusam a conversar sobre ele abertamente. Nesse sentido, o anonimato da internet, meio utilizado pelos participantes da pesquisa, foi crucial para a investigação dos hábitos normalmente negados. Especialista em psicologia da saúde e hospitalar, Michele Pereira Martins diz que diversos estudos, além da própria prática clínica, mostram que comportamentos relacionados à perda de peso geram grande responsabilização no indivíduo.

“Isso porque fazem referência ao caráter das pessoas: alguém que não consegue controlar o próprio peso não tem força de vontade, é preguiçoso e não se envolve nas atividades. Há, sim, uma ligação com a moral do indivíduo. Percebemos que essa responsabilização e a referência à falta de caráter fazem com que essas pessoas realmente apresentem um sofrimento muito grande”, diz a psicóloga vinculada à Associação Brasileira para o Estudo da Obesidade e Síndrome Metabólica (Abeso).

Por exemplo, bulímicos — que ingerem grandes quantidades calóricas compulsivamente e, depois, induzem vômitos, entram em jejum prolongado e usam laxantes para evitar o ganho de peso — escondem a situação por constrangimento e culpa. “Como os comportamentos compensatórios podem evitar grandes variações de peso, a pessoa pode passar anos sofrendo de forma solitária, sem que os outros à volta identifiquem que ela está mal”, diz a psiquiatra Helena Moura, membro da Comissão de Especialidades Associadas da Sociedade Brasileira de Cirurgia Bariátrica e Metabólica (Coesas).

Exercícios intensos
A maior suscetibilidade feminina à pressão pelo corpo perfeito não exclui o fato de que homens também são vítimas da cobrança. O IMC elevado e a autopercepção são associados ao risco aumentado para comportamentos voltados à perda de peso de forma frequente, especialmente entre eles. Sabrina verificou, por exemplo, que 10% dos homens do estudo se envolvem em pelo menos um comportamento frequente. Atividades físicas exaustivas e intensas parecem ser as preferidas: quase 15% dos participantes adotam a medida regularmente, e pelo menos 50% dizem fazê-la às vezes.

Em obesas, os índices ficam em torno de 40% e 10% para prática eventual e frequente, respectivamente. Influências socioculturais podem explicar esses resultados. “O homem é considerado atraente quando tem um corpo definido e forte, assim como artistas e atletas famosos. Ou seja, ele faz mais exercícios físicos porque, além de perder peso, acredita que vai ficar musculoso”, supõe a pesquisadora.

Os participantes do sexo masculino também são mais vulneráveis à ingestão de medicamentos emagrecedores: obesos mórbidos apresentam risco 108 vezes maior de lançar mão dessa tática, comparado aos com IMC normal. Mulheres com perfil semelhante têm 30 vezes mais risco de usar medicação. A autopercepção do próprio peso, contudo, parece exercer influência nos dois sexos, mas, sobretudo, no masculino. Em relação à percepção das próprias medidas, quanto maior o valor atribuído ao ponteiro da balança, mais os homens se envolvem em comportamentos frequentes para emagrecer.

Por exemplo, aqueles que consideram a magreza essencial para a autoaceitação têm 30 vezes mais risco de induzir vômitos para perder peso, enquanto, em mulheres, as chances são 25 vezes maiores. “Os resultados indicam que mais importante do que trabalhar os transtornos alimentares com grupos específicos, sejam indivíduos muito magros ou obesos, é abordar o assunto com o maior número possível de pessoas e trabalhar com a autoestima delas”, diz Sabrina.

Personalidade
Agora, Sabrina analisa comportamentos para emagrecer e possíveis associações com a personalidade e os traços emocionais. Ela conta que resultados preliminares apontam a influência de tipos afetivos instáveis e externalizantes, assim como de traços marcados de sensibilidade, desejo e raiva. “Acreditamos que conhecer melhor o perfil das pessoas com sintomas e transtornos alimentares contribuirá para um melhor entendimento desses distúrbios, que são complexos e exigem mais pesquisas para que o tratamento oferecido seja mais individualizado”, diz.

A psiquiatra Helena Moura acrescenta que estudos indicam correlação entre obesidade e risco aumentado para depressão, especialmente em mulheres. “Quanto mais obesa é a pessoa, pior o risco, que chega a ser cinco vezes maior entre obesos de grau 3 em relação aos de grau 1. Há ainda transtornos de ansiedade, com risco 1,27 maior para transtorno de pânico”, diz.

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