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Débora Carvalho: "Não estou pronta para amar tanto"

Débora Carvalho - 10 de maio de 2008 - 05:44

Uma reflexão de uma mulher que ainda não é mãe, mas que finalmente compreendeu quão profundo é o amor da própria mãe

Eu ainda não sou mãe. Estou casada há um ano, mas ainda não me sinto preparada para amar tanto alguém. Descobri isso depois que fui tia. Não, não fiquei pra titia. Me casei um ano depois que nasceu minha primeira sobrinha. Ao tomá-la em meus braços, senti meu corpo invadido por um sentimento que me deixou aterrorizada: carinho, muito carinho por aquele pequeno ser; uma vontade de gastar metade do meu salário com presentes e roupinhas fofas; vontade de não devolvê-la aos braços da minha cunhada; vontade de cuidar, de fiscalizar se sua mãe a estava tratando como ela merecia - claro que em sigilo. A idéia de gastar metade do salário ficou só na idéia, pois os débitos automáticos não permitiram.

Foi uma delícia ouvir de todos que ela era "a cara da titia Dé". As sensações de felicidade, de amor, de carinho e afeto foram tão grandes que me deu medo. Afinal, todo aquele sentimento era pela filha do meu irmão. Já pensou o que eu iria sentir se a filha fosse minha? Já é tão gostoso ouvir aquela voz tão doce dizendo: "Titia Dé! Imagine como deve ser ouvi-la chamar "Mamãe!"

Um ano depois de casada meu esposo começou a se empolgar e pediu para pararmos com os métodos contraceptivos: "Vamos fazer um primo para a Raquel." Fiquei tomada por uma ansiedade sem tamanho. Parei com o medicamento por algumas semanas, e começamos a planejar como seria o quarto, a alimentação e a educação da criança.

Temos um cachorro salsichinha, chamado Milú. Ele é tão esperto que é 'quase' gente. Mudamos de casa no mês de abril e o Milú danou a fazer xixi no botijão de gás. Meu esposo queria bater nele, dizendo que ele tinha que aprender. Eu não permitia, pois adianta corrigir um cachorro se não for imediatamente - assim como minha sobrinha. Na semana passada, meu esposo acordou de às 3 da madrugada com o barulho da 'torneira do Milú aberta', levantou num pulo, deu umas chineladas e mostrou o lugar certo de fazer xixi, como eu havia dito que tinha que ser. Faz uma semana que o Milú não faz suas necessidades dentro de casa e voltou a pedir para sair, como fazia antes.

E eu, eu fiquei pensando na delícia que seria educar uma criança de verdade e meus pensamentos se voltaram à minha mãe, e no quanto ela foi corajosa para amar. Ela casou cedo e teve seis filhos. Seis. Cuidou pessoalmente da nossa educação. Entre passar o dia fora e pagar uma creche ou babá para cuidar dos seis filhos, ela mesma se encarregou da tarefa, submetendo-se aos suprimentos básicos que meu pai podia prover, e aventurando-se em vendas a partir de casa para completar o orçamento. Cuidou com carinho da nossa alimentação - o mais natural possível, sem carne e sem açúcar ou refrigerantes. Fazia pão integral e leite de soja pra gente. Contava histórias todos os dias e comprava livros, cadernos e lápis-de-cor, para esquecermos a televisão. Deixava a gente brincar com lama e dizia que sabão foi feito para lavar a sujeira mesmo. Ela nos amou tanto que trabalhou duro para ajudar a pagar nossos estudos e apoiou cada uma das seis profissões que escolhemos, dizendo que é importante a gente trabalhar naquilo que gosta para fazer bem-feito e ser feliz.

Minhas primeiras entrevistas foram com ela, e o resultado das respostas que ela me dava foi a minha alfabetização aos 6 anos, em casa mesmo. Foi quando ela passou a me dar livros para responder o que não sabia. Ficou tão empolgada que e todos os filhos foram alfabetizados antes da escola. E foi assim que ela me ensinou a ser livre e independente. Essa foi a melhor lição que aprendi em toda a minha vida.

Quanto a mim, ainda não estou pronta para amar tanto alguém.

Voltei a me proteger para não engravidar e adiamos para daqui uns dois anos os planos de aumentar a família. Depois de uma longa conversa o maridão concordou e garantiu que vai se dedicar a preparar uma poupança especial para isso e juntos vamos estudar mais sobre educação de filhos. Quem sabe, daqui uns dois anos eu esteja pronta para me aprisionar ao amor mais profundo do mundo.




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