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Das dietas extremas à orgia alimentar, Erika tenta mudar relação com a comida

Com um fígado doente, muito estresse e ansiedade por medo de comer, Erika Espíndola aceitou engordar

Campo Grande News - 20 de julho de 2018 - 15:00

Uma nova mulher se descobre por meio de uma nova forma de se enxergar, por dentro e por fora, e isso reflete para os outros. (foto: Joás Pleffken)
Uma nova mulher se descobre por meio de uma nova forma de se enxergar, por dentro e por fora, e isso reflete para os outros. (foto: Joás Pleffken)

Em um textão no Instagram, a música Erika Espíndola expõe duas fotos. Na do "antes" ela aparece magra, com um corpinho bem padrão. Na segunda, do "depois", a cantora surge com 25 quilos a mais. Nas palavras, ela ela fala da luta para atingir o corpo padrão durante mais de 30 anos e como é viver hoje, sem cobranças.

Nas imagens, ironicamente ela inverte a lógica padrão que estamos acostumados a ver, numa sequência de fotos em que no "depois" a pessoa aparece cada vez mais magra e feliz. É porque Erika descobriu que a relação com o corpo e com a alimentação estava errada. Por mais que ela emagrecesse a duras penas, se matando de praticar exercícios físicos, fazendo dietas agressivas, nunca chegava ao equilíbrio. Por conta da pressão social, dentro e fora de casa, acabou com uma compulsão alimentar.

Mas ela faz questão de deixar claro que ainda não está bem resolvida, pelo contrário: está lutando para tomar o controle de seu corpo. "Precisei passar da extrema restrição para à orgia alimentar para entender que do jeito que tava não dava mais pra ficar. Digo que sim, fui um pouco negligente comigo nesse aspecto, de me permitir ir além, comer demais, nessa nova fase, mas é uma escolha. Hoje se eu optar por emagrecer vai ser de outra forma, eu não quero paranoia, eu não quero depressão, picos de tristeza e alegria. Quero aprender a colocar a comida e o peso no lugar deles, ele não são o centro da minha vida", diz.

A postagem foi para alertar tantas meninas que estão perto de Erika que, assim como ela, desde novas sentem-se extremamente cobradas pela aparência. Para que, com elas, o trauma seja menor. "Hoje, aos 31 anos, e vendo tantas meninas muito próximas fazendo dieta com 14 anos, me sinto forte para falar sobre isso. É uma coisa que nem mesmo os meus pais, as pessoas mais próximas a mim, sabem o tamanho da dimensão que carrega para o meu emocional e eu acho injusto ver isso se repetindo".

Com muita sensibilidade, Erika resgata seu passado e se lembra de que até determinado momento não se via diferente ou mais feia que suas colegas do colégio. Mas como sempre acontece com pessoas "fora do padrão", a menina alta, de porte maior que as outras, foi alertada de sua aparência. "Eu começo a me lembrar de eu sendo chamada de gorda pela primeira vez com uns cinco anos. Consigo ter essa lembrança de que estava tudo bem comigo e, de repente, o mundo externo não achava que estava. Conseguiam apontar defeito para o meu corpo em coisas que eu mesma nunca tinha notado".

Com seis anos foi ensinada que por mais perfeita que fosse, tinha alguma coisa errada. "Uma criança vai tomar como verdade aquilo que a ensinam.Hoje eu dou uma olhada em algumas fotos e vejo que eu nem era gordinha, eu era uma criança normal e aparentemente saudável". Desde muito nova esses padrões foram se reforçando na sua pequena cabecinha e era comum a compararem com a prima ou com a amiguinha do corpo ideal.

"Era uma vida baseada nisso, eu passei a ter muita vergonha, mas muita vergonha mesmo, e os apelidos! Nossa, eles eram os mais variados. Quando você sente que não se adequa sai pelos seus poros, parece que seus feromônios gritam 'eu sou diferente'", brinca ela. A cada novo ano, era uma nova parte de seu corpo "estragada"."Eu calço 38 desde os 9 anos. Então o pé que era grande, era o narigão, o corpo grande".

De tão pesado o fardo, a jovem chegava a pensar coisas horríveis como "não era pra eu ter nascido, eu nasci toda errada". E como não podia deixar de ser, Erika cresceu uma pré adolescente muito mau humorada. Dos 11 para os 12 anos entrou para o primeiro programa de emagrecimento, incentivado pela família.

"Ai eu comecei a fazer esse programa que tinha uma nutricionista, uma psicóloga, e lembro eu não tava gorda, e eu ainda emagreci 12 quilos, virei um esqueleto. Até os 14 eu tinha emagrecido 20kg, então estava muito magra e eu ainda me sentia gorda".

Foi nessa fase que a sua maior preocupação passou a ser a palavra com seis letras: comida. "Eu desenvolvi compulsão alimentar. Comecei a ter medo de sair de casa, porque tinha pânico de comida, pavor. Era como um alcoólatra que vai pra uma festa com bebida! E o pânico vinha em duas sequências: na restrição, em que eu deixava de comer porque tinham os alimentos proibidos, do mal. Quando alguém tomando um copão de milk-shake eu achava um absurdo".

E segunda parte vinha na compulsão alimentar. "Lembro que aos 15 anos eu passei a acordar de madrugada, em episódios de sonambulismo, em que eu atacava a geladeira mesmo, comia tudo que tinha, e só imaginava que tinha algo errado quando sentia uma dor na barriga descomunal, era bizarro, e eu me sentia impotente diante desse quadro porque as pessoas a minha volta não sabiam como me ajudar".

Se não pudesse ficar pior, Erika descobriu o poder dos exercícios físicos e mais uma vez, passou a exagerar neles também. Aos 14 anos já era uma rata de academia, ficava malhando e participava de qualquer aula que fosse por horas. "Chegava às 14h e saia às 18h30 e mantive esse pique até os 17 anos, sem me alimentar bem, sentindo tontura, tomando laxante, diurético, minha visão ficava escurava no meio da sala de aula, mas eram coisas que eu guardava pra mim".

Cada quilo perdido era uma alegria imensa, uma sensação de poder, de ser inabalável! Do contrário, a cada 100 gramas a mais na balança, Erika caia numa tristeza imensurável. "Eu sentia que não prestava, que era horrorosa, que não tinha direito de amar ninguém e nem de ser amada", explica ela, que hoje se arrepende das palavras ditas a si.

Com 1,74 metros de altura, chegou a pesar menos de 60kg e mesmo assim não estava bom. Aos 20 anos, caiu em uma crise de ansiedade com o vestibular e achando que poderia ser melhor pra si, abraçou a oportunidade do intercambio para os Estados Unidos. E quando voltou de lá chegou mais magra mas bastou pisar no Brasil que engordou aqueles quilinhos perdidos.

Mais uma vez, entrou na noia das dietas e descobriu a dieta que corta carboidratos e ingere basicamente proteínas. "Até que comecei a sentir umas pontadas no lado direito do corpo e atualmente descobri que é gordura no fígado. Na época o médico disse que era pouca coisa. Hoje tenho certeza que foi essa dieta maluca que me adoeceu".

Cansada de ser controlada pela comida e pelo seu corpo, foi atrás de ajuda afinal estava doente! E teve a sorte de ter cruzado com gente muito boa nesse caminho de reeducação alimentar e autoconhecimento. "Por meio de uma coach online consegui ver o outro lado da moeda. Ela ensina nos alimentarmos de maneira intuitiva, como quando crianças fazemos. E ela prega um detox de dietas, o que pra mim foi muito libertador".

Ao passar por uma situação delicada, em que seu pai adoeceu por conta do diabetes e teve de amputar três dedos para se recuperar, Erika deu um restart na mente e entendeu. "Me senti obrigada a ser grata. Obrigada por eu ter dois joelhos massacrados por atividades extremas, mas que estão aqui. Meu corpo me leva pros lugares. Eu tenho um braço, eu enxergo, eu consigo falar, eu consigo cantar, eu comecei a botar minha vida em treno pra eu me conhecer, ser grata pelo que eu tenho hoje".

Com 25 kg a mais gorda, A Erika Espindola de hoje é uma nova mulher, muito mais feliz que a de antes. "Acredito que hoje eu seja mais grata do que quando eu não tinha esse excesso de peso. Você não percebe que o corpo que você tem é privilégio".

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