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Conselheiro tutelar, porque alguém gostaria de ser um?

Rogério Tenório de Moura* - 22 de janeiro de 2008 - 09:52

Conselheiro tutelar, porque alguém gostaria de ser um?


Toda vez que se aproximam as eleições para o conselho tutelar como num passe de mágica começam a se proliferar os candidatos ao cargo de conselheiro começo a me questionar o que levaria alguém a querer assumir tal cargo. De longe é fácil se perceber que os atrativos para tal empreitada são, na verdade, pra lá de repulsivos: trabalho sete dias por semana, trinta dias por mês, a qualquer hora do dia ou da noite; lidar com crianças agressivas, sem limites, oriundas de lares desestruturados, onde a regra é violência ou negligência, quando não as duas.
É óbvio demais para a mais ingênua das almas que a empreitada é dura e o salário ... ah, sim! O salário! Acho que chegamos no cerne da questão, no porquê de tanta gente querer carregar no colo essa bomba sem dia nem hora para explodir. Ganhos na faixa de setecentos reais por mês não são nada dispensáveis em uma cidade sem crescimento econômico algum, em que os salários no comércio giram em torno de um salário mínimo sem carteira assinada e na indústria, bem! Que indústria?
Há também o serviço público, mas para isso é preciso ter um certo grau de escolaridade, se preparar, passar em concurso, ou seja, é preciso ter mérito e em um país onde o simples fato de ser pobre já é motivo o suficiente para se receber um enxurrada de programas assistenciais, ter de conquistar algo por merecimento parece coisa de outro mundo.
Entendo e, até certo ponto, concordo com o critério de admissão de conselheiros tutelares, a eleição direta é, sem sombra de dúvida, o instrumento mais legitimo de expressão da vontade popular e conseqüentemente o que melhor consegue atender as expectativas de uma comunidade. Não é à toa que nos Estados Unidos, maior democracia do mundo, há eleição para quase todos os cargos públicos: para xerife e/ou comissário (correspondente a delegado de polícia no Brasil), defensor público, promotor e até juiz. Note-se, porém, que para todos os cargos em questão é necessária a devida formação, assim garante-se que a pessoa eleita tenha realmente competência para exercer o cargo para o qual foi eleito. Então pergunto, que formação um cidadão precisa ter, no Brasil, para ser conselheiro tutelar?
É justamente aí que mora o perigo, pois um pai completamente relapso, que deveria ter seus próprios filhos encaminhados ao conselho tutelar pode ser eleito para ser responsável pelas crianças de uma cidade inteira em um momento de surto coletivo. Levando-se em conta o baixo índice de participação popular nas últimas eleições para o conselho isso não é nada difícil de ocorrer. Um fanfarrão que tenha um grande número de colegas de buteco ou uma família razoavelmente grande que feche em torno de seu nome tem grandes chances de se tornar “guardião do bem-estar e desenvolvimento físico, emocional e intelectual de nossas crianças”!
Como todos os leitores que me acompanham há um bom tempo devem saber, sou professor e minha esposa também, logo nos relacionamos em nosso dia a dia com um grande número de pessoas, direta ou indiretamente. Isso nos torna conhecedores de certas particularidades das famílias de nossos alunos que deixariam a grande maioria das pessoas de cabelo em pé. É claro que não pretendo utilizar-me deste espaço para tornar públicos os problemas pessoais de ninguém, aliás, só temos conhecimento deles porque de uma forma ou de outra eles influenciam diretamente em nosso trabalho com nossos educandos, mas são uma espécie de segredo de confissão, só interessam à escola e em conselho de classe. No entanto, levando-se em conta tratar-se de uma instituição que embora fosse melhor não haver a necessidade de existir, mas há e ela faz parte do nosso dia a dia como educadores, sinto-me na obrigação de alertar o amigo leitor enquanto eleitor a exercer seu papel de cidadão fiscalizando o trabalho dos novos conselheiros eleitos em dezembro passado e daqui por diante analisar cuidadosamente a cada eleição todos os nomes dos postulantes aos cargos em questão e votar, se não com o entusiasmo de eleger alguém em quem você acredita, ao menos com o desencargo de consciência de não deixar que alguém em quem você não acredita seja eleito.
Só para tornar mais tangível o que estou afirmando, compartilhando apenas o milagre, e não o santo, por questão de ética profissional, houve candidatas na última eleição, que graças a Deus não foram eleitas, que eu não contrataria nem para babá. Não tem conhecimento teórico de psicologia infanto-juvenil, aliás não tem formação específica em coisa alguma; vivem em pé de guerra com os maridos, que o diga os vizinhos; os filhos são negligenciados a ponto de ficarem de exame final na escola e elas não terem conhecimento disso. São crianças relapsas que raramente realizam as tarefas de casa, nunca fazem os trabalhos e faltam tanto que, se seguíssemos à risca o figurino, reprovariam por falta. Naturalmente a falha não está nessas crianças, mas em pais que não estão cumprindo suas obrigações nem com sua própria família e querem convencer o eleitor de que o fariam com crianças que eles nem sequer conhecem.
Segundo o departamento de psicologia da Universidade de Chicago, 82% das famílias norte-americanas apresentam distúrbios psicológicos, ou seja, ser anormal passou a ser normal. Imagine que tipo de mundo estaremos deixando para nossos filhos se o fato de ser doentio se tornar algo banal, o convívio social se tornará em algo próximo da barbárie! “Então alguém pode afirmar: Ah, mas isso é nos Estados Unidos, o que nós temos haver com isso?” Bem, se em um país onde os cidadãos tem acesso a saúde, educação e segurança pública de qualidade, onde um trabalhador que terminou apenas o correspondente ao nosso ensino médio ganha em média o correspondente a 15% do salário do presidente há tantos distúrbios psicológicos, o que se pode dizer sobre o Brasil?
Para finalizar, deixo uma mensagem de alguém que, com certeza, tem muito mais serviços prestados à humanidade e conseqüentemente infinitamente mais crédito que eu; trata-se de uma mensagem do apóstolo Paulo a Tito em que aquele exorta este a instituir sobre a igreja presbíteros (também chamados na igreja primitiva de bispos) que o ajudem em sua obra e ensina-o a bem escolher estes colaboradores de sorte que estes venham, de fato, a somar e não a atrapalhar:

“Por esta causa te deixei em Creta, para que pusesses em boa ordem as coisas que ainda restam, e de cidade em cidade estabelecesses presbíteros, como já te mandei:
Aquele que for irrepreensível, marido de uma mulher, que tenha filhos fiéis, que não possam ser acusados de dissolução nem são desobedientes.
Porque convém que o bispo seja irrepreensível, como despenseiro da casa de Deus, não soberbo, nem iracundo, nem dado ao vinho, nem espancador, nem cobiçoso de torpe ganância;
Mas dado à hospitalidade, amigo do bem, moderado, justo, santo, temperante;
Retendo firme a fiel palavra, que é conforme a doutrina, para que seja poderoso, tanto para admoestar com a sã doutrina, como para convencer os contradizentes.
Porque há muitos desordenados, faladores, vãos e enganadores, principalmente os da circuncisão,
Aos quais convém tapar a boca; homens que transtornam casas inteiras ensinando o que não convém, por torpe ganância.” (Tito 1. 5 – 11)

Rogério Tenório de Moura*
é licenciado em Letras pela UEMS,
especialista em Didática Geral
e em Psicopedagogia pelas FIC.

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