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Cidade natal de Joaquim Barbosa vive onda de violência, tráfico e assassinatos

Carlos Eduardo Cherem/ UOL - 21 de abril de 2013 - 09:11

Paracatu (MG) fica a 220 Km de Brasília e 500 Km de Belo Horizonte. Nos últimos três meses, 13 pessoas foram assassinadas no município de 84 mil habitantes. Houve ainda 46 tentativas de homicídio. Somente em março, foram oito pessoas mortas. Em 2012, foram 32 assassinatos. Há 15 dias, foram instaladas delegacias especializadas na cidade. O número de delegados passou de dois para cinco. Foram criadas as delegacias de Combate às Drogas, Crimes contra o Patrimônio (furtos e roubos), do Menor e da Mulher. São 13 investigadores trabalhando com os cinco delegados.

"Agora, vamos poder melhorar nosso trabalho, o trabalho de investigação, de inteligência. Identificar os grupos da população que tem dificuldades no convívio social e atuar de maneira preventiva", diz o delegado Amarantino Neto, 43, responsável pela recém criada Delegacia de Homicídios de Paracatu.

"Só vou olhar agora a questão dos homicídios. Vamos ter mais foco e mais resultados. São duas gangues, a maioria menores de idade, que atuam na cidade", afirma.

Os assassinatos desde janeiro já alertavam a população de Paracatu. Em 12 de março, Vinícius de Oliveira, 34, o Maninho, amigo do delegado – "muito amigo, fazíamos trilha juntos" –, estava sentado num banco da praça do Santana conversando com algumas pessoas, quando dois rapazes numa moto se aproximaram e, o da garupa, lhe deu seis tiros.

Eles acertaram na cabeça, na perna direita, no ombro e nas nádegas.

Poucos dias depois Luís Henrique Vieira, o Sassa, 24, acusado de envolvimento com o tráfico de drogas e de ser chefe de uma das gangues da cidade, foi preso, acusado pelo crime. A vítima teria tido um relacionamento com a mulher de Sassa, há oito anos atrás.

"Ele dirigiu a moto e, o outro, atirou", diz o delegado. Filho da ex-vereadora Maria Romualda, conhecido, relacionado e bem quisto na cidade, o assassinato de Maninho incomodou a população de Paracatu.

Localização geográfica
"Mas no outro dia, a situação piorou. No dia 13 [março], foram mais dois assassinatos. Aí a sociedade de Paracatu ficou mesmo alarmada", diz o delegado.

Acusado de integrar um grupo de traficante de drogas da cidade, Denílson Ferreira da Silva, 25, o Golo, foi assassinado. Poucas horas depois, Amanda Priscila, 21, que supostamente tinha dívida com traficantes, foi morta também a tiros, por dois homens em uma motocicleta.

"Ficou todo mundo muito preocupado. Chamou mais a atenção", diz o delegado. Três dias depois, no dia 16 de março, uma passeata reuniu cerca de 1.000 pessoas no centro da cidade. Fizeram a Caminhada da Paz, entre a praça do Santana e a avenida Olegário Maciel, em frente ao Hospital Municipal.

"Paracatu ainda é uma cidade pequena, mas as drogas cresceram demais. Muito rápido nos últimos anos. Ficou quase impossível sair disso", diz a empresária Enir Duarte, proprietária da Líder Auto-Escola.

Ela participou da organização da passeata do dia 16 e, também, da outra, realizada no dia 23 de março.

"Foram duas que fízemos. Foram centenas de pessoas que acompanharam. O povo já está cansado", afirma a empresária, moradora da cidade há 23 anos.

Na avaliação do delegado Amarantino Neto, a posição geográfica de Paracatu, "bem no centro do país", explicaria, em parte, os atuais níveis de violência. Na sua avaliação, a proximidade de Paracatu com cidades goianas próximas a Brasília, a exemplo de Cristalina, Valparaíso e Luziânia, possibilitou uma migração de criminosos entre essas cidades.

"Fazemos contatos constantes e permanentes com as policias dessas cidades. É uma turma de lá, aqui. Uma turma daqui, lá. Isso é permanente", afirma Amarantino Neto. O delegado nasceu em Goiânia, e atuou dez anos na Polícia Civil de Goiás, como investigador. Há quase quatro anos, é delegado em Paracatu.

"Fumam em qualquer lugar"
Os vereadores da cidade são unânimes em dizer que a violência e os assassinatos são consequências da disseminação de drogas na região. "Mais de 90% dos infratores em Paracatu são menores e estão envolvidos com drogas. O problema é que não temos um centro de reabilitação para esses jovens", diz o vice-presidente da Câmara, Haroldo Batista Coelho (PSDB).

"A questão é que o pessoal evita a BR-040 [Brasília-Belo Horizonte], que tem mais fiscalização, e passa com a droga aqui na região", diz o vereador.

Professor de língua portuguesa e inglesa há 15 anos na Escola Estadual Delano Brochado, no bairro Paracatuzinho, Coelho diz que o problema parece não ter fim. "Fico constrangido. Os meninos fumam em qualquer lugar", afirma.

"Meus filhos já está grandes. São adultos, mas fico com medo. Tenho muito medo de sair à noite. Estão tirando nosso direito de ir e vir. Dos bandidos não. Eles estão aí", diz a vereadora Eloísa Rodrigues Cunha (PMDB). "Este ano, piorou a situação. 90% é uso de crack. É muito difícil conviver", afirma Eloísa.

A vereadora perdeu a irmã de criação Evânia Doroteu. A mulher e o marido Paulo Damasceno, pais de duas crianças, foram sequestrados e assassinados no entorno de Paracatu. Evânia foi estuprada antes.

Mina de ouro
Maior autoridade do Judiciário brasileiro, o presidente do STF (Supremo Tribunal Federal), Joaquim Barbosa, nasceu há 58 anos em Paracatu, cidade do noroeste mineiro, próxima à divisa de Minas Gerais e Goiás. Ele foi eleito na última semana pela revista norte-americana Time, uma das mais prestigiadas publicações em todo o mundo, como uma das cem pessoas mais influentes do planeta.

No domingo (21), ele recebe o Grande Colar da Medalha da Inconfidência Mineira, a mais alta honraria concedida pelo governo de seu Estado natal. Barbosa será também orador oficial na 62ª solenidade de entrega da Medalha da Inconfidência, em Ouro Preto.

Negro, o presidente do Supremo virou arrimo de família com 16 anos, quando os pais se separaram. Tinha sete irmãos e foi para Brasília trabalhar. "Ainda tem parente dele [Joaquim Barbosa] no Paracatuzinho. Esses meninos envolvidos com drogas negam serem descendentes dos quilombos. Não se reconhecem como negros. Perderam a identidade mas são descendentes dos escravos. O próprio Paracatuzinho e o Alto do Açude, estão do lado do Quilombo São Domingos. A Chapadinha e o Nossa Senhora do Carmo estão onde era o Arraial D'Angola (interposto de distribuição de escravos", afirma o professor Márcio José dos Santos.

Estudioso da história de Paracatu, Santos foi professor e proprietário durante 22 anos do Colégio e da Faculdade Soma em Paracatu. "Há uma grande desagregação entre esses jovens, que estão perdendo suas raízes quilombares. Nem se dizem negros. Falam que são pardos. Agora, isso pode mudar um pouco por causa das cotas, mas eles negam se dizem pardos", afirma Santos.

Os negros são atualmente 13.209 pessoas (15,59% da população de Paracatu), de acordo com o censo de 2010, do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística). Outras 48.885 (57,7%) pessoas se dizem pardos. Os brancos são 25,46% (21.568 pessoas).

De acordo com o IBGE, 6,9% da população de Paracatu é analfabeta. Entre os jovens de dez a 17 anos, num total de 13.581 meninos e meninas, 32,9% (4.471 rapazes e moças) frequentam a escola. O resto está fora.

O professor explica que os negros eram utilizados como escravos no garimpo do ouro. E depois trabalharam como garimpeiros até meados da década de 1980. Em Paracatu, a empresa Kinross explora desde 1987 a maior mina de ouro do Brasil e a maior a céu aberto do mundo. A companhia é o maior empreendimento na região de Paracatu. Cerca de 10% da mão de obra local está empregada na Kinross.

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