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Cacófato

Alcides Silva - 18 de julho de 2013 - 16:23

Língua portuguesa, inculta e bela


Alcides Silva


Cacófato


Indiscutivelmente, escrever é uma arte e talvez o seu atributo mais importante seja a correção. Redigir corretamente, porém, não é somente escrever sem erros de ortografia, de sintaxe ou de semântica. Exige também clareza, naturalidade e harmonia. O elemento básico de um bom escrito é a sua expressão eufônica, isto é, o som estético, aquilo que soa melhor. Esse ‘som estético’- essa harmonia - eufonia -, deve ser a preocupação permanente de quem pretenda escrever bem. Ouçamos esta assonância de Chico Buarque de Holanda:
“Sou Ana, da cama,
da cana , fulana, bacana,
Sou Ana de Amsterdaam.”
Já o contrário, o “mau som” - a cacofonia – isso deve ser evitado.
Cacófato, ensinava Napoleão Mendes de Almeida, “é o vício decorrente da união de duas palavras de forma tal que a última ou últimas sílabas da primeira, mais a primeira ou primeiras da segunda formam uma terceira palavra de sentido torpe, obsceno ou ridículo: Ela trina muito bem - Uma minha prima – Dê-me já isso” (“Gramática Metódica”, § 555).
Se a união daqueles sons produzir uma terceira palavra, porém sem sentido ridículo, não será considerada vício de linguagem: uma por cada, lá tinha, uma mão, etc. Se causar um som chulo, ou for um palavrão, tenha ou não sentido pornográfico, é cacófato: Ele toca gado – Acabou-se tudo – O triunfo da verdade – A boca dela – Por razões diferentes- Ele marca gol - Conforme já foi dito – O time já ganhou – O time nunca ganhou – Bafo de onça.
Rui Barbosa, na “Réplica” (nº 89), denominou de cacofatomaníacos aqueles que, coléricos e com escrúpulos exagerados, viam, a qualquer encontro de sons, o erro implacável: “Se a idéia de porta, suscitada em por tal, irrita a cacofatomania desses críticos... outras locuções vernáculas têm de ser, como essa, refugadas”.
Por medo à cacofonia alguns redatores mais apressados (ou mal formados) colocam apóstrofo no antigo numeral ua, hoje usado somente em poesia para fins de métrica, quando a palavra seguinte se inicia pela sílaba ma: u’a mão, u’a mala, u’a maca. Isso é estupidez gramatical ou gramatiquice de botequim.
A propósito, escreve Luiz Antônio Sacconi: “A cacofonia – convém dizer com ênfase – não existe senão na mente das pessoas. Ora, quando se diz “ele me deu uma mão”, o próprio contexto em que a frase se inclui nos leva a uma só compreensão, e a só uma. Querer entender “ele me deu um mamão” é desejar a mudança radical do contexto, fato que não se admite na conversa entre pessoas que gozam de sanidade metal” (“Não erre mais”, p. 235).
Assim, não se preocupe com eventual combinação de sons que possam surgir com a pronúncia de duas palavras. O cacófato só existirá se dessa junção nascer uma palavra ou expressão de sentido obsceno ou torpe, que desagrade seus próprios ouvidos.

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