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Barbarismo e idioleto

Alcides Silva - 15 de agosto de 2013 - 16:13

Barbarismo e idioleto

Língua portuguesa, inculta e bela
Alcides Silva
Barbarismo e idioleto

O comodismo é próprio do ser humano. Normalmente aceitamos as coisas como elas nos são apresentadas: é a lei do menor esforço. Daí porque volta-e-meia embarcamos em canoas-furadas, compramos quinquilharias e mezinhas salvadoras, ofertamos contribuições a entidades-fantasmas, caímos no conto-do-vigário, comemos gato por lebre, enfim, somos ludibriados por mera preguiça de pesquisar ou de indagar.
Em sendo a língua uma instituição social e um sistema de valores e a fala um mero ato individual, o comodismo nos leva a aceitar palavras e expressões sem se lhes buscar a exata significação, a grafia verdadeira ou a correta pronúncia. Assim como o uso do cachimbo faz a boca torta, a repetição constante daquelas representações mentais cria o hábito verbal E com isso costumeiramente caímos em erro.
Já relatei aqui que, em denúncia escrita, certo promotor acusava alguém de ter abusado sexualmente de uma mulher “nos fundilhos da Rodoviária”, querendo com isso dizer que o ato ocorrera nos fundos do antigo prédio da rodoviária, onde funcionavam os sanitários públicos. ‘Fundilho’, como se sabe, é a parte das calças correspondente ao acento.
A isso – emprego irregular de uma expressão - se dá o nome de idioleto que é o sistema linguístico de um único indivíduo num determinado período de sua vida e reflete suas características pessoais, os estímulos a que foi submetido, sua cultura etc. É um erro individual.
Tenho visto placas indicativas de minhocários e anúncios na imprensa apregoarem a venda de humus e ouvido ilustradas senhoras dizerem que o utilizam em seus vasos e xaxins (a maioria, aliás, pronuncia “xaxinhos”). Em português castiço, puro, a palavra é humo, derivada do latim húmus-i, significando matéria orgânica que dá fertilidade à terra. Mas o povo consagrou a forma húmus e assim permanecerá, porque consentânea com a estrutura da língua. E há uma razão lógica para a arcaização do termo humo. É que em latim existe o verbo transitivo humo – ãs- ãre- ãvi- ãtum- com significado de “enterrar”, “cobrir com terra”, “fazer os funerais de alguém”. Isso é denominado de arcaização ou emprego de palavra fora de moda.
Com o advento do Renascimento, no século XVI, foram traduzidas obras dos grandes escritores latinos e gregos e essas traduções motivaram o aparecimento de palavras que, com pequenas modificações, já haviam ingressado na língua portuguesa, como o nome da matéria orgânica dos vasos e xaxins. Xaxim, porém, é palavra de origem tupi-guarani, nome de um samambaiaçu da mata atlântica. Isso, porém, é assunto reservado aos doutores em gramática histórica e aos botânicos. Isso é peregrinismo, quando a palavra ou o conceito estrangeiro torna-se costume lingüístico de um grupo. Difere da arcaização, que restaura o termo primitivo.
Costumeiramente tenho lido ou ouvido expressões que me fazem lembrar daquela denúncia, como as que aparecem a seguir, as grafadas em negrito, as corretas, as em itálico, as consideradas erradas: abóbada<abóboda; adivinhar<advinhar; alvoroçar<alvoraçar; astigmatismo<estigmatismo; babadouro<babador; balanço<balango; braguilha< barguilha; burburinho<borborinho; cabeçalho<cabeçário; cabeleireiro<cabelereiro;
codorna< cadorna; camioneta<caminhonete; caminhoneta; cuspe, cuspida<guspe, guspida; decote, decotado> degote, degotado; empecilho<impecilho; engendrado <engedrado; entretela<intertela; mestria<maestria; mobília<mobilha; pantomima <pantomina; prevenir<previnir; privilégio<previlégio; prostrar<prostar; raiosX<raioX; réstia<réstea; salsicha<salchicha; tabuleiro<taboleiro; tetraneto, tetravô<tataraneto, tatatavó; vultoso (volume)<vultuoso (rosto congesto, muito rubro). São barbarismos e consiste no emprego de palavras estranhas na forma ou na idéia.
Se o erro for individual é idioleto; se de uso comum pelo povo, barbarismo.

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