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Artigo: A oficialização do "bico” policial

Dirceu Cardoso Gonçalves – tenente-PM - 04 de fevereiro de 2011 - 08:30

O emprego de policiais em folga, férias ou licença-prêmio para trabalhar na fiscalização das cidades, à soldo das Prefeituras, pode amenizar o problema imediato de uma parcela desses servidores públicos que ganham maus salários, mas não é a solução. Todo profissional - especialmente o policial, que exerce funções insalubres e de alta periculosidade – necessita do período de descanso para recuperar suas forças e poder apresentar-se física e mentalmente integro para a jornada do dia seguinte. Se trabalhar nas horas reservadas ao descanso, pode voltar ao seu posto oficial de trabalho sem as condições básicas para o cumprimento de sua tarefa. É por isso que o “bico”, há muito tolerado pela maioria das polícias brasileiras, é regimentalmente proibido.

As assessorias jurídicas dos governos encontrem brechas legais que levam as autoridades a dizerem que a atividade não constitui a oficialização do “bico”, mas o argumento é frágil. “Bico” é tudo aquilo que o profissional realiza, mediante remuneração, fora de sua atividade principal. Há o bico mais impróprio, como o porteiro de boate, segurança de pessoas ou de estabelecimentos comerciais e o mais tolerável, que pode englobar atividades parecidas com a função policial. Mas tudo é bico.

Há que se considerar que a própria Constituição define as funções dos estados e dos municípios. A segurança pública é atribuição estadual, executada pelas polícias civil e militar. Não há justificativa para o município subsidiar essa atividade e nela empregar recursos arrecadados dos seus contribuintes. Essa receita não se destina originalmente à segurança pública e, se aí for aplicada, com certeza, faltará em outras áreas, estas sim, de responsabilidade municipal.

Como titular da segurança pública, o Estado tem o dever de manter as corporações e pagar salários compatíveis aos seus integrantes, principalmente diante da exigência legal de dedicação exclusiva. As experiências têm demonstrado grandes dificuldades na manutenção da ordem e no bom desempenho das polícias mal remuneradas. Os policiais poderiam prestar melhores serviços se corretamente equipados, devidamente assistidos (social, física e mentalmente) e justamente pagos. As instituições policiais só não param porque uma grande parcela de seus membros é composta por homens e mulheres vocacionados e comprometidos com os ideais de servir à sociedade. Mesmo enfrentando dificuldades, se esforçam para prestar um bom trabalho.

Em vez de tentar transferir aos municípios suas responsabilidades de remunerar adequadamente as polícias, os Estados deveriam se esforçar para estabelecer salários e condições de trabalho ideais. Os prefeitos, no lugar de empenhar o orçamento municipal numa atividade tipicamente estadual, deveriam exigir que o Estado cumpra sua missão e pague por isso. Governadores e prefeitos teriam, ainda, de atentar para a proibição legal de uma mesma pessoa receber salários de duas fontes públicas a não ser nas ressalvas, também legais, do exercício do magistério e do serviço médico. É conveniente que o façam antes do Ministério Público ou Tribunal de Contas.

O policial tem de ganhar o suficiente para viver e manter sua família. Obrigá-lo a vender seus períodos de folga para que o Estado economize algumas moedas, é um inaceitável massacre. Chega muito próximo do trabalho escravo e, além disso, não resolve o problema da classe, pois as prefeituras só poderiam absorver uma pequena parcela do contingente, onde todos são carentes de melhores ganhos.



Tenente Dirceu Cardoso Gonçalves – dirigente da ASPOMIL (Associação de Assist. Social dos Policiais Militares de São Paulo)

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Dados do Autor:

Dirceu Cardoso Gonçalves – tenente-PM

RG nº 5301.573-SP



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