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Alcides Silva - Língua portuguesa, inculta e bela!
Sequer
Volta e meia leitores me escrevem para condenar o uso do advérbio sequer com valor negativo. Acabo de receber de Clayton Ávila Alves a seguinte mensagem, que aqui transcrevo preservando-lhe a grafia original:
Mais uma vez venho abordar o aspecto referente ao termo SEQUER e aos exageros da negativa.
Extraio do texto entitulado Juntos ou separados, de Alcides Silva, uma frase pela qual fico indignado, pela contrariedade do significado SEQUER:
Tampouco é advérbio e só se emprega quando puder ser substituído por também não, ou nem sequer, ou, ainda, por sequer: Não apareceu tampouco se justificou.
É um equívoco afirmar que TAMPOUCO pode ser SEQUER, que significa AO MENOS, PELO MENOS, NO MÍNIMO.
Adquiriu-se o costume de entender que o advérbio sequer, que não é de negação, fosse colocado como tal. Se assim o fosse a expressão nem sequer seria redundante, como dizer nem nem, da mesma forma que já se faz a redundância em nem tampouco, quando conectivo de orações ou complementos. Há de se entender que nem sequer é o mesmo que nem ao menos ou nem no mínimo ou nem pelo menos..
Exemplifico o que é correto e o incorreto: O Correto: Não leu jornal nem sequer assistiu televisão. O Incorreto: Não leu jornal nem tampouco assistiu televisão.
Assim, é inadmissível o exagero pós-reforço da negativa, ou a duplicidade de reforço com termos de mesmo significado da negativa, incorreto tanto gramatical quando dialeticamente, por exemplo:
Não vai nem sequer... - ao invés de não vai sequer...; Nunca sequer nem... - ao invés de nunca sequer...; Ninguém sequer nem... - ao invés de ninguém sequer...;(nem (reforço) = sequer; ao menos); Não vou nem falar nada (não vou nem nem uma coisa falar) - ao invés de não vou nem falar uma palavra; Nem isso, nem nada (nem nem uma só coisa) ao invés de nem isso, nem outra coisa ou nem isso e nada. Nem eu, nem você, nem ninguém (nem nem uma só pessoa) - ao invés de nem eu, nem você e ninguém, ou nem eu, nem você, nem uma pessoa.
Sendo assim, sugiro que se retifique o conceito de TAMPOUCO, evitando assim o mal entendido.
Obrigado pela atenção - Clayton Ávila Alves - Consultor Legislativo
Pelos padrões cultos, pelas normas gramaticais correntes, pelas regras em uso em bom português o sequer sempre deverá vir acompanhado de uma negação: Não votou sequer para presidente; A garota nem era sequer simpática; Nem sequer respondeu-me a carta. Mas na língua portuguesa que se fala no Brasil, o sequer está se tornando independente e vicejando sem o apêndice de outro advérbio. Carlos Drummond de Andrade assim começa seu longo e belo poema O mito, publicado em A Rosa do Povo, livro que reuniu sua obra poética produzida nos anos 1943-1945: Sequer conheço Fulana, / vejo Fulana tão curto, / Fulana jamais me vê, / mas como eu amo Fulana. / Amarei mesmo Fulana? / ou é ilusão de sexo? / Talvez a linha do busto, / da perna, talvez do ombro.
Com o advérbio sequer está acontecendo o mesmo processo de evolução semântica ocorrido com jamais, um outro advérbio que nos primórdios da língua não podia vir desacompanhado de outra negativa: ... já mays non ouvi lezer... (Cancioneiro da Vaticana).
A negativa reforçada nunca jamais (corredia no castelhano: Nunca jamás é o nome de um delicioso bolero relançado no Nanna Caymmi) era freqüente nos clássicos: Que... nunca jamais se pudesse alcançar delle que para os taes provimentos, mayores nem menores interesse por pessoa alguma (Sermões do Padre Antônio Vieira, vol. 8, p. 233).
Hoje, o advérbio jamais não precisa de reforço negativo Jamais votarei naquele candidato, o que, por certo, sucederá com seu parente sequer.
Todavia, nos meus escritos, o sequer ainda vive em dupla ou com o nem ou com o não, ou até mesmo com o renão, que aqui relembro em homenagem ao presidente do Senado, Renan Calheiros, a bola da vez.