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Geral

Alcides Silva: Língua portuguesa, inculta e bela

Alcides Silva - 19 de novembro de 2004 - 05:38

Semana passada, falando sobre redundância, tentei demonstrar a desnecessidade de repetir palavras ou idéias numa enunciação quando não trouxer beleza, realce ou vigor à frase. Uma coisa é a sonoridade de Pessoa nos versos “Ó mar salgado, quanto do teu sal / São lágrimas de Portugal”, outra coisa é o “subir pra cima”, da linguagem popular. A propósito, a memória me traiu quando atribuí a Ary Barroso a frase melódica: “0nde o céu azul é mais azul”. Falhei. O samba é de Braguinha, Alberto Ribeiro e Alcir Pires Vermelho, segundo me alertou Valdir José Cardoso, apresentador do excelente musical “Brasil & Cia”, da Regional FM, de Jales. .
É muito comum, na fala do dia-a-dia, confiar na memória e cometer alguns descuidos, muitos dos quais até nos parecem normais porque a língua falada é mais viva e atual que a escrita. Porém, na linguagem formal, na língua padrão, aquela que perdura, tais descuidos devem ser evitados.
Vejamos uma dezena deles, catados ao léu:
1º - Outro dia li que “os exames vestibulares iniciam hoje”. Os exames iniciam o quê? Quem inicia, inicia alguma coisa. A frase correta seria “os exames vestibulares iniciam-se hoje”. Esse se, chamado de partícula apassivadora, é empregado sempre que o sujeito é inanimado, isto é, incapaz de praticar a ação verbal. “Alugam-se casas” – “Consertam-se sapatos” (=casas são alugadas; sapatos são consertados). “Aluga-se casas” é errado e equivale a “Casas é alugada”.
2º - De um comentarista esportivo ouvi que “A saúde afastou-o do jogo”, referindo-se a um jogador que não pudera disputar determinada partida de futebol. Aí ficou-me a dúvida: o excesso de saúde, a falta de saúde ou um órgão sanitário, quem afastou aquele jogador? Não seria melhor ter dito: “A doença afastou-o do jogo”?.
3º - Os céus estavam se escurecendo e alguém me disse: “É capaz de chover” Quem é capaz? Indaguei. Responderam-me, então: “É possível que chova”. Entendi.
4º - “A situação está difícil. É preciso encará-la de frente”. Quero ver encará-la de costas ou de lado!
5º - Atendo o telefone. Do outro lado da linha alguém me pergunta: “Da onde?”. Fico irritado por dois motivos: falta de educação e agressão à gramática. “Da onde” não existe em língua portuguesa. Em expressando uma idéia de procedência, a pergunta deveria ser “De onde”: “De onde está falando? De onde você veio?”
6º - “Fulano faz parte integrante da diretoria do clube”. Quem faz parte de uma diretoria, dela integra, da mesma forma quem a integra, dela faz parte.
7º - “O clima era festivo; todos exultaram de alegria”. O verbo exultar significa sentir grande alegria, regozijar-se, ou manifestar forte júbilo. Daí, impossível alguém exultar de tristeza.
8º - Erário público também é pleonasmo. Erário, do latim aerariu (palavra que designava o Tesouro Público de Roma), em português é sinônimo de “fazenda pública”, de “Fisco”.
9º - Elo de ligação. Se é elo (do latim anellu = anel) é uma argola que compõe uma corrente, uma unida à outra. Portanto, elo só pode ser de ligação. Absurdo seria um elo de separação.
10º - No cardápio eram me oferecidos ovos estalados. Como estalo é o som produzido por uma coisa que se racha, quebra ou rebenta de súbito, não os comi, porque ovos que dão estalos devem estar podres ou gorados. Prefiro ovos estrelados, que é a maneira e forma que ficam os ovos fritados sem serem mexidos.

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