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Alcides Silva: Língua Portuguesa, inculta e bela!

Alcides Silva - 10 de abril de 2008 - 11:28

Gerúndio

Com o emprego irregular do gerúndio no português que se está falando no Brasil (vou estar remetendo, está ganhando foro de verdade a afirmação, já aqui contestada, de que o gerúndio é invenção brasileira, tanto que em Portugal e nos demais países lusófonos, exceto o Brasil é claro, ele não é usado na língua falada e nem na linguagem escrita.
Pede-me o leitor João Carlos Krug, ex-prefeito de Chapadão do Sul, que lhe esclareça uma dúvida sobre o uso do gerúndio, que, em Portugal, segundo ele, não seria empregado nem mesmo na linguagem culta.
Não é verdade. O gerúndio é tão antigo que no latim era um substantivo-verbal, que entrava na conjugação do verbo ao lado do infinitivo e do supino (formas nominais do verbo latino). O idioma português herdou, como as demais línguas românicas, a forma ablativa, abstrata: o sufixo ndo precedido da vogal temática, a (ando = falando; endo = correndo e indo = sorrindo.
O gerúndio é empregado em Portugal normalmente, tanto quanto, ou até mais que, no Brasil, porém de maneira correta:
“Proferindo estas palavras, o gardingo atravessou rapidamente a caverna e desapareceu as trevas exteriores” (Alexandre Herculano – ‘Eurico, o presbítero’, 32ª ed., Bertrand, Lisboa, s.d., p. 180) [gardingo = homem nobre];
“Andando, andando, escureceu-nos” (Adelino Ribeiro: “O Malhadinhas – mina de diamantes”, Bertrand, Lisboa, p. 137);
“Vagaroso, o tempo foi passando” (Miguel Torga: “Novos Contos da Montanha”, 3ª ed., Coimbra, p. 21);
“Já no largo oceano navegava / As inquietas ondas apartando; / Os ventos brandamente respiravam / Das naus as velas côncavas inchando” (Camões: “Os Lusíadas”, I, 18).
Ocorre que lá não grassou a praga do gerundismo, pois o lusitano é muito cioso de seu falar e evita, o quanto pode, o estrangeirismo desnecessário. O que aqui é aids (palavra formada pelas letras iniciais do inglês Acquired Immunological Deficiency Syndrome = síndrome de imunodeficiência adquirida), lá é sida (palavra formada pelas iniciais da tradução portuguesa do nome da virose: síndrome e imunodeficiência e pela sílaba final de adquirida).
O gerúndio é a forma nominal do verbo usada para exprimir uma circunstância ou formar, quando conjugada com os auxiliares andar e estar, verbos freqüentativos, ou para expressar a ação incoativa (incoar = começar, principiar) de um verbo, quando estiver junto dos auxiliares ir e vir.
Já em Portugal é comum o emprego do infinitivo, regido da preposição a, em locuções formadas com os verbos andar, estar, ficar, viver e semelhantes, com o valor de gerúndio:
Andam a correr pelas ruas - Estou a ouvir um ruído - Ficou a esperar o amanhecer - Vive a chorar pelos cantos da casa.
Quando precedido da preposição em indica tempo, condição ou hipótese:
“Em Vieira morava o gênio; em Bernardes o amor, que em sendo verdadeiro, é também gênio” (Castilho, in “Antologia Nacional”, p. 186).
Veja, prezado João Carlos, que a informação que lhe passaram a respeito do gerúndio é totalmente falsa. O que talvez lhe tenham dito é que o português de Portugal ainda não está contaminado pelo gerundismo, a mania do brasileiro moderno: “Domingo vou estar participando de um campeonato de truco”- “Segundo Lula precisamos estar construindo um novo modelo econômico”. Isso, porém, já foi assunto de um outro comentário.

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