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Alcides Silva: Língua portuguesa, inculta e bela!

Alcides Silva - 08 de fevereiro de 2008 - 08:18

Língua portuguesa, inculta e bela!
Alcides Silva
Bicho-carpinteiro
Vez por outra, na minha infância, era comum – e como!- (pai, mãe, tios, avós e agregados) ralharem comigo: “Fique quieto menino: parece que está com o bicho-carpinteiro”.
Também, pudera!, todos os atrativos pensáveis à meninada do meu tempo estavam ao alcance de minhas mãos. No fundo de meu quintal passava um largo ribeirão de pescas memoráveis e que possuía um delicioso “poção”, onde realizávamos intermináveis campeonatos de mergulhos; perto, sequer duzentos metros, umas palhadas repletas de rolinhas, fogo-pagou, amargosas, e até sorrateiros nambus, a não folgar descansos aos meus rústicos estilingues; mais à frente, a “cava funda”, com seus mistérios e esconderijos de uma erosão a meter medo; mais além, do outro lado, as rivalidades dos grupos que se quitavam no “arrisca-vida”, praça de guerra montada por nossa imaginação num largo de terra batida e que separava os territórios dos “de lᔠe dos “de cá”, eternos rivais; nas lonjuras dos campos de pastagens de todos os redores, que meus pés quebravam em meia hora de andança e folganças, os jambos, as pitangas, as gabirobas, as jabuticabas silvestres, os beijos escondidos e até, no ápice do arroubo, uma desajeitada mas esfervilhante e inesquecível bolinada.
Tempos que não voltam! Que pena!
O Aurélio Século XXI diz que ter bicho-carpinteiro é não poder estar quieto, não parar em lugar nenhum e faz uma referência ao escaravelho (besouro).
O Houaiss informa que bicho-carpinteiro é o nome comum que se dá a determinadas espécies de besouros que durante o estágio larvar brocam troncos e cascas de árvores.
O Laudelino Figueiredo registra que bicho-carpinteiro é o inseto que rói a madeira onde vive.
Outros dicionários trazem como sinonímia os substantivos excitação, estímulo, potência, travesso.
Na linguagem popular, o bicho-carpinteiro é chamado de rola-bosta porque vive de excremento de mamíferos herbívoros: as fêmeas preparam uma bolinha de excremento, na qual põem o ovo, e que enterram depois de empurrá-la a certa distância. Daí o nome popular. E faz sentido!
Esse besouro (jamais diga besourro ou bisorro, essas palavras não existem), que em alguns lugares também é chamado de broca, é muito ágil e está sempre em permanente atividade, roendo a casca ou o próprio cerne da árvore onde habita, geralmente de madeira-branca.
O menino traquina e bulhento daqueles tempos, que não parava quieto, era tido como ‘tomado pelo bicho-carpinteiro’.
Já, na linguagem popular, “na língua certa do povo”, como dizia Bandeira, em menina, moça ou mulher, bicho-carpinteiro era considerado como fogosidade, ardor sexual, a ninfomania ou o furor uterino: ‘A Ritinha tá com o bicho carpinteiro, tá querendo arrumar a vida” (J. B. Serra e Gurgel: “Dicionário de Gíria”)
Reinaldo Pimenta, em A casa da Mãe Joana (volume I), explica que ‘quando se diz que uma pessoa tem bicho-carpinteiro (não pára quieta), é como se ela estivesse sendo roída por dentro por esse inseto’.


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