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A crônica do Corino - O afilhado

Corino Rodrigues de Alvarenga - 14 de fevereiro de 2007 - 10:13

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O afilhado

Naqueles tempos da tenra idade na terra de Cassinha, eis que me vem à cabeça a convivência com meus três irmãos de criação: Jáimisson, que eu também brincava de chamar de “Yamassen”; Antônio Carlos, o meu colega e parceiro das traquinagens maiores; e o Júlio César, que, por ser mais novo, não era tão grudado a mim, embora o amor fosse o mesmo.
Eu era o diabo em pessoa. Quando ganhei o primeiro par de botinas, aos quatro anos, um presente do meu irmão e pai-de-criação João Marinho, levei belíssimos tombos, pois queria voar e não andar, tamanha a emoção por estar usando pela primeira vez um par daquele maravilhoso acessório de couro, reluzente e único.
Dizem que Deus não dá asas a cobra, mas eu havia ganhado um belo par de asas em forma de bonitas botinas. Depois vieram os cavalos alados, a bicicleta e outros tombos pela vida.
Só fui descobrir mesmo o que é tombo ao ouvir estas palavras do radialista e jornalista Braz Jaime Romano, em São Paulo:
- É, jovem, você só vê os uísques que eu tomo; não vê os tombos que eu levo.
Mas voltando àqueles tempos, como Carlos era um menino esperto, lépido e dono de grande astúcia, ele se tornou o meu parceiro em coisas boas também: coleções de gibis Tex, Tarzan e até chaveiros. Hoje tenho quase mil chaveiros na coleção após 31 anos de árdua missão para juntá-los, um após outro.
Lembro-me de Carlos e sua peculiar inteligência. Dos três irmãos, era o que menos estudava. Mas hoje tem dois diplomas na parede. Estudava só na véspera das provas. E sempre se deu bem asssim. Já os dois, “Yamassen” e “Julião Bacamarte”, não; estes sempre foram estudiosos.
Certa feita, Jáimisson, nervoso e tendo que estudar para uma prova, estava compenetrado, enfiado no livro, ali na copa da residência de João Marinho e Delaide, e a turma perturbando, tentando tirar a sua concentração. Carlos só balbuciava, irônico:
- Deixa ele quieto... Ele é bitolado... Deixa ele quieto... Ele é bitolado...
Todos não agüentavam e caíam na gargalhada. E Jáimisson lá, sério, compenetrado, enfiado na leitura e no decoreba, como se nada estivesse acontecendo.
Carlos, como todo mundo, tem o seu padrinho. O padrinho dele, “seu” Celestino, era dono, à época, de uma torrefadora de café, que ficava próximo ao antigo Hotel da Delza, que nem sei se existe mais.
Peralta, ele pegava uma cédula de um cruzeiro, rasgada bem em cima do número de série e ia comprar doce ou bolacha na pequena venda de “seu” Celestino.
O padrinho dele, paciente e generoso, ia lá, pegava o doce ou a bolacha, lhe entregava, pegava a cédula rasgada, via que não tinha valor algum e depois devolvia ao Carlos, dizendo:
- Não precisa pagar, não, meu afilhado! Leve! É um presente do seu padrinho!
No dia seguinte, lá estava Carlos de novo, com a nota rasgada para mais uma “compra”. E o padrinho repetia a ladainha já decorada:
- Não precisa pagar, não, meu afilhado...
Bons tempos aqueles. Foi ali que percebi que Carlos teria grande futuro como empresário. Hoje, dono de farmácias no Paraná, não me deixa mentir.
E, fazendo cada centavo valer mais, certamente que será dono de uma senhora rede de farmácias espalhadas pelo Paraná e Brasil afora.
Tino comercial nunca lhe faltou. E vontade de vencer, também.
A infância é uma fase que tem esse papel de nos moldar – e lapidar lentamente – para a vida.

Corino Rodrigues de Alvarenga
Contato com o colunista:
[email protected]

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